O ex-presidente Lula teve a pena aumentada para 17 anos no caso do sítio de Atibaia.| Foto: Edilson Rodrigues/Agência Senad
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A Oitava Turma do Tribunal Regional Federal da 4.ª Região (TRF4) se reuniu nesta quarta-feira para julgar o ex-presidente Lula e vários outros corréus pelo caso do sítio de Atibaia, em que Lula tinha sido condenado pela juíza Gabriela Hardt a 12 anos e 11 meses de prisão por corrupção e lavagem de dinheiro. Deveria ser um julgamento normal, a despeito da celebridade do principal acusado, mas a sessão ganhou uma relevância especial não tanto pela ampliação unânime da pena de Lula, que agora é de 17 anos, 1 mês e 10 dias, mas por ter se desenrolado sob a sombra de decisões recentes do Supremo Tribunal Federal que anularam julgamentos anteriores da Lava Jato por circunstâncias que também estavam presentes no caso do petista. E os três desembargadores optaram por uma aposta que, embora correta na sua fundamentação, traz consigo riscos consideráveis.

O STF já anulou duas condenações da Lava Jato – a do ex-presidente da Petrobras Aldemir Bendine e do ex-gerente Márcio de Almeida Ferreira – com base no fato de, em ambos os processos, haver também corréus que haviam feito delação premiada. As defesas alegaram que os delatores deveriam entregar suas alegações finais antes dos delatados, o que não ocorreu pelo simples fato de esse procedimento não estar previsto no Código de Processo Penal. Mesmo assim, os ministros acataram a tese e anularam as sentenças, forçando os processos a retornarem à primeira instância para novas alegações finais. Foi uma decisão desproporcional e formalista, pois em nenhum dos casos as defesas conseguiram comprovar que Bendine ou Ferreira tinham sido prejudicados – o que teria ocorrido, por exemplo, se um delator incluísse em suas alegações finais informações novas que prejudicassem os outros acusados, e o juiz não tivesse concedido tempo adicional para se defender das novas acusações.

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Para o TRF4, a tese que exige a comprovação do prejuízo ao réu era suficientemente forte para justificar a continuação do julgamento

No entanto, as decisões valeram apenas para Bendine e Ferreira; o Supremo decidiu, então, que deveria definir um padrão que pudesse ser aplicado em todos os casos – o que incluiria o de Lula, pois no caso do sítio a defesa pediu para entregar as alegações finais depois dos corréus delatores, o que foi negado por Gabriela Hardt – sempre em conformidade com o Código de Processo Penal, ressalte-se. Mas esse trabalho ficou para data incerta: no dia 3 de outubro, quando os ministros deveriam definir a modulação, o presidente do STF, ministro Dias Toffoli, não colocou o tema para o plenário porque a composição da corte não estava completa. A ausência de uma regra geral deixou a porta aberta para que os desembargadores do TRF4 decidissem manter o curso normal do processo, em vez de anular a sentença da primeira instância e devolver o processo para que o juiz Luiz Antonio Bonat, que assumiu os processos da Lava Jato em Curitiba, recebesse novas alegações finais.

Os três desembargadores da Oitava Turma – o relator João Pedro Gebran Neto, Leandro Paulsen e Carlos Eduardo Thompson Flores – deixaram claro, em seus votos, que o fato de Lula ter entregue suas alegações finais ao mesmo tempo que os corréus delatores não causou prejuízo concreto ao ex-presidente, pois elas não trouxeram nada de novo, e que por isso o julgamento na primeira instância não deveria ser anulado. O argumento do trio de magistrados é irretocável. De fato, se houve respeito ao Código de Processo Penal, a única possibilidade de anulação seria a de haver novidades nas alegações finais dos delatores, sem que os delatados ganhassem prazo adicional para se defender de novas acusações. Neste caso, sim, teria havido cerceamento de defesa e violação de direitos garantidos pela Constituição. Mas, como isso não se verificou no caso do sítio de Atibaia, não haveria motivo para anular a sentença.

Por mais acertado que seja o raciocínio dos desembargadores, ele não deixa de ser uma aposta, pois não se sabe o que o STF decidirá sobre a questão. Se os ministros resolverem que a obrigação de prazos diferentes nas alegações finais valerá só para processos ainda em curso, ou que há a necessidade de a defesa comprovar o prejuízo concreto sofrido pelo réu delatado, a decisão do TRF4 estará resguardada. Mas, se o Supremo mantiver o entendimento formalista que prevaleceu nos habeas corpus de Bendine e Ferreira, definindo que o simples fato de as alegações finais serem entregues ao mesmo tempo já é motivo para nulidade, todo o trabalho feito nesta quarta-feira terá sido perdido e o caso do sítio de Atibaia terá de voltar para a primeira instância, com risco até mesmo de prescrição, dependendo da demora para o julgamento dos recursos e da pena imposta a Lula. Os desembargadores do TRF4 estavam conscientes desta possibilidade, mas, em sua opinião, a tese que exige a comprovação do prejuízo ao réu era suficientemente forte para justificar a continuação do julgamento; que também os ministros do Supremo, quando analisarem o tema, compreendam o acerto deste argumento, que preserva a segurança jurídica.