Uma redundância aparentemente inocente está camuflando mais uma tentativa de partidos de esquerda de impor, pela via judicial, as suas plataformas ideológicas sobre uma população que as rejeita maciçamente. A Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 5.668 foi ajuizada no Supremo Tribunal Federal pelo PSol, em 2017, e pretende aplicar uma interpretação do Plano Nacional de Educação que praticamente blinde de críticas e contestações a apresentação, nas escolas, da ideologia de gênero – a tese de que masculino e feminino não passam de construções sociais e que, portanto, qualquer indivíduo, mesmo uma criança, pode “escolher” a que gênero pertence, ainda que isso negue sua natureza biológica. O julgamento da ADI deveria ocorrer no próximo dia 11, mas o presidente da corte, Luiz Fux, a retirou de pauta após encontro com parlamentares e juristas.
Na petição, o PSol pede que o STF determine que o artigo 2.º, III, e várias das metas do PNE sejam interpretados “como obrigando as escolas a coibir também as discriminações por gênero, por identidade de gênero e por orientação sexual”. O texto atual da Lei 13.005/2014 afirma, no artigo 2.º, III, que está entre as diretrizes do plano a “superação das desigualdades educacionais, com ênfase na promoção da cidadania e na erradicação de todas as formas de discriminação” – e parece bem óbvio que, dentro do conceito de “todas as formas de discriminação”, também estejam incluídas a homofobia e a transfobia. Por esse ângulo, alguém haveria de questionar por que o PSol está movimentando a máquina da suprema corte para pedir algo que já está na lei, mas a redundância é mero cavalo de Troia para as verdadeiras intenções da ADI.
Tendo suas plataformas derrotadas nas urnas e no Legislativo, os ditos “progressistas” burlam o jogo democrático recorrendo ao Judiciário para fazer valer suas pautas
Argumentam os autores da ação que o fato de o PNE e inúmeros outros planos estaduais e municipais de educação terem eliminado referências explícitas a “gênero” representaria uma “proibição implícita” de combate à discriminação contra estudantes homossexuais ou que sofrem da chamada disforia de gênero, em um caso típico de “falácia do espantalho”. Afinal, a sociedade se levantou e pressionou parlamentares não para legitimar qualquer forma de discriminação ou bullying, mas apenas para fazer valer seu direito – garantido em tratados internacionais dos quais o Brasil é signatário – de que as crianças recebam educação consoante os valores morais de suas famílias.
Se alguma escola ou educador se omite diante da discriminação a um aluno LGBT, claramente erra em seu papel de educar e promover o respeito devido a todas as pessoas, independentemente de sua orientação sexual. Situação bastante diferente é aquela em que se passa a ensinar teorias extremamente controversas e que negam dados básicos da natureza humana, como a complementariedade entre os sexos, com todas as consequências práticas que isso acarreta no ambiente escolar – um exemplo evidente é o do uso de banheiros por meninos ou meninas que dizem se identificar com o sexo oposto ao biológico. Este caso não chega a ser mencionado na petição, que no entanto apresenta outros exemplos considerados “positivos”, como o “casamento simulado” entre dois meninos do ensino fundamental em uma escola belga em 2016.
Novamente, é preciso ressaltar: nem os legisladores responsáveis pelos planos de educação (nas três esferas de governo), nem os pais que usaram de seu direito legítimo para pressionar seus representantes eleitos tinham em mente a legitimação da discriminação, do bullying ou da violência física contra estudantes LGBT; quando a legislação pede o combate a “todas as formas de discriminação”, o faz sem exceções. Seu objetivo era pura e simplesmente preservar os estudantes de qualquer tipo de doutrinação ideológica com premissas que negam seus valores morais e a própria natureza humana. E nem assim pode-se dizer que um professor estará proibido de tocar neste temas: a lei garante ao docente a liberdade de cátedra, que lhe dá o direito de abordar os temas que considere necessários à exposição do conteúdo prescrito no currículo escolar.
Isso, no entanto, não é suficiente para os ditos “progressistas” (sempre entre aspas, pois o que costumam defender raramente pode ser visto como autêntico progresso), que, tendo suas plataformas derrotadas nas urnas e no Legislativo, em nítida demonstração da vontade da população brasileira, burlam o jogo democrático recorrendo ao Judiciário para fazer valer suas pautas. No STF, infelizmente, essa atitude muitas vezes encontra ministros que, compartilhando do mesmo ideário, usurpam prerrogativas de parlamentares, violando a separação de poderes. Julgam, com isso, apenas estar cumprindo um papel “iluminista” e “contramajoritário”, mas acabam, mesmo inconscientemente, se portando mais como “déspotas esclarecidos” do século 21 que como guardiões da Constituição que juraram defender. Isso ainda pode ocorrer com a ADI 5.668, pois a retirada de pauta é apenas um adiamento, não uma rejeição. Que a sociedade permaneça atenta.