Como o presidente Jair Bolsonaro e o ministro Paulo Guedes, da Economia, vinham prometendo, a reforma da Previdência será a grande prioridade do governo assim que o Congresso Nacional retomar suas atividades, em fevereiro. O secretário de Previdência e Trabalho, Rogério Marinho, disse que o texto da reforma será enviado ao Legislativo no máximo até a terceira semana do próximo mês. Faltam apenas alguns ajustes finais, uma conversa com os novos presidentes da Câmara e do Senado (que serão eleitos na sexta-feira), e a aprovação final de Bolsonaro, que se recupera da cirurgia em que os médicos retiraram a bolsa de colostomia que o presidente usava desde o atentado de setembro de 2018.
O governo não tem como controlar a velocidade do trâmite interno da reforma no Congresso, já que ela terá de passar por comissões e duas votações em cada casa legislativa, mas a expectativa é a de que o texto seja aprovado ainda no primeiro semestre deste ano. Que esta seja a grande batalha de Bolsonaro neste início de mandato faz todo o sentido: sem reforma da Previdência não há como o Brasil sair da trajetória fatal da dívida pública. O governo sonha com algumas receitas extraordinárias, como os R$ 100 bilhões do megaleilão de petróleo que pode ocorrer ainda neste ano, ou os R$ 110 bilhões em participações das quais o BNDESPar pretende se desfazer. Mas elas só resolvem o problema de hoje, não a deficiência estrutural de uma previdência em crise. Os números de 2018, divulgados na terça-feira, são assustadores: o INSS teve déficit de R$ 195,2 bilhões; o regime dos servidores públicos civis, R$ 46,4 bilhões; e o regime dos militares, R$ 43,9 bilhões.
A reforma tem de ser abrangente e não pode ser suave a ponto de exigir novos ajustes em um futuro próximo
Tais números mostram que a reforma tem de ser abrangente e não pode ser suave a ponto de exigir novos ajustes em um futuro próximo. Entre os itens-chave está a idade mínima para pleitear a aposentadoria. Michel Temer havia proposto 65 anos para homens e 62 para mulheres, patamar bastante razoável. Amenizar esses números pode anular o impacto positivo da reforma para as contas públicas. Da mesma forma, é preciso haver muito cuidado nas regras de transição para quem já está no mercado de trabalho. Elas são uma questão de justiça, especialmente para aqueles que estavam prestes a conseguir se aposentar pelas regras atuais, mas não podem apresentar “pedágios” tão baixos que acabem contradizendo os princípios que nortearão a reforma. As regras de transição são justamente um dos temas que ainda devem ser ajustados. Marinho afirma que há vários modelos em estudo, e o governo tem demonstrado abertura a opiniões vindas de fora da equipe econômica, consultando especialistas em previdência. Importa, ainda, que, no processo de negociação no Congresso, o projeto do governo não acabe desidratado a ponto de mitigar os efeitos benéficos da reforma, como havia ocorrido com a proposta de Temer.
Leia também: A prioridade das prioridades (editorial de 25 de janeiro de 2019)
Leia também: Previdência, o primeiro grande desafio de Bolsonaro (editorial de 7 de janeiro de 2019)
Outra incógnita é o modelo que será adotado para determinadas categorias de servidores, como policiais e militares, grupos com os quais Bolsonaro tem grande afinidade. Uma das primeiras declarações do novo comandante do Exército, general Edson Pujol, após assumir o cargo foi o pedido para que os militares ficassem de fora da reforma. É evidente que, pela própria natureza de seu trabalho, certas profissões fazem jus a regras diferenciadas para a aposentadoria, e é o caso de integrantes das forças de segurança e das Forças Armadas. Eles têm o direito de pleitear uma atenção especial na reforma, e devem ser contemplados; só não podem exigir a manutenção das regras atuais, que são inviáveis – o déficit do regime especial dos militares o comprova. Todos os brasileiros serão chamados a dar sua conta de sacrifício para que o país possa voltar a ter recursos para investir, e com os membros das Forças Armadas não pode ser diferente.
Com o projeto de reforma quase pronto, o governo busca apoio parlamentar para conseguir os votos necessários para aprovar as mudanças. Nesta quarta-feira, Marinho esteve com governadores, pedindo que eles mobilizem as bancadas estaduais – a aprovação da reforma será bem-vinda também nos estados, que terão de replicar para seu funcionalismo as regras que valerem para os servidores federais. Ainda que a base aliada de Bolsonaro não chegue a três quintos de cada casa, o país conta a responsabilidade daqueles parlamentares e partidos que, mantendo independência do governo, têm consciência da necessidade da reforma. Esta também será a hora deles.
Deixe sua opinião