A cassação do mandato parlamentar e dos direitos políticos do ex-ministro José Dirceu, decidida pela Câmara Federal na última quarta-feira, encerrou um dos capítulos mais emocionantes da obra de suspense que começou a ser escrita pelo ex-deputado Roberto Jefferson em maio passado. Está ainda longe, no entanto, o episódio que colocará ponto final ao longo enredo de denúncias de caixa 2, mensalões, intrigas palacianas, cuecas recheadas, empréstimos suspeitos, repúblicas paralelas, desvios de dinheiro público, valérios e delúbios... A crise não terminou com a cassação. Apenas tirou de cena aquele a quem mais notoriamente os opositores e a opinião pública imputaram como principal mentor da balbúrdia instalada.
Na verdade, a maioria de seus pares entendeu que era preciso dar o golpe definitivo em José Dirceu, um dia antes vitimado pelas bengaladas, tão reais quanto simbólicas, desferidas pelo obscuro escritor Yves Hublet nos corredores do Congresso. O gesto da Câmara, todavia, não é suficiente para terminar a tarefa de purgação geral e irrestrita que os cidadãos brasileiros exigem. É preciso ainda que todos os fatos sejam investigados e que restem esclarecidos e identificados com precisão os delitos cometidos. E que a mão pesada da Justiça alcance tantos quantos os cometeram. E mais: que as causas que geraram o quadro sejam vencidas.
A cassação de Dirceu foi, sem dúvida, uma punição de caráter estritamente político, pois que as evidências de sua participação nas práticas espúrias denunciadas não se materializaram de todo em provas suficientes para dar conformidade a um ato jurídico perfeito. Por isso mesmo, para que se preservem em sua inteireza os princípios do estado democrático de direito, dentre os quais o de assegurar ampla defesa aos acusados, cumpre às instituições isto é, o próprio Congresso, o Ministério Público, os organismos policiais e o Judiciário prosseguir na tarefa de não deixar judicialmente (e não apenas politicamente) impunes os culpados.
Estas instituições estão obrigadas a promover o resgate ético das práticas políticas, a moralização do exercício dos mandatos populares. Assim, ainda que todas cumpram diligente e responsavelmente o seu papel, o trabalho só terminará com mudanças ainda mais profundas, de modo a evitar que persistam no futuro as razões que fizeram eclodir a atual crise. Estas razões são encontradas na frouxa legislação político-eleitoral vigente, indutora do uso de recursos ilegais para financiamento das campanhas e de todas as suas conseqüências.
A traumática cassação de José Dirceu não deve ser motivo para aplacar o desejo de se ter uma legislação eleitoral menos complacente. Os 293 deputados que cassaram o colega fizeram-no com o suposto nobre intuito de condenar também o atual sistema político-eleitoral e, estão, portanto, moralmente comprometidos em legar ao país a sua reforma. É o mínimo que agora os brasileiros esperam deles.
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