Nem tudo, mas quase tudo é agro nos países sul-americanos. Menos a população, que é cada vez menor na zona rural e maior nas zonas urbanas. Foi essa constatação que balizou as discussões do Fórum de Agricultura da América do Sul 2015, organizado pelo Agronegócio Gazeta do Povo nos dias 12 e 13 com o tema “Sociedade Urbana. Economia Rural”. Centenas de pessoas, de vários países, transformaram Curitiba e o Paraná na “capital” sul-americana do agronegócio.
Os debates apresentaram um cenário até certo ponto contraditório, que só faz aumentar a dependência das cidades de uma minoria que resiste no campo. De uma relação que não tem a ver apenas com abastecimento e segurança alimentar. A considerar que, na última década, uma parcela importante e crescente da economia urbana, nas áreas de comércio, produtos e serviços, surgiu ou se alavancou com base na atividade agrícola e pecuária. Um setor que, mais que produzir alimentos, foi o grande responsável pela abertura do mercado internacional e das divisas comerciais à América do Sul.
O mercado está aberto, a população do mundo cresce e a demanda também
Não estamos, portanto, tratando apenas de uma simples atividade primária, mas de desenvolvimento socioeconômico a partir do campo, que começa dentro da porteira, invade as cidades, gera emprego, renda e divisas aos países com potencial e, principalmente, vocação natural para o negócio. Em especial para países como o Brasil, onde o agronegócio virou sinônimo de economia. Responsável por quase 25% do PIB, em anos de revés econômico a cadeia de produção e agregação de valor que começa no campo tem sido determinante ao país. Em 2015, por exemplo, enquanto as projeções apontam para uma retração do PIB geral entre 2,5% e 3%, o desempenho do agronegócio deve ficar no azul, entre 1% e 1,5%.
Com 388 milhões de habitantes (258 milhões no Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai), os países sul-americanos respondem por 30% do mercado global de grãos, sendo 54% do comércio mundial da soja, a commodity agrícola com maior liquidez no planeta. Quase 30% da proteína animal (bovinos, suínos e aves) negociada no mundo tem origem em países do bloco. Na carne de frango, a participação é ainda maior e chega a 40% do mercado. Esses são alguns dos principais números da América do Sul rural, que tem base no campo e efeito ampliado nas cidades, estados e países a partir de uma economia não apenas urbana como globalizada. Uma realidade que pode ser ilustrada nas exportações brasileiras, em que oito dos dez itens da pauta ou segmentos que lideram os embarques são do agronegócio.
A produção em alta revela uma demanda crescente e constante no mercado interno. A oferta, no entanto, avança em ritmo muito superior ao consumo doméstico, o que transforma os países sul-americanos em players exportadores. Uma oportunidade para aquela minoria que está no campo, que chega acompanhada de grandes desafios. O mercado está aberto, a população do mundo cresce e a demanda também, em um ambiente em que todas as nações consomem e poucas têm condições de oferta. A produção está cada vez mais restrita em todo o planeta. As terras passíveis de produção estão cada vez mais escassas. O mundo precisa produzir mais, para mais pessoas e com menos terra. E com a agravante de uma população mais concentrada, mais urbana e menos rural.
O fórum mostrou que a América do Sul alimenta o mundo. Mais do que isso: a partir da agricultura, estamos colocando ao mundo uma alternativa sustentável de energia, com o etanol de cana-de-açúcar ou o biodiesel, que tem na soja a sua grande matriz. Os debates mostraram que é grande o avanço, como também os desafios. Que estamos diante de uma sociedade urbana e de economia rural. E que discutir o futuro do agronegócio é discutir o futuro do campo e das cidades. É pautar o desenvolvimento.
Sabemos produzir. Mas ainda estamos aprendendo a vender. A disputa é acirrada. O ambiente internacional é uma oportunidade, mas também é dinâmico e muito competitivo. O Brasil e a América do Sul precisam, além de produzir, aprender a negociar, posicionar-se política e comercialmente, mostrar que não temos apenas escala, mas estratégia. Investir em tecnologia e infraestrutura não é mais opção, mas condição.
Mais do que questionar o modelo de outros países, concorrentes do lado da oferta, ou clientes do lado da demanda, temos de começar a nos questionar. Não podemos mais ser taxados de meros fornecedores porque somos mais que isso. A América do Sul é o grande player do agronegócio mundial, único em produção e potencial para atender a crescente demanda mundial por alimentos e energia.