A exacerbação da crise política aponta para o imponderável, embora evidente o desgaste perante a opinião pública do Partido dos Trabalhadores (PT), posto na berlinda desde a estrepitosa revelação do "mensalão" feita da tribuna da Câmara Federal pelo deputado Roberto Jeferson.
Agora, a inverossímel denúncia de que Cuba (como se Fidel Castro fosse um tolo) teria enviado dólares para a campanha presidencial de Luiz Inácio Lula da Silva fez crepitar ainda mais a fogueira do escândalo das ilegalidades, animando os pregadores do "impeachment".
Encurralado pela suspeita de obter recursos "não contabilizados" oriundos de caixa 2 e do recebimento de contribuição financeira no exterior, o PT partiu para o ataque, remontando à compra de votos de alguns deputados federais (duzentos mil reais cada), para aprovação da emenda constitucional da reeleição de Fernando Henrique Cardoso. O ex-presidente do Bamerindus, ex-senador e ex-ministro José Eduardo Vieira de Andrade em depoimento no Senado confirmou dinheiro de caixa 2 nas jornadas eleitorais de Fernando Henrique Cardoso, 1994 e 1998.
Compeliram o presidente do PSDB, o honrado senador Eduardo Azeredo, MG, à renúncia da direção do partido, após acusação de que seria beneficiário, em 1998, de verbas do publicitário Marcos Valério, também operador do tesoureiro Delúbio Soares do PT.
Rompeu-se, assim, o armistício entre PSDB e PT, que vigorava a partir da posse do presidente Lula, em que a transição ocorreu em alto nível, com o presidente Fernando Henrique Cardoso prodigalizando todas as mesuras ao seu sucessor, havendo registro de lágrimas derramadas pelo ex-líder metalúrgico no abraço de despedida de FHC, no Palácio do Planalto, em Brasília.
O presidente Lula retribuiu não vasculhando possíveis irregularidades na gestão do antecessor, ao mesmo tempo que mantinha as mesmas diretrizes macroeconômicas, confiando a presidência do Banco Central ao recém-eleito deputado federal pelo PSDB de Goiás (que renunciou ao direito de assumir o mandato), o ex-presidente do Banco de Boston Henrique Meirelles, e colocando no Ministério da Fazenda técnicos vinculados ao neoliberalismo de FHC para ajudar o ministro Antônio Palocci.
Por sinal, que a amizade entre Lula e FHC vinha de longe, à época que o então dirigente sindical do ABC apoiou a candidatura ao Senado pelo PMDB de São Paulo, em 1978, do ex-exilado no Chile (aposentado da cátedra universitária pelo arbítrio ditatorial). Segundo mais votado na sublegenda, Fernando Henrique ascendeu ao Senado em virtude da eleição do senador Franco Montoro para governador de São Paulo em 1982.
Ficou famosa a visita por muitas horas no Palácio da Alvorada, residência presidencial, em Brasília, do líder petista ao chefe da Nação, ocorrida em momento de turbulência na economia, com prováveis desdobramentos. A quase totalidade dos colunistas e editorialistas da mídia e os "cientistas políticos" vislumbravam em suas matérias e entrevistas a perspectiva de PT e PSDB consolidarem o bipartidarismo no Brasil, revezando-se no poder, nos moldes dos Partidos Republicano e Democrata nos Estados Unidos.
Uns tantos "cientistas políticos" no auge do entusiasmo preconizavam uma coligação e até fusão do PT e PSDB, que formariam força imbatível para governar por décadas, como aconteceu no México com o Partido Revolucionário Institucional (PRI).
O transbordamento do confronto invalidou todas as profecias e talvez resulte na fragilização dos dois partidos favoritos à sucessão presidencial de 2006. Pesquisas de institutos especializados retratam que a maioria dos consultados considera igual o índice de corrupção nos governos Lula e FHC.
É geral a decepção pelos dois partidos (PT e PSDB) não terem se interessado por uma reforma político-partidária que estabelecesse a fidelidade, o fim da reeleição (aumentando o mandato para 5 anos) e o barateamento das campanhas, eliminando no período eleitoral doações a eleitores e entidades, showmícios e programas do TRE produzidos por marqueteiros, além de cominar penas severas aos infratores.
O Senado fez a lição de casa aprovando em 18 de agosto de 2005 o Projeto de Lei n.º 275/05 que minimiza despesas e penaliza duramente infrações, todavia os deputados federais, com raras exceções, demonstraram atração irresistível pelo caixa 2 e pelos gastos descomunais deixando escoar a data fatal de 30 de setembro de 2005, e não se interessaram até hoje em aprovar emendas constitucionais em tramitação que ampliam para 31 de dezembro/05 ou 31 de março de 2006 o prazo para modificar as regras eleitorais do pleito do ano que vem.
A continuarem os lances de extermínio recíproco entre PT e PSDB, a reação do povo brasileiro poderá ser a de não levar ao 2.º turno tanto a reeleição de Lula como o candidato tucano, seja José Serra, Geraldo Alckmin, Aécio Neves ou Fernando Henrique Cardoso, preterindo-os nas urnas por nomes de outros partidos.
(Contínua)
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