Em 2009, com o julgamento do mensalão já em andamento, o então presidente Lula indicou para o Supremo Tribunal Federal o advogado-geral da União, José Antonio Dias Toffoli. Apesar de reprovado duas vezes em concursos para juiz substituto em São Paulo, Toffoli tinha no currículo os cargos de assessor jurídico da liderança do PT em Brasília, entre 1992 e 2000. Foi advogado do PT nas campanhas presidenciais de 1998, 2002 e 2006. E trabalhou na Casa Civil, como subordinado de José Dirceu (um dos réus no julgamento do mensalão), entre 2003 e 2005. Todas essas ligações deveriam ter levado Toffoli a se declarar impedido de julgar o mensalão. Ele não o fez, e o resultado todos sabem: ele ajudou a criar as circunstâncias que culminaram no abrandamento das penas do núcleo político do esquema. Agora, ele se encontra no meio de outra controvérsia, desta vez em relação a um eventual julgamento dos investigados pela Operação Lava Jato.
Melhor mesmo seria que Toffoli tivesse, como Marco Aurélio, optado permanecer onde estava
Ao contrário do que ocorreu no mensalão, quando todos os ministros participaram do julgamento, os detentores de foro privilegiado que acabarem julgados o serão pela 2.ª Turma da corte (com exceção dos presidentes do Senado e da Câmara, que teriam seus casos analisados pelo plenário). Ocorre que a presidente Dilma Rousseff, em uma omissão muito criticada, ainda não nomeou um ministro para ocupar a vaga de Joaquim Barbosa, que deixou o STF em julho do ano passado. Assim, a 2.ª Turma está com um número par de integrantes (Gilmar Mendes, Teori Zavascki, Celso de Mello e Cármen Lúcia), o que poderia levar a empates em um eventual julgamento, beneficiando os réus. Para contornar a demora presidencial – que o decano Celso de Mello chamou, em fevereiro, de “irrazoável e até mesmo abusiva” –, Mendes sugeriu que um dos ministros da 1.ª Turma se transferisse para a 2.ª.
Houve quem interpretasse a sugestão como uma tentativa de evitar que a última vaga da turma acabasse nas mãos de um novo ministro indicado a dedo por Dilma com a função de livrar petistas em um eventual julgamento. Mas, se foi essa a intenção, o resultado não saiu a contento. No caso de transferências entre turmas, as regras do STF dão prioridade aos membros mais antigos. Assim, a preferência para migrar da 1.ª para a 2.ª Turma era de Marco Aurélio Mello, mas ele recusou a oferta. O segundo na lista era justamente Dias Toffoli, que pediu a mudança, aceita pelo presidente da corte, Ricardo Lewandowski.
Em defesa de Toffoli, pode-se dizer que a ideia não foi sua, e que ele meramente aproveitou a oportunidade que lhe foi apresentada. Mas apenas isso. Suas fortíssimas ligações com o PT tornariam altamente recomendável que, no caso de um julgamento resultante das investigações da Lava Jato, ele se declarasse impedido, o que deixaria novamente a 2.ª Turma com quatro ministros e o mesmo problema apontado por Mendes, mas desta vez sem solução rápida. Melhor mesmo seria que Toffoli tivesse, como Marco Aurélio, optado permanecer onde estava, deixando a possibilidade de uma transferência para Luiz Fux, Rosa Weber ou Luís Roberto Barroso.
A transferência fica ainda mais polêmica quando se sabe que Toffoli entra na posição de suceder Teori Zavascki na presidência da turma, em maio. Embora Zavascki permaneça como relator do processo da Lava Jato – responsável, por exemplo, por autorizar escutas e quebras de sigilo –, cabe ao presidente conduzir o julgamento. É uma posição importante demais para ser ocupada por alguém cuja atuação será analisada sob a sombra de seu passado de militância partidária. Agora, só se pode esperar que Toffoli paute suas ações pela lisura esperada de um ministro do Supremo, mas não há como negar que sua atitude, ao pedir a transferência de turma, criou uma turbulência totalmente desnecessária diante da gravidade da situação atual.
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