Em artigo anterior acolhido pela Gazeta do Povo ("A maximização do diferencial"), apontei entre alguns vícios da linguagem corrente o de estrangeirismo, pelo uso de pomposas expressões, geralmente inglesas, como nomes de edifícios de uso residencial e comercial. E há quem pretenda afrancesar nosso tradicional bairro do Bigorrilho, esperando valorizar seus empreendimentos imobiliários. Agora, desejo acrescentar mais alguns defeitos, principalmente no modo de falar, como ocorre com a desnecessária repetição ou reforço de substantivos, assim: "eu tenho um projeto que é um projeto para melhorar o trânsito (...)", "meu automóvel é um automóvel (...)", "minha amiga, ela (...)", "meu vizinho, ele (...)", "minha gatinha, ela (...)". Aliás, faz falta um pronome específico de animais, coisas, etc., como o it do inglês. Outro caso: o advérbio de lugar onde tem substituído indevidamente o de tempo quando, praticamente abandonado, como nestes exemplos: "estive ontem com fulano, onde combinei com ele tal coisa", estamos "às vésperas de eleições, onde (ou aonde!) é preciso escolher melhor os nossos candidatos..." (o que é necessário).

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Hábito que considero bem grosseiro, nas conversas do dia-a-dia e mesmo nas entrevistas pelo rádio ou televisão, é o das pessoas com aparente dificuldade para expor idéias, fatos, opinião, etc., preferindo atribuir à outra o que pretende transmitir a terceiros. Ou seja, ao falar envolve indevidamente o seu interlocutor: "pois se você é político (...)", "é tuberculoso (...)", "se é burro, não pode entender isto ou aquilo", etc. Daí é possível que um distraído médico obstetra tranqüilize o marido de sua cliente que se queixara de enjôos, dizendo: "não se preocupe, no começo da gravidez você sofre um mal-estar passageiro, mas em breve vai se alegrar ao sentir o filho se mexendo em seu útero..." Outra observação: entre alguns jornalistas predomina o verbo acompanhar: geralmente não mais se é convidado para ouvir uma cantora, um concerto, nem para assistir a um debate, ver uma partida de futebol – quem quiser que acompanhe essas apresentações, mesmo que não goste!

Vício também é o da repetição exorbitante de verbos. Parece inevitável pegar algo antes de se dizer ou fazer alguma coisa: então peguei e disse (...) peguei e fui ao cinema (...) peguei e me mandei pra casa (...), peguei e chutei, etc. Já me referi ao difundido estranho uso da palavra perfil, para identificar qualidades ou características das pessoas e até de coisas. Embora a maioria dos perfis humanos possa indicar boa ou má saúde, observadores mais atilados já percebem em alguns indivíduos que o esquerdo foi afetado pelo fracasso ou pela decadência de certas ideologias, apresentando-se bastante descorado e até mais enrugado pelas decepções sofridas por seus portadores. Já o perfil direito de muitos políticos, dizem, está bem mais redondo e reluzente pelas gorduras recentes, provavelmente geradas pelo reforço dos seus sempre altos rendimentos. Ante a insistência dos repórteres têm eles se defendido com clarividência e indisfarçáveis sorrisos: "Eu diria que as informações são exageradas, porquanto há muita inveja e ingratidão, mas nem por isso esmorecemos na ingente luta pelo nosso povo..." Ora, ora, eu também diria que são muito cínicos, mas acho melhor aguardar em silêncio melhores dias...

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Já critiquei outra esquisita duplicação de verbos com o acabar precedendo os demais, como se houvesse pessoas vencidas ante irresistível coação. Assim, eu acabei confessando, você acabou cedendo, ela acabou pecando, nós acabamos gemendo, vós acabastes gritando, só eles acabaram fugindo. Finalmente, reproduzo aqui, quase literalmente, o resumo de uma partida de futebol que ouvi pelo rádio: aos dez minutos do primeiro tempo o time visitante acabou fazendo o primeiro gol, antes dos vinte acabou fazendo o segundo, mas o time local acabou reagindo e acabou fazendo seu gol. Mal começou o segundo tempo o time local acabou empatando, mas o visitante aos 30 minutos acabou fazendo o terceiro gol e assim acabou ganhando a partida. Só não foi informado que o jogo acabou acabando... E quanto a mim, como dizem, de repente acabei terminando este artigo, para o bem dos eventuais e pacientes leitores.

Fernando Andrade de Oliveira é procurador da República aposentado.