Quando o governo federal anunciou, em meados de agosto, uma lista de empresas que pretendia privatizar, uma gigante cobiçada estava de fora: a Eletrobrás. Isso, no entanto, não significava que o presidente Jair Bolsonaro, o ministro Paulo Guedes e Salim Mattar, o secretário de Desestatização, tivessem mudado de ideia quanto à estatal: ela só não estava na relação porque, afinal, já existe até mesmo um projeto de lei tramitando no Congresso para permitir a venda. O assunto voltou à pauta em uma reunião nesta segunda-feira, envolvendo Guedes, o ministro das Minas e Energia, Bento Albuquerque, e o presidente da Câmara, Rodrigo Maia.
Um aspecto positivo é o fato de o trio não estar discutindo se a Eletrobrás deve ser privatizada, mas o passo seguinte: como fazê-lo. Que há necessidade de aprovação do Legislativo já era algo certo mesmo antes da equivocada decisão do Supremo Tribunal Federal que condicionou todas as privatizações ao aval do Congresso. Isso porque a Eletrobrás já dependia de lei específica para sua venda, assim como a Petrobras, a Caixa Econômica e o Banco do Brasil. No entanto, a modalidade escolhida pelo governo de Michel Temer, por meio do Projeto de Lei 9.463/18, era a emissão de novas ações, diluindo a participação da União até ela deixar de ser a acionista majoritária. A opção de Paulo Guedes é pela venda da maior parte das ações que hoje estão nas mãos do governo, transformando a Eletrobrás em uma corporation, uma companhia de capital privado pulverizado sem acionista controlador. Para isso, ou o PL 9.463/18 terá de ser abandonado, com o envio de um novo projeto ao Congresso, ou o projeto atual terá de ser emendado para alterar a forma como ocorrerá a privatização. É esse dilema que governo e Câmara estão decidindo, para encontrar a forma que permitirá ao projeto ser aprovado mais facilmente.
O setor elétrico como um todo (e a Eletrobrás em particular) foi um dos que mais sofreu com o intervencionismo estatal da era Dilma Rousseff
E por “mais facilmente” entenda-se “com menos resistência”, já que privatizações sempre são tema sensível no Congresso, mexendo com brios nacionalistas e estatizantes, ressuscitando slogans fáceis sobre “soberania nacional” e “patrimônio do povo brasileiro”, mesmo sabendo que, no passado recente, as estatais acabaram transformadas em patrimônio não dos brasileiros, mas de um partido político que as usou como ferramenta de corrupção para alimentar seu projeto de poder. E também será preciso vencer a oposição de um grupo suprapartidário e nada ideológico, o dos parlamentares acostumados a fazer indicações políticas para cargos importantes na Eletrobrás e suas subsidiárias, e que perderão esse poder com a privatização.
Enquanto há subsidiárias da Eletrobrás cujos prejuízos as deixam perto de quebrar – e entidades sindicais aparentemente preferem esse desfecho, ou que a população toda pague pelo rombo, a vê-las privatizadas e eficientes –, a matriz sofre com investimentos abaixo do ideal. Recentemente, Guedes e Maia afirmaram que a privatização é a chave para que a Eletrobrás possa fazer os investimentos necessários para manter sua posição de relevância no setor de energia. Segundo o presidente da Câmara, dos R$ 16 bilhões anuais necessários de investimento, a estatal consegue aplicar apenas R$ 3 bilhões a R$ 4 bilhões. Situação que, até pouco tempo atrás, também era vista em outras estatais como Petrobras e Infraero, incapazes de cumprir sua parte em investimentos em blocos de pré-sal ou aeroportos concedidos à iniciativa privada.
O setor elétrico como um todo (e a Eletrobrás em particular) foi um dos que mais sofreu com o intervencionismo estatal da era Dilma Rousseff, mas também é um dos que podem ser perfeitamente operados pela iniciativa privada, dentro do espírito da subsidiariedade. Privatizar a Eletrobrás e as subsidiárias é, portanto, reconhecer que também nesta área o protagonismo cabe à iniciativa privada. Uma vez definido o melhor modelo para a venda, que governo e Congresso sigam trabalhando juntos e empenhados para que a privatização ocorra de modo a trazer o máximo de benefícios para os consumidores e para o governo.
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