Não há quem não tenha se entristecido e se consternado com a história de Rogério Casagrande. O empresário, de 50 anos, morreu vítima de um infarto esta semana, depois de ter decidido fechar sua loja no centro de Curitiba após cinco arrombamentos só este ano. Em outubro passado, já tinham sido outros dois. Na última invasão, os assaltantes chegaram a cortar a luz do estabelecimento para que o alarme não disparasse e levaram até as torneiras da pia. Em um país onde já são mais de 60 mil as mortes violentas a cada ano, não se deve nunca cair na tentação de transformar a tragédia de vidas perdidas apenas em estatísticas. No entanto, os altos custos sociais que a violência traz ao Brasil são uma realidade que não pode ser ignorada.
Nossas convicções: O princípio da subsidiariedade: menos Estado e mais cidadão
Todo ano, o Instituto de Economia e Paz (IEP, na sigla em inglês), sediado na Austrália, calcula o impacto econômico da violência, considerando os custos de guerras e atentados terroristas, mas também de gastos internos com segurança pública e das perdas decorrentes de crimes contra a vida e o patrimônio. De acordo com a última versão Índice Global da Paz do IEP, a violência custa ao Brasil algo em torno de US$ 402 bilhões ao ano, em níveis de paridade de poder de compra de 2016. Isso representa 12.6% de toda a riqueza produzida pelo país e uma perda de US$ 1.952 na renda de cada brasileiro a cada ano. Considerando que o Brasil não está em guerra civil, não está envolvido em conflitos internacionais e não sofre com o terrorismo, quase todo esse passivo entra na conta do fracasso da segurança pública. Num país pobre, é uma perda brutal. Para se ter uma ideia da disparidade, o Bolsa Família custou 0.44% do PIB em 2017.
O Susp enfrentará prioritariamente a questão da eficiência do aparato estatal
Em 2016, o Brasil registrou 61.619 mortes violentas, o maior número da história na série do Fórum Brasileiro de Segurança Pública. Nas contas do Small Arms Survey, que considera mortes não intencionais e decorrentes de intervenções policiais, o número de brasileiros mortos passou dos 70 mil no mesmo ano. Um levantamento do Instituto Sou da Paz, de 2017, com base nos dados de apenas seis estados que os disponibilizaram, mostrou que o índice de esclarecimento de homicídios é de apenas 20,7%, ante 84% no Canadá e 66% nos Estados Unidos. O novo sistema do Banco Nacional de Monitoramento de Prisões (BNMP 2.0) do CNJ, ainda nem plenamente implementado, já conta 71.816 mandados de prisão pendentes de cumprimento. Os dados são estarrecedores e, até agora, o Brasil não conta senão com casos isolados de ações que conseguiram melhorar um pouco o quadro, como a queda da taxa de homicídios em São Paulo desde 2005 e o “Pacto pela Vida” em Pernambuco, que alcançou bons resultados por cerca de uma década.
O Sistema Único de Segurança Pública (Susp), aprovado pelo Congresso na semana passada e que agora está na mesa do presidente Michel Temer (MDB) para sanção, aponta um caminho para começar a equacionar o problema. O projeto prevê a padronização da coleta de dados pelos órgãos de segurança pública, o acompanhamento da eficácia de ações e políticas públicas, o compartilhamento de informações e o trabalho conjunto dos três Poderes e do Ministério Público. Cada uma das ações visa suprir uma lacuna das políticas de segurança no Brasil, mas todas serão implementadas em no mínimo dois anos a partir da sanção. O Susp também dará um passo importante com a criação de Conselhos de Segurança Pública e Defesa Social no âmbito da União, estados e todos os municípios, buscando sinergia entre autoridades e entidades da sociedade civil na formulação, implementação e avaliação dos planos de segurança. Essa iniciativa corrobora as melhores práticas internacionais, reconhecendo o papel imprescindível que a sociedade civil e as autoridades locais têm no combate à violência.
Opinião da Gazeta: O custo econômico da violência (editorial de 20 de fevereiro de 2018)
O Susp enfrentará prioritariamente a questão da eficiência do aparato estatal, o que pode ter efeitos dissuasórios significativos, mas a violência tem diversas causas: uma cultura cada vez mais permissiva, a desestruturação familiar, a má qualidade da educação e o mau exemplo moral das lideranças políticas, em níveis jamais vistos. Espera-se que cada uma dessas causas seja enfrentada com a determinação necessária que mostre seus resultados no tempo esperado, mas existe um conjunto de medidas que podem ser adotadas desde logo e que não dependem da ação estatal.
Não é razoável, nem eficiente, esperar que o Estado resolva todos os problemas
A experiência de associações de bairro e conselhos comunitários em diversas cidades brasileiras vem mostrando que ações simples podem ter um impacto tremendo nos índices de furtos, roubos e até homicídios em ruas e bairros inteiros. Conhecer a rotina dos vizinhos; observar a movimentação nas vias públicas; criar grupos de mensagens em celulares e avisar os demais quando houver movimentação suspeita; conhecer e discutir com a polícia os problemas locais; organizar as demandas e levá-las até o poder público. Tudo isso opera para evitar casos como os que acabaram por ceifar a vida de Rogério Casagrande e já pode ser pode ser posto em prática sem depender de mudanças legais.
Opinião da Gazeta: A verdadeira guerra no Rio de Janeiro (editorial de 01 de outubro de 2017)
Os governo federal e os estaduais têm suas competências constitucionais e um papel fundamental de coordenação no enfrentamento do crime, principalmente da criminalidade organizada transnacional, mas não é razoável, nem eficiente, esperar que o Estado resolva todos os problemas. A sociedade civil fará bem criando laços comunitários e se fortalecendo para resolver ou amenizar o que estiver ao seu alcance. Esse fortalecimento do tecido social é necessário até mesmo para que as políticas públicas alcancem seu ponto ótimo de resultados. Nunca é demais lembrar, como diz a Constituição, que a segurança é dever do Estado e direito e responsabilidade de todos.
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