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A semana passada tem tudo para figurar entre as mais emblemáticas da política paranaense nas últimas décadas. Servidores públicos invadiram a Assembleia Legislativa e forçaram o governo e os deputados estaduais a desistir temporariamente de aprovar um pacote com medidas de cortes de gastos por meio do "tratoraço". O episódio deixa uma série de lições que podem ser colocadas em prática já nesta semana, pois a polêmica não terminou com o recuo dos parlamentares.

Diante do quadro complicado das finanças do estado, é justo esperar que o gestor público tome medidas corretivas, redirecione recursos, busque melhorar a arrecadação, faça o possível para conter as despesas – o quanto antes. Desde o fim do ano passado o governador Beto Richa vinha implementando medidas visando, em primeiro lugar, a melhorar a receita pela costumeira via do aumento de impostos. E neste ano, no início da nova legislatura, enviou aos deputados um pacote de projetos impactantes, complexos e polêmicos.

Tendo de acertar o quanto antes as contas públicas, Richa julgou necessário recorrer ao controverso "tratoraço", manobra que dispensa a tramitação do projeto pelas comissões temáticas, transformando o plenário em comissão geral e conseguindo rapidamente a aprovação final. Indignados com o conteúdo do pacote, os servidores também se julgaram desrespeitados em suas demandas pela maneira apressada como o governo queria ver aprovadas as medidas. Foi o estopim para a invasão do plenário da Assembleia, na terça-feira.

Tentativas posteriores de colocar o projeto em votação foram frustradas pela mobilização contínua dos servidores. A estratégia havia falhado; governo estadual e a base aliada na Assembleia reconheceram a impossibilidade de insistir na metodologia e retiraram de pauta o complexo conjunto de projetos, no que agiram bem. Agora, governo e professores – uma das categorias afetadas pelas medidas de corte de gastos, e que está em greve há vários dias – anunciaram uma reunião para a próxima quinta-feira, no Palácio Iguaçu. Do lado do Executivo estadual, estarão presentes o chefe da Casa Civil, Eduardo Sciarra, e o secretário da Educação, Fernando Xavier Ferreira.

O diálogo é uma maneira de cumprir um pedido do próprio governador em entrevistas concedidas ainda na quinta-feira: que todos analisassem com calma o conteúdo das medidas. Há aqui sinais de que possa ter havido um duro aprendizado. Eliminar o debate amplo e exaustivo – prática a que se acostumou o Executivo no Brasil em todas as esferas – poderia talvez se justificar em alguma raríssima e contadíssima ocasião. Nunca, porém, sem que houvesse antes um claro compartilhamento das especiais circunstâncias que o justificariam. No caso paranaense, a sociedade desconhecia, da boca do governador, as razões e a extensão da crise financeira que nos atinge e que requeria as medidas em questão – daí a indignação com o "tratoraço", que poderia até ter sido tolerado se tivesse havido uma comunicação prévia eficaz entre governo e cidadãos.

O desafio de repor as finanças do estado em ordem continua sobre os ombros do governador. E a sociedade e o funcionalismo público não podem julgar-se inexpugnáveis e alheios a esse esforço. Várias das medidas podem ser duras, mas talvez não deixem, quando compreendidas, de ser razoáveis, sobretudo quando se trata de suprimir não direitos adquiridos, mas benefícios futuros. O que o momento requer é uma grande abertura de parte a parte. Compreensão mútua – que exige do governo não confundir o interesse dos servidores com as ambições político-partidárias de alguns sindicalistas, e exige dos funcionários públicos boa vontade para compreender as razões do Executivo – são as chaves para se encontrar uma solução para os problemas que o estado enfrenta. Bloqueada a via célere, Richa precisará de coragem e determinação, aliadas a uma grande franqueza e capacidade de diálogo, para conduzir as negociações neste momento delicado pelo qual passa o Paraná. É esse processo que não apenas os servidores públicos, mas toda a sociedade paranaense espera daqui em diante.

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