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Em época de revisão do Código Florestal e de tragédias urbanas por falta de preservação de áreas verdes e rios, a discussão sobre a compensação por serviços ambientais chama a atenção da sociedade brasileira. O melhor é atender os produtores rurais que reivindicam uma legislação mais flexível ou criar formas de compensar quem, no campo ou na cidade, ajuda a evitar problemas como as enxurradas ou a poluição das águas? A resposta exige uma avaliação além da relação causa-efeito, numa perspectiva de longo prazo que considere as responsabilidades coletivas.

Os produtores rurais têm razão ao reclamarem das exigências do Código Florestal. Em milhares de pequenas e médias propriedades, a exigência de 20% de reserva ambiental – sem descontar a faixa de floresta a ser preservada na margem de nascentes e rios – inviabiliza o agronegócio. Esses agricultores não estão defendendo a degradação do ambiente, mas a própria sobrevivência. Em muitos casos, foram estimulados pelo próprio governo a abrir áreas que, em nome da lei, teriam de ser abandonadas.

Neste momento, com as tragédias que mataram centenas de pessoas no Rio de Janeiro, a resistência a esse discurso aumenta. As propostas que permitiriam ao produtor incluir as margens dos rios nos 20% de reserva verde, bem como continuar explorando encostas e topos de morros, deverão enfrentar resistência maior no Congresso. E o tempo para consenso é curto. O prazo para averbação dos 20% de reserva legal foi estendido por decreto em dezembro de 2009 para o próximo dia 11 de junho.

Há menos de cinco meses para uma definição, e o quadro é de paralisia. Quem averbar antes de 11 de junho pode estar tornando intocáveis áreas agricultáveis desnecessariamente se as exigências forem aliviadas. Quem não o fizer pode acabar sendo multado pelos órgãos ambientais no segundo semestre. Será que, mais uma vez, o assunto será prorrogado?

Enquanto os debates não evoluem em Brasília, surgem alternativas Brasil afora. O pagamento por serviços ambientais vem fazendo com que produtores rurais cumpram à risca a legislação antes de qualquer mudança. É o que ocorre em Apucarana, município de 120 mil habitantes cravado no Norte do Paraná, que há um ano remunera 64 produtores e, a partir de hoje, passa a compensar 133 para que eles preservem nascentes dos rios Pirapó e Tibagi.

Nessa primeira leva de produtores, é verdade, há muitos casos em que só faltava a averbação da reserva legal. A preservação de 20% da área rural mais as margens de rios já ocorria de fato. Eles vinham enfrentando pressão dos órgãos ambientais e viram no programa Oásis uma forma de evitar multas e reduzir perdas.

O valor repassado ao produtor – cerca de R$ 100 por nascente de água – não vai enriquecer ninguém, mas, por outro lado, é comemorado pelos agricultores, que não tinham a menor perspectiva de receber alguma compensação por estarem, em nome dos interesses coletivos, deixando parada boa parte de seu patrimônio. O repasse é mensal e traz alívio para quem só tem renda na colheita ou na entrega de lotes de frangos.

Entretanto, o país segue sem experiências de incentivo de peso à conversão de áreas agrícolas estruturadas em reserva legal. O programa de Apucarana não parece suficiente para a adesão da agricultura comercial, que produz commodities em grandes áreas e tem, na escala e no controle de custos e investimentos, vantagens competitivas diante do mercado globalizado. O quadro pede programas de compensação mais abrangentes.

A exploração agrícola de grandes áreas, encostas de morros ou várzes distantes das zonas urbanas não representa risco tão imediato como as ocupações irregulares em volta das cidades. Porém, a médio e longo prazo, traz consequências consideradas preocupantes na era das mudanças climáticas. Tudo que puder ser feito para reduzir a erosão, o assoreamento dos rios, a poluição das águas, configura um investimento no futuro.

A compensação por serviços ambientais precisa ser amplamente discutida a partir de exemplos como o de Apucarana. Em São Paulo e Minas Gerais há outros programas que também servem de referência. Essas primeiras experiências mostram que a prevenção pode custar menos do que o atendimento a famílias que perderam tudo ou mesmo que o tratamento da água distribuída pela rede pública. Trata-se de um investimento.

Os coordenadores do projeto de Apucarana, que há anos discutem o assunto, dizem que o caminho mais curto é identificar os beneficiários diretos dos programas de preservação e criar formas para que eles paguem por serviços ambientais, na medida de suas possibilidades. O repasse de 1% da arrecadação da Sanepar, adotado no município, é uma das alternativas. Em municípios com população pequena e território extenso, no entanto, pode não ser suficiente. Mas, em cidades maiores, tende a garantir incentivos de peso. Ainda não se chegou ao ponto de envolver a população de Maringá e Londrina – que recebe água das fontes de Apucarana – nas discussões. Será que o cidadão urbano está disposto a pagar 1% a mais na conta de água para reduzir o risco de catástrofes? Ninguém fez essa consulta ainda na região.

O desenvolvimento de programas de compensação, a identificação de fontes de recursos, a discussão de critérios para remuneração de quem preserva o ambiente são desafios que se impõem, seja pelos problemas ambientais seja pelos prazos da reforma da legislação ambiental. Soluções que tragam resultados sólidos dependem de discussões amplas, que considerem os interesses da sociedade – rural e urbana. Em meio a tanta indefinição, o que parece claro é que a responsabilidade da preservação precisa ser dividida, para que não se torne um ônus insuportável.

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