Dentre as várias medidas que constam do trio de propostas de emenda à Constituição apresentado ao Senado na terça-feira pelo presidente Jair Bolsonaro e pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, há uma série de dispositivos que farão do orçamento uma peça muito mais realista, com ênfase na responsabilidade fiscal. Neste sentido, a PEC do Pacto Federativo há um item defendido como ferramenta de política industrial, mas que na prática se tornou fonte de distorções, recebendo atenção da equipe econômica: os subsídios e benefícios tributários.
Pela regra que a PEC do Pacto Federativo propõe, isenções fiscais e benefícios semelhantes terão de ser reavaliados a cada quatro anos e, a partir de 2026, essas medidas, quando provenientes da União, não poderão superar 2% do Produto Interno Bruto – caso esse teto seja ultrapassado, o governo federal não poderá conceder, ampliar ou renovar tais benefícios para se adequar à regra. Para se ter uma ideia do impacto atual das isenções e renúncias fiscais, o orçamento de 2019 previa que apenas neste ano o governo abriria mão de R$ 307 bilhões, o equivalente a 4,5% do PIB de 2018, mais que o dobro do déficit primário previsto para este ano e cerca de um terço da economia total que a reforma da Previdência proporcionará aos cofres públicos em dez anos. E as renúncias já foram até mais abrangentes, chegando a 6,7% do PIB durante o governo Dilma Rousseff, como mostrou o colunista Guido Orgis.
A PEC do Pacto Federativo obriga o gestor a adotar critérios muito mais racionais na concessão de incentivos
Apesar da farra recente com as renúncias e incentivos fiscais, transformadas em uma política aplicada sem critério algum, em que ganham os “amigos do rei” ou aqueles que sabem gritar mais alto, aboli-las completamente seria um erro grave. O Estado precisa ter à disposição ferramentas para implementar uma política de incentivos realmente digna do nome, pois está dentro de suas capacidades identificar e fomentar certos setores ou vocações econômicas regionais, quando determinada atividade considerada importante ainda não tem condições de florescer apenas pelos esforços dos indivíduos e da iniciativa privada. Um caso recente em discussão, por exemplo, é o dos subsídios para a adoção da geração distribuída de energias renováveis, como a solar ou a eólica; aqui, o incentivo se baseia na necessidade de ampliar a capacidade energética do país de forma limpa, estimulando a aquisição de sistemas cujo custo ainda é alto.
Ao limitar os subsídios a 2% do PIB – o que ainda é um valor considerável –, a PEC do Pacto Federativo obriga o gestor a adotar critérios muito mais racionais na concessão de incentivos, em vez do mero favorecimento a empresários amigos ou a setores que têm um lobby mais eficiente em Brasília. Uma distorção comum no país, por exemplo, é a manutenção de incentivos fiscais a atividades já consolidadas e que, graças ao benefício concedido, se acomodam, deixando de lado a busca pela competitividade e pela inovação. Isso cria um círculo vicioso: sem o incentivo, alegam os empresários beneficiados, as empresas não conseguirão se sustentar diante da concorrência interna ou externa, falindo ou, no mínimo, demitindo funcionários e aumentando o desemprego. A revisão periódica dos benefícios ajudará a descobrir se a renúncia fiscal está tendo efeito prático na evolução do setor contemplado, ou se levou a uma estagnação.
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Em um cenário ideal, talvez nem fosse necessário impor limites à capacidade do Estado de, guiado por uma visão abrangente e um projeto de desenvolvimento escolhido pelo eleitor, conceder subsídios e incentivos às atividades que deles necessitam. Mas o passado recente mostra que o Brasil usou mal esta ferramenta, abrindo mão de recursos que poderiam ter sido dirigidos à melhoria dos serviços oferecidos ao cidadão ou, no mínimo, à amenização da precária situação fiscal que a União enfrenta. A limitação prevista na PEC do Pacto Federativo certamente enfrentará oposição dos lobbies de setores que se acostumaram à benesse, mas ela é necessária no cenário atual.