O pluripartidarismo brasileiro nunca foi tão plural no Congresso Nacional. Serão 30 os partidos com representação na Câmara dos Deputados, um número recorde – são cinco legendas a mais que na configuração atual da casa legislativa, e duas a mais em comparação com o resultado das eleições de 2014. No Senado, os 81 parlamentares estão divididos entre 20 partidos, metade deles com apenas um ou dois senadores. Algumas ascensões vertiginosas, derrotas surpreendentes e características mais gerais deste novo Congresso merecem uma análise.
Do ponto de vista puramente partidário, o maior vitorioso foi o PSL de Jair Bolsonaro, que, de partido nanico, saltou para a segunda maior bancada da Câmara, com 52 deputados, e elegeu senadores pela primeira vez: foram quatro. Outras bancadas até agora numerosas tiveram grandes prejuízos: caso do PSDB, que tem 49 deputados hoje, mas elegeu apenas 29; do Democratas, que cai dos atuais 43 para os mesmos 29; e do MDB, que baixa de 51 para 34 deputados. Já a esquerda elevou ligeiramente sua participação na Câmara, passando de 127 para 141 cadeiras, graças especialmente ao PDT, que ganhou dez deputados, enquanto o PT perdeu cinco, apesar de ainda ter a maior bancada da Câmara, com 56 parlamentares. Os partidos explicitamente identificados com a direita também cresceram, passando de 43 para 104 deputados. Ou seja, os partidos mais ao centro, mesmo enfraquecidos, continuarão a ser o fiel da balança, e entre eles há desde os que apoiam qualquer um, contanto que seja governo, e outros que teriam mais resistência a formar a base ou de Bolsonaro, ou de Fernando Haddad.
O Congresso eleito tem posições mais firmes em temas morais e é mais propenso a defender a liberdade econômica
A queda dos partidos mais tradicionais e as votações expressivas de algumas legendas ou candidatos à direita mostram que o eleitor tem buscado mais firmeza em posições políticas ou morais. Protagonistas do impeachment de Dilma Rousseff, por exemplo, foram eleitos: o Movimento Brasil Livre fez pelo menos quatro deputados – um federal, Kim Kataguiri, e três estaduais: Arthur do Val (SP), Homero Marchese (PR) e Ulysses Moraes (MT). A jurista Janaina Paschoal, uma das autoras do pedido de cassação de Dilma, teve 2,06 milhões de votos para a Assembleia Legislativa paulista, recorde nacional para candidatos ao Poder Legislativo. Os movimentos pró-vida também comemoraram a eleição de diversos candidatos comprometidos com a defesa da vida desde a concepção e que devem estar na linha de frente dos debates sobre o aborto.
As composições das casas legislativas já deram início a todo tipo de especulação sobre que grau de governabilidade os dois candidatos à Presidência da República teriam se fossem eleitos, o que passa pelas costuras feitas já neste segundo turno. Os partidos de esquerda vêm anunciando apoio a Haddad; a tendência das demais legendas até o momento tem sido a neutralidade; em alguns casos, como o do PP, integrante do “centrão”, trata-se única e exclusivamente daquele pragmatismo que consiste em ver para onde o vento sopra; outros partidos, como o Novo, se recusam a apoiar algum candidato por discordâncias em relação a propostas ou à personalidade dos postulantes. Isso não tem impedido lideranças desses partidos de declarar apoio a Jair Bolsonaro: é o caso de Romeu Zema, que disputa o governo de Minas Gerais pelo Novo; Ana Amélia Lemos, do PP, que foi candidata a vice-presidente na chapa do tucano Geraldo Alckmin; e João Doria, outro tucano, que está no segundo turno em São Paulo.
Mas Bolsonaro tem adotado uma estratégia diferente para construir uma base parlamentar em caso de vitória: negociar com bancadas temáticas em vez de partidos. O candidato do PSL já tinha garantido o apoio da Frente Parlamentar Agropecuária e da Frente Parlamentar Evangélica ainda antes do primeiro turno – a primeira tem 261 deputados e a segunda, 199, com sobreposições, pertencentes às mais diversas legendas. Outra bancada, menor, que também deve apoiar Bolsonaro é a Frente Parlamentar da Segurança. Não são raros os casos em que as bancadas temáticas atuam de forma mais coesa que as próprias bancadas partidárias, mas a eficácia de tal estratégia ainda é uma incógnita, especialmente se os partidos que fizerem oposição a um eventual governo Bolsonaro tiverem integrantes nas bancadas do agronegócio ou evangélica e decidirem aplicar mecanismos para garantir a fidelidade dos seus parlamentares.
Apesar da permanência ou da eleição de algumas figuras deploráveis ou desqualificadas, incluindo corruptos notórios, entusiastas de ditaduras, o Congresso que emergiu das urnas é, sem dúvida, menos “morno”, com posições mais firmes em temas morais e mais propenso a defender a liberdade econômica, e deveremos ver vários estreantes assumindo papéis de protagonismo ao promover, na tribuna, nas comissões e na imprensa, valores caros ao brasileiro e a construção de um clima que incentive o empreendedorismo de que o Brasil tanto precisa para sair da crise. As expectativas são altas: que os parlamentares não decepcionem o país.