Os enormes escândalos de corrupção desvendados por operações como a Lava Jato, a Zelotes, a Publicano, a Quadro-Negro e tantas outras, atuais e passadas, levam a população a se questionar: como chegamos a esse estado de coisas? O que acontecerá com os culpados? Nossas instituições são fortes o suficiente para lidar com esquemas envolvendo os poderosos? São perguntas que têm a ver com delitos já cometidos. Resta outra, que a sociedade também faz: como evitar que isso volte a acontecer no futuro? Para essa questão o Ministério Público Federal ofereceu uma resposta: as chamadas “10 medidas contra a corrupção”, que viraram projeto de lei de iniciativa popular – graças à coleta de 2 milhões de assinaturas – apresentado no Congresso no último dia 29.
O projeto serve para agregar diversas iniciativas, algumas das quais já objeto de proposições que estão no Congresso, mas que não estão exatamente “em andamento” – estão mais para “paradas em alguma gaveta ou comissão”. Algumas das propostas têm causado mais polêmica especialmente entre os juristas “garantistas”, como a que prevê “execução imediata da condenação quando o tribunal reconhece abuso do direito de recorrer”, ou mudanças nas circunstâncias em que provas podem ser declaradas nulas, nos prazos de prescrição e no andamento das ações por improbidade administrativa. No entanto, parece-nos que essas alterações específicas não ameaçam as garantias fundamentais dos acusados; o que o projeto faz é eliminar as possibilidades de protelação indefinida, graças ao uso de recursos dos mais diversos, usados – ou abusados – não para garantir o direito à plena defesa, mas para evitar a conclusão do processo, pois não são poucas as estratégias de defesa que consistem apenas em fazer o julgamento se arrastar até a prescrição do crime, resultando em impunidade.
As “dez medidas” aproveitam o que de melhor está sendo feito mundo afora no combate à corrupção
Mas seria injusto reduzir a dimensão das “dez medidas” a seu aspecto penal ou processual. Elas são um conjunto amplo que ataca o problema da corrupção em todas as suas facetas, e que vão desde a conscientização dos agentes públicos até propostas para que se possa recuperar mais facilmente os recursos desviados. Se não fosse assim, o combate à corrupção acabaria sempre com pernas débeis, deixando pontas soltas por meio das quais os ladrões dos cofres públicos continuariam se beneficiando.
As “dez medidas” não são um fruto irrefletido que responde de forma populista à demanda de um povo cansado de roubos. São o resultado de pesquisa de vários especialistas, que foram buscar as melhores práticas, com resultados amplamente comprovados, em outros países que estão em um estágio mais avançado no que tange ao combate à corrupção e analisaram quais dessas práticas poderiam ser incorporadas ao ordenamento jurídico nacional. Trata-se de aproveitar o que de melhor está sendo feito mundo afora.
E esse trabalho também serve para identificar os exemplos negativos. Caso emblemático é o da Itália. A Operação Mãos Limpas, com a qual a Lava Jato é comparada, causou um abalo sísmico no sistema político italiano, demolindo partidos de várias vertentes ideológicas. A reação dos parlamentares que sobreviveram à limpeza foi a pior possível: a aprovação de leis que dificultaram o combate à corrupção. É este caminho que não podemos, de maneira alguma, repetir no Brasil. As “dez medidas” são uma maneira eficaz de garantir que não sigamos o mau exemplo italiano.
Nestes tempos em que a polarização política está paralisando o Congresso, que espera pela definição do impeachment e não leva adiante praticamente nenhuma medida relevante, já que governo e oposição se bloqueiam mutuamente, a plataforma do combate à corrupção parece ser a única com o potencial de agregar os dois grupos. Que os diversos partidos possam, pelo menos neste caso, colocar de lado diferenças e interesses imediatos e trabalhar por um futuro sem corrupção.
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