Estive, à tarde de anteontem, na Academia Brasileira de Letras (ABL) para me despedir do amigo de muitos anos, o deputado federal pela UDN de Minas Gerais. Oscar Dias Correia. Ali, no entra-e-sai das muitas amizades cultivadas em 84 anos de vida de múltiplos interesses, um pequeno grupo de antigos udenistas desfiou lembranças de um tempo que parece cada vez mais distante, não apenas pela rolagem dos anos, mas pelo choque dos contrastes. O ex-deputado Rondon Pacheco lembrou os destaques da brilhante bancada de Minas, uma das mais qualificadas na crônica parlamentar do período que começa em 1945, com a derrubada do Estado Novo de Getúlio Vargas, padece o infortúnio de quase 21 anos da ditadura militar do rodízio de generais-presidente, rejubila-se na ilusão de esperanças com a redemocratização, em 1985, e agora purga as angústias da frustração nos dois anos e 11 meses do mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Com as achegas do senador Jorge Bornhausen, do ex-deputado Célio Borja, a bancada mineira oposicionista que atendeu à convocação da memória compôs uma equipe com jeito de seleção: Milton Campos, Pedro Aleixo, Afonso Arinos, Bilac Pinto, Alberto Deodato, Magalhães Pinto, Licurgo Leite, Guilherme Machado e, claro, Rondon Pacheco e Oscar Correia. No canto governista, o PSD brilhava com José Maria Alckmin, Gustavo Capanema, Israel Pinheiro, Bias Fortes, Paulo Pinheiro Chagas, Guilhermino de Oliveira, Cristiano Machado, Ovídio de Abreu e por aí vai. Sem falar nas bancadas de pequenos partidos, como do Partido Republicano de Arthur Bernardes e Tristão da Cunha; o PTB de Lúcio Bittencourt e outros menos citados. Para ficar na Câmara dos Deputados, sem falar no Senado e no viveiro da Assembléia Legislativa Estadual. Por uma delicadeza do bom gosto, evitou-se a comparação com a atual fornada de 513 deputados e sua mais recente novidade, o refúgio dos anônimos do baixo clero.
Oscar Dias Correia foi tudo o que quis na longa vida. E o que fez, fez bem feito. A obstinação empurrou o corpo esguio, de nervos de aço e infatigável resistência a abrir os caminhos. Aproveitado em tempo integral, como dele ouvi: "Não sei ficar à-toa por mais de cinco minutos. Em casa ou estou lendo, escrevendo ou cuidando de alguma coisa". O menino interiorano, nascido em Itaúna em 1.º de fevereiro de 1921, abriu sua vereda com o embalo da inteligência de um superdotado e a força de vontade do temperamento de um vencedor. Elege-se, em 1947, deputado à Assembléia Estadual Constituinte em Minas e ao primeiro mandato de deputado federal em 1955, reelegendo-se em 1961 e 1965. Carimba na biografia a marca da coerência que o distinguiria como rara exceção: com a edição do Ato Institucional n.° 2, em 27 de outubro de l965, no governo inaugural da ditadura militar do presidente, general Humberto Castello Branco, que extinguiu os partidos e impôs o bipartidarismo de proveta, recusa-se a ingressar na Arena e abandona a vida pública. Um gesto surpreendente, no apogeu da carreira em ascensão, assinalada pela combativa do orador fluente, na tribuna parlamentar, na linha da oposição sem trégua, como vice-líder e depois líder da UDN e do bloco oposicionista nos governos de Juscelino Kubitschek e João Goulart e o intervalo de meses no governo do embirutado presidente Jânio Quadros.
Foi ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro da Justiça no governo do presidente José Sarney, professor catedrático, por concurso, em várias faculdades, advogado com banca de sucesso, escritor com dezenas de livros publicados, membro da Academia Brasileira de Letras. O jornalista e acadêmico Cícero Sandroni relembra que, em reunião na ABL, Oscar Dias Corrêa fez uma palestra em tom de conversa sobre Dante, um dos temas de sua paixão, e recitou, de memória, trechos inteiros da Divina Comédia em português, francês e italiano, línguas que dominava com a mesma facilidade que o inglês. O deputado de um só partido, conservou espetado na lapela durante anos o escudo da UDN, até que o excessivo zelo da empregada decidiu limpá-lo com um abrasivo que apagou a chama da tocha libertária. A sua UDN é a do escudo intacto que preservou com a paixão de um crente. Nos tempos de escuridão, teimava em receitar: "O Brasil precisa se rearmar do espírito udenista".
O destino costuma arquitetar aparentes coincidências nos seus recados subliminares. No mesmo dia em que o Oscar Dia Correia foi enterrado, a Câmara dos Deputados cassou por 293 votos a 192 101 votos de diferença o mandato do deputado José Dirceu, o ex-todo-poderoso chefe da Casa Civil do presidente Lula, caído em desgraça como um dos responsáveis pela montagem do esquema do mensalão e do caixa 2. A vida é mais sábia do que se pensa: cada sessão legislativa tem a representação que merece: da "banda de música" da UDN ao baixo clero do ex-deputado Severino Cavalcanti.
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