O peixe de maior tamanho enroscado na Operação Porto Seguro é um "senador" que jamais teve um voto e, no entanto, ocupou por três vezes um assento em nossa Câmara Alta. Este mago da política chama-se Gilberto Miranda: começou como massagista do então presidente-ditador João Figueiredo, foi sócio nos negócios de Orestes Quércia, é amigo de Paulo Maluf, era próximo de Celso Pitta, seu padrinho de casamento é José Sarney e, além disso, esteve envolvido diretamente em escândalos de altíssimo quilate como o Caso Sivam e o Dossiê Cayman.
O "senador" Gilberto Miranda agora mudou de ramo: tornou-se expert em ilhas do tesouro. Tem duas, a poucos quilômetros de distância uma da outra, no litoral de São Paulo. Na Ilha das Cabras, propriedade da União, perto de Ilhabela, construiu um paradisíaco resort privado com heliporto e outras facilidades para entreter amigos e sócios.
Insatisfeito, o novo Robinson Crusoe apossou-se da Ilha dos Bagres, no porto de Santos, onde pretendia construir um complexo portuário para o qual obteve um financiamento de R$ 2 bilhões graças às relações com José Weber Holanda, ex-advogado-geral-adjunto da União, agora indiciado pela Polícia Federal.
O negócio de ilhas do tesouro resolve-se pela via judicial com relativa facilidade. Mas o negócio das suplências, uma das maiores aberrações da Carta Magna de 1988, só se resolve com uma Emenda Constitucional.
Gilberto Miranda Batista Mirandinha para os íntimos , embora paulista, sempre fascinou-se com as riquezas do Amazonas: pagou milhões em 1987 para obter a suplência de Carlos Alberto Di Carli, o que lhe permitiu frequentar o Senado durante seis meses e lustrou a sua folha-corrida com o título de senador. Em 1990, negociou uma suplência com Amazonino Mendes: pagou outros milhões, que lhe garantiram seis anos no Senado da República. Em 1998, pagou outros R$ 5 milhões ao xará Gilberto Mestrinho por uma segunda suplência e, em seguida, uma vilegiatura de outros seis anos no Senado. Uma pechincha.
No período em que representou o estado do Amazonas, o empreendedor Gilberto Miranda desenvolveu outro negócio: a liberação de projetos de financiamento na Zona Franca de Manaus. Bateu um recorde: emplacou 250.
No modelo presidencialista e bicameral dos EUA, inexiste a figura do suplente de senador. É ilegítima. O representante de um estado da federação precisa ser eleito pelo voto direto. O parlamentar que se afasta, morre ou é impedido pelos pares será substituído por outro, eleito nominalmente no pleito seguinte.
O negócio de suplências no Senado é indecente, feudal e antidemocrático. Já produziu situações altamente vexatórias como aquela protagonizada pelo ex-ministro do Trabalho Carlos Lupi, então suplente do senador Saturnino Braga (PDT-RJ), que exigiu o afastamento de um brilhante parlamentar por causa de um execrável "acordo político" que lesou o eleitor, o partido e o próprio sistema eleitoral.
A Operação Porto Seguro foi iniciada pela Polícia Federal, as primeiras punições partiram do Executivo, os indiciados serão levados ao Judiciário. O Legislativo por enquanto ileso poderia participar do saneamento com uma PEC que acabaria com o rendoso negócio das suplências. E das ilhas dos tesouros.
Alberto Dines é jornalista.