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O governo nem bem começava a sair do imbróglio que culminou com a saída do ministro Antonio Palocci, da Casa Civil, e se viu enredado em nova polêmica, desta vez envolvendo a decisão de frear a tramitação do projeto que prevê o fim do sigilo eterno para os documentos oficiais. Para recordar, em 2009, o então presidente Lula enviou ao Congresso projeto de lei normatizando a questão desses textos classificados como segredo de Estado. Pela proposta, os papéis considerados confidenciais deixariam de existir, os reservados e secretos não teriam o prazo de confidencialidade renovado e apenas os ultrassecretos permaneceriam sem divulgação por períodos prorrogáveis a cada 25 anos. Na Câmara o texto sofreu uma alteração substancial, permitindo a prorrogação dos últimos por apenas uma vez. Entenda-se por ultrassecretos aqueles que envolvam riscos à segurança nacional ou à estabilidade econômica e financeira do país.

Tudo acordado, a matéria foi para aprovação do Senado, onde a tramitação acabou refluindo. Os artífices das manobras contra a liberação desses documentos são os ex-presidentes e atuais senadores José Sarney e Fernando Collor de Mello. Sarney chegou a justificar que o sigilo eterno evita que "feridas do passado sejam reabertas". Estariam entre essas chagas as tratativas do barão do Rio Branco que permitiram a expansão das fronteiras do Brasil, possíveis atrocidades cometidas por soldados brasileiros durante a Guerra do Paraguai e, mais recentemente, fatos ocorridos durante os anos dos governos militares. Vivendo um momento político delicado, o governo recuou na decisão de aprovar a matéria, o que vem gerando críticas de setores organizados da sociedade e da classe política, aí incluído o próprio PT. Para a Associação Nacional de Jornais (ANJ), a manutenção da cláusula de sigilo eterno para certos documentos é um retrocesso que atenta contra o desejo dos brasileiros por transparência nos atos oficiais. Igualmente, a Ordem dos Advogados do Brasil e entidades de direitos humanos criticaram a posição do governo.

O passo atrás reflete, lamentavelmente, a influência cada vez maior que notórias figuras do Congresso, como Sarney e Collor de Mello – para citar apenas os dois diretamente envolvidos na celeuma –, passaram a exercer no governo da presidente Dilma Rousseff. Em nome desses, concessões acabam sendo feitas e que vão contra a expectativa da própria nação; no caso, o direito de se inteirar de detalhes passados e mais recentes da história do país. Numa sociedade estabilizada democraticamente como a brasileira, não se justifica os argumentos de que não é possível dar publicidade a determinados assuntos oficiais por temor de reabrir velhas feridas como disse Sarney. O risco que existe mesmo é o de o governo perder a iniciativa de tornar público esses documentos e vir a ser surpreendido com a sua propagação a partir de outros meios. O site WikiLeaks, que liberou uma profusão de documentos considerados secretos de vários países, é uma prova de que hoje em dia pode ser relativa a guarda de documentos oficiais confidenciais com a pretensão de assim ficarem ad aeternum.

Um país não pode ter receio do passado, por mais traumáticas que possam ter sido algumas passagens de sua história. Para tanto, no mínimo, o acesso aos conteúdos classificados como ultrassecretos abre a perspectiva de que erros cometidos anteriormente não mais se repitam. Nesse particular, nem Sarney nem Collor de Mello são os melhores juízes para decidir sobre o que deve ou não ser liberado para conhecimento dos brasileiros.

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