Coincidência ou não, o fato é que, às portas do ano (re)eleitoral, o governo se torna mais generoso e disposto a cumprir com presteza alguns de seus claros compromissos. Num só dia, anunciou a liberação de R$ 900 milhões aos estados, a título de compensação pelas perdas impostas pela Lei Kandir, e a decretação de emergência nas rodovias federais, o que lhe permitirá atacar obras de recuperação sem precisar obedecer aos demorados processos de licitação. E mais: informou também que transferirá integralmente para 2006 a verba de R$ 13 bilhões que deixou de investir em 2005.
Nada que não pudesse ter sido feito ao longo do ano ou mesmo desde o início da gestão. Antes tarde do que nunca, porém. Graças a essas providências de última hora e se de fato o governo lhes der efetivo cumprimento , o país experimentará no ano que vem um razoável impulso no seu crescimento. Tenta-se corrigir, desta forma, o emperramento da máquina e os males decorrentes da ansiedade com que o governo se comportou para acumular o colossal superávit primário de 2005.
De um lado, estados e municípios que perderam receita tributária em razão da desoneração do ICMS nas operações de exportação de produtos primários começarão o ano com algum alívio em suas finanças. Com a injeção dos recursos compensatórios previstos pela Lei Kandir, ao Paraná serão destinados R$ 86 milhões (quase 10% do total nacional), dos quais 25% serão distribuídos entre os municípios até o fim de janeiro.
Mas o mais ambicioso projeto do governo ao abrir o cofre é o que prevê a recuperação de 11 mil quilômetros de depauperadas rodovias federais. Será apenas uma operação tapa-buracos, mas o suficiente para devolver condições razoáveis de tráfego em algumas das mais estratégicas estradas brasileiras. Será, sem dúvida, além do benefício natural que trará para toda a economia, uma das mais visíveis bandeiras do marketing político em que o governo deverá se empenhar neste ano. E a vontade é tanta que até se dispõe a recorrer a um truque administrativo desaconselhável: a dispensa de licitação para a realização dos serviços, orçados em R$ 200 milhões, sob a capa legal do "estado de emergência" que pretende decretar nos próximos dias.
O filé maior, no entanto, está na promessa de remeter para 2006 cerca de R$ 13 bilhões que não conseguiu gastar em 2005 em grande parte devido à letargia dos ministérios. Este montante se somará aos quase R$ 20 bilhões previstos para investimentos no Orçamento da União de 2006, ainda em tramitação no Congresso. No total, portanto, seriam aplicados R$ 33 bilhões em infra-estrutura. Se a intenção de fato se transformar em realidade é difícil acreditar! , nunca nos últimos tempos o país viu tanto dinheiro assim sendo aplicado em obras.
Viveria o Brasil, no ano que se aproxima, o tal "espetáculo do crescimento" prometido por Lula há três anos? Até pode ser desde que, ao invés de apenas fazer parte de um esforço de campanha eleitoral, esses recursos sejam correta e responsavelmente utilizados. Caso contrário, a repentina generosidade será vista como simples demagogia.