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Editorial

“Twitter Files Brazil” reafirmam excessos do TSE e outras cortes

(Foto: Marcio Antonio Campos com Midjourney)

Em dezembro de 2022, o bilionário Elon Musk, que dois meses antes havia concluído a compra do Twitter, entregou a jornalistas documentos internos que descreviam a forma como a mídia social havia ajudado a campanha de Joe Biden em 2020, atendendo de forma diferenciada pedidos de remoção de conteúdo feitos pela campanha democrata em comparação com a de seu adversário, Donald Trump. Poucos dias depois, Musk insinuou que o mesmo poderia ter ocorrido no Brasil. Quase um ano e meio depois, o dono do agora chamado X entregou ao jornalista Michael Shellenberger vários e-mails internos da companhia enviados entre 2020 e 2022 – Shellenberger publicou o material em colaboração com a Gazeta do Povo.

No entanto, ao contrário do caso norte-americano, em que os pedidos vinham basicamente das duas campanhas, no Brasil os grandes protagonistas foram as autoridades, especialmente (mas não apenas) o Tribunal Superior Eleitoral. E uma característica da maioria das exigências era o fato de elas extrapolarem completamente as possibilidades dadas por leis como o Marco Civil da Internet. Um conselheiro jurídico sênior do Twitter chegou a ser investigado por ordem do Ministério Público paulista por se negar a entregar dados pessoais de usuários à CPI das Fake News. O TSE chegou ao cúmulo de pedir, sob ameaça de multa, dados de usuários que publicaram certas hashtags que nem de longe constituíam qualquer crime, como um pedido pelo voto impresso auditável. A equipe de consultores jurídicos do Twitter, em várias ocasiões, avaliou que as demandas caracterizavam invasão de privacidade e pesca probatória, e que o elemento político era o preponderante, diante da pouca solidez jurídica dos pedidos.

Os documentos agora divulgados não chegam a ser nenhuma revelação bombástica, mas uma reafirmação, vinda de uma fonte importante, dos vários procedimentos contra legem que os tribunais superiores adotaram, sob alegações surreais e novilinguísticas

A bem da verdade, ninguém que tenha acompanhado a forma como o TSE e o STF se portaram durante o período eleitoral pode se dizer realmente surpreso com o conteúdo dos Twitter Files Brazil. Os documentos agora divulgados não chegam a ser nenhuma revelação bombástica, mas uma reafirmação, vinda de uma fonte importante, dos vários procedimentos contra legem que os tribunais superiores adotaram, sob alegações surreais e novilinguísticas como “situação excepcionalíssima” ou “arco de experimentação regulatória” para justificar censura prévia, que se dava também pela suspensão de perfis em mídias sociais.

Ressalte-se que se trata de um Twitter anterior ao período Musk, ou seja, uma rede social que não era tão diferente das outras em termos de viés político no momento de suprimir ou restringir o alcance de conteúdos por conta própria; não deixa de ser sintomático que, mesmo para os padrões daquele Twitter, a avaliação tenha sido a de que as autoridades brasileiras foram longe demais na perseguição a conservadores e bolsonaristas. Aliás, chama a atenção também o que se diz a respeito da colaboração praticamente bovina de outras big techs; enquanto o Twitter resistiu a várias demandas enquanto pôde (ao contrário de seus colegas norte-americanos, que atendiam com gosto aos pedidos dos democratas), outras empresas entregavam dados de usuários sem ordem judicial alguma – o Google, dono do YouTube, entregou à CPI da Covid 200 gigabytes de vídeos que já haviam sido retirados do ar por suposta desinformação sobre a pandemia.

Bem sabemos que as chances de os Twitter Files Brazil gerarem qualquer tipo de responsabilização jurídica das autoridades envolvidas nos pedidos absurdos são praticamente nulas – o máximo que deve ocorrer em Brasília será a reclamação esperada de parlamentares prejudicados pelo Estado policialesco estabelecido por STF e TSE, mas sem consequência prática alguma. Seria extraordinário se a repercussão negativa, inclusive fora do Brasil, fosse tamanha que levasse os próprios ministros a perceberem seus erros e partirem para a autocontenção, em vez de dobrar a aposta na censura como têm feito até agora, mas esta também é uma hipótese pouco provável. A essa altura do campeonato, já será bastante satisfatório se a documentação agora tornada pública abrir os olhos de muitos que, antes, durante e depois do período eleitoral, aplaudiram e defenderam os atos dos tribunais superiores sob a justificativa de “defesa da democracia”.

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