O presidente Jair Bolsonaro, a equipe econômica e o Congresso chegaram a dois consensos sobre a prorrogação do auxílio emergencial. O primeiro é o de que ela realmente ocorrerá, com a primeira parcela de R$ 250 sendo paga em março e com duração de quatro meses. O segundo é o de que o cenário ideal, de um corte de outros gastos no Orçamento da União para garantir os R$ 30 bilhões estimados como custo total do auxílio, está descartado, substituído por uma improvisação que garantirá o pagamento do benefício.
A equipe econômica comandada por Paulo Guedes, conformada com a inevitabilidade da extensão do auxílio, pretendia que ao menos ele ocorresse dentro de um cenário de responsabilidade fiscal ou, no mínimo, de segurança jurídica. “Se eu gastar sem autorização, é quebra da Lei de Responsabilidade Fiscal, é quebra da regra de ouro, é endividamento não permitido”, disse o ministro na quinta-feira durante um evento. E, nisso, ele ganhou a companhia do presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto. “Um pacote que leve a uma deterioração da situação fiscal pode levar a um desalinhamento de preços que pode afastar investimentos. Então pode ocorrer o resultado contrário, de contração da economia”, afirmou em palestra.
Resta esperar que o desenho final da proposta seja razoável e que o tempo de duração do novo auxílio emergencial seja suficiente para reforçar as condições necessárias à recuperação da economia
Por esses critérios, o melhor cenário seria a permissão para redução proporcional na jornada e salário dos servidores públicos, que está prevista na PEC Emergencial. O funcionalismo, é preciso lembrar, passou ileso pela catástrofe econômica da pandemia, tendo garantido o emprego e o salário integral, ao contrário de dezenas de milhões de trabalhadores da iniciativa privada. Mas Guedes também se mostrara conformado com o que considerava o mínimo aceitável: uma reedição da PEC do Orçamento de Guerra, que abre portas para despesas adicionais sem necessidade de cortes equivalentes, e também afasta o risco de rompimento do teto de gastos ou outros dispositivos legais.
Para a surpresa de praticamente ninguém, entre cortar gastos – ainda por cima, irritando uma categoria altamente mobilizada como o funcionalismo – e não precisar fazê-lo, a classe política já tinha sua preferência. Parlamentares chegaram ao cúmulo de defender novos impostos ou contribuições para bancar o auxílio, alegando que era preciso “dividir o custo entre a população”, nas palavras do deputado João Carlos Bacelar (PL-BA) – como se a população já não estivesse arcando com os custos do caos econômico desde março do ano passado. O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), não chegou a este extremo, e até disse que propostas de corte de gastos teriam tramitação rápida, mas não escondia sua predileção por um novo “orçamento de guerra”.
No fim, o pacote que ficou acertado entre o ministro da Economia e os presidentes da Câmara e do Senado contemplou pedidos e concessões de todos os lados: uma PEC semelhante (mas não idêntica) à de 2020, combinada com a adição de cláusula de calamidade pública na PEC do Pacto Federativo, com a vinculação do auxílio a medidas de ajuste e de contenção de gastos, como queria Guedes – mas a natureza exata das contrapartidas não foi divulgada pelo trio, o que ainda permite algum grau de incerteza sobre o alcance dessas medidas de contenção de gastos.
- Sem Orçamento não há como discutir auxílio emergencial (editorial de 8 de fevereiro de 2021)
- Emergências não podem ser rotineiras (artigo de Ubiratan Iorio, publicado em 9 de fevereiro de 2021)
- Ainda não nos preocupamos com o combate à pobreza (artigo de Walcir Soares Junior, publicado em 9 de fevereiro de 2021)
Resta esperar que o desenho final da proposta, prometido para o dia 18, seja razoável, e que o tempo de duração do novo auxílio emergencial seja suficiente para reforçar as condições necessárias à recuperação da economia. Lira disse, em entrevista, que em três ou quatro meses o Congresso conseguiria votar projetos que aumentem a confiança do investidor no Brasil e que facilitem a geração de emprego e renda. Além disso, a vacinação precisa acelerar seu ritmo e chegar a cada vez mais brasileiros. Se nada disso ocorrer, no meio de 2021 certamente estaremos mais uma vez discutindo uma nova extensão do auxílio.