A imagem de terra arrasada do pequeno município de União dos Palmares, Alagoas, atingido pela enchente avassaladora que afeta estados do Nordeste, publicada pela Gazeta do Povo e grande parte dos jornais do país na primeira página, ontem, comoveu os brasileiros pela violência das águas. Além de destruir totalmente a cidade e afetar gravemente outros 30 municípios, as chuvas causaram a morte de dezenas de pessoas e o desaparecimento de pelo menos outras 600 500 delas somente em União dos Palmares. Esse era o triste primeiro balanço da enchente em Alagoas e Pernambuco, os estados mais atingidos, que deixaram sem casas, até agora, outras 120 mil pessoas.
A defesa civil comparou o rastro de destruição da força das águas, em União dos Palmares e outros municípios ao longo de uma faixa de 60 km às margens do Rio Mundaú, em Alagoas, à tragédia da tsunami na Ásia, que ceifou milhares de vidas e aniquilou cidades costeiras. Não é para menos. Os dramáticos depoimentos de testemunhas dão conta de que, nesse estado, a situação é totalmente desoladora.
Famílias destruídas buscam nos meios dos destroços os corpos de seus entes queridos. Não há água potável. Os moradores estavam bebendo água salobra. Muitos feridos ficaram sem atendimento médico adequado. A energia elétrica foi interrompida por mais de um dia. As estradas interditadas. E o socorro demorou a chegar. Em Pernambuco, o cenário não era diferente. Especialmente no município de Palmares, no Sul, com o transbordamento do Rio Una. São milhares os desabrigados. A força da correnteza destruiu duas pontes, provocando a total interdição da BR-101.
O que se vê nesses dois estados nordestinos é uma tragédia anunciada. A mesma que assolou Santa Catarina e Minas Gerais, em 2008, que atingiu com menos gravidade alguns municípios paranaenses, no início deste ano, e que afetou com a mesma violência o estado do Rio de Janeiro, em abril último.
As enchentes no Rio haviam causado mais mortes do que qualquer outro incidente semelhante, em 2010, em qualquer parte do mundo. Nos últimos 12 meses, aquela inundação havia sido considerada a quinta mais fatal do mundo. Os números de mortos passaram de 100. Como é assustador o número de desaparecidos em Alagoas, as autoridades temem que as chuvas possam ter causado uma tragédia muito maior.
É evidente que os mais atingidos são sempre os mais pobres, que habitam as encostas e as margens dos rios. Milhares de famílias, oprimidas pela desigualdade econômica e social e pela omissão do poder público, na luta desesperada pela sobrevivência, habitam qualquer pedaço de terra, correndo toda a sorte de riscos. Em números, esse quadro por ser resumido da seguinte forma: um relatório de 2009 do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud) mostra que apenas 11% das pessoas expostas a catástrofes naturais vivem em países pobres, mas que é em países pobres que ocorrem mais de 53% das mortes.
Esse é um problema complexo e difícil de resolver. Não há como desalojar, a curto prazo, as imensas populações das áreas de risco e de ocupações irregulares dos grandes centros urbanos e de boa parte dos municípios brasileiros. Além de ser praticamente impossível fazer obras monumentais de contenção. O desmatamento causa de muito desses desastres é uma realidade ainda marcante. A falta de educação muito mais. Só à custa de muito planejamento e investimentos gigantescos, a longo prazo, é que esse quadro poderá ser alterado, gradativamente. Mas é preciso começar a encarar o problema com a seriedade que merece, com políticas globais e ações integradas entre governos e municípios. Nenhum brasileiro merece pagar esse preço pelo descaso com a vida humana.