O governo federal superou mais uma batalha em sua campanha pela privatização da Eletrobrás nesta quarta-feira, quando o Tribunal de Contas da União (TCU) se reuniu e aprovou, por sete votos a um, a segunda etapa de análise da operação de desestatização, que corresponde ao modelo de venda escolhido pela União. O único voto divergente foi o do ministro Vital do Rêgo, que também havia sido a dissidência solitária em julgamento anterior, em fevereiro, quando estava em discussão o bônus de outorga a ser pago na privatização.
No entanto, a aprovação veio também com recomendações de ajustes que devem ser feitos pelo Ministério das Minas e Energia e pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). Um dos pontos mais importantes, se não o mais importante, é a revisão do cálculo do preço mínimo que será pedido por ação – este valor é sigiloso, mas auditores do TCU apontaram inconsistências. Além disso, entre as demais sugestões feitas o TCU pediu a manutenção de uma cláusula que dificulte uma eventual reestatização da empresa (preocupação válida, dado todo o discurso antiprivatização pregado pelos candidatos de esquerda ao Planalto) ou uma tomada de controle hostil por algum grupo privado.
A privatização é importante; que a iniciativa privada cuide de tudo aquilo que tem competência para administrar. Mas é fato que o Congresso entregou ao Brasil uma privatização que não é a ideal, com penduricalhos como o “jabuti das termelétricas”
As recomendações, no entanto, não têm o poder de paralisar o processo de privatização, ainda que os conselhos da área técnica devam ser levados em consideração pelo governo para que a venda ocorra de forma transparente e sem subvalorizações. Feitos todos os ajustes necessários, e obtido o aval tanto da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) quanto de sua contraparte norte-americana, a Securities and Exchange Commission (SEC), o governo fica livre para realizar a venda até meados de julho – não tão cedo quanto gostaria, mas também não tão tarde a ponto de deixar que as incertezas do período eleitoral contaminem o processo e afastem potenciais interessados. A privatização ocorrerá por meio de uma oferta de ações que reduzirá a participação da União na Eletrobrás, dos atuais 72% para no máximo 45%; com isso, o governo deixará de ser o acionista controlador da companhia.
Os adversários da privatização, no entanto, ainda não jogaram a toalha e prometem continuar enchendo o Poder Judiciário de ações enquanto houver a possibilidade de parar a venda. Houve uma tentativa frustrada de fazer com que o Supremo impedisse o TCU de continuar o julgamento da privatização, e já existem outras ações protocoladas tanto no STF quanto na Justiça Federal em três estados do Nordeste, de autoria de parlamentares petistas e dirigentes sindicais.
Por mais questionável que seja a tentativa de buscar o tapetão para reverter uma derrota legislativa, há alguns pontos nas ações que merecem consideração, como a avaliação dos custos do “jabuti das termelétricas”, colocado na versão final da medida provisória convertida em lei. Ele prevê a contratação de usinas termelétricas a gás que ficam distantes dos centros produtores e ficam em locais que não são conectados por gasodutos, que por isso precisarão ser construídos a um custo de dezenas de bilhões de reais. Para garantir que o jabuti não fosse vetado, os congressistas usaram um truque baixo de redação legislativa que obrigaria o presidente Jair Bolsonaro a vetar toda a privatização caso quisesse derrubar este item específico. A sociedade tem o direito de saber o custo dessa artimanha e como ela será paga, até para que possa pressionar os congressistas a encontrar um meio de reparar o estrago.
A privatização é importante; que a iniciativa privada cuide de tudo aquilo que tem competência para administrar, afastando as ingerências estatais que se refletem em interferência nas políticas da companhia, quadros inchados, indicações políticas e até corrupção. Mas é fato que o Congresso entregou ao Brasil uma privatização que não é a ideal, com penduricalhos criados sob medida para beneficiar grupos de pressão, parlamentares com interesses locais e amigos influentes. Onde for possível, os problemas devem ser revertidos sem que com isso o país perca a oportunidade de seguir adiante com um necessário programa de desestatização.
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