Eu sabia que estava tentando o destino quando disse, há uma semana, que a iminente nomeação de Joe Biden e a pandemia do COVID-19 haviam esfriado a política dos EUA durante o ano eleitoral. Mal sabia eu que dias depois estaríamos fazendo analogias com o ano de 1968. O assassinato de George Floyd por um policial de Minneapolis deixou pessoas de todos os espectros políticos indignadas. Até o presidente Trump, em sua maneira cínica, expressou sua raiva pela injustiça do ocorrido.
Como as autoridades de Minneapolis demoraram a prender o policial que colocou o joelho no pescoço de Floyd até ele morrer, nunca poderemos saber com perfeita certeza moral se os tumultos da noite anterior tiveram um papel importante em sua prisão. Mas duvido que sim.
Devemos considerar os tumultos nos Estados Unidos uma revolução? A ideia defendida por alguns de nossos intelectuais - a de que os distúrbios podem inspirar mudanças sociais positivas - é extraordinariamente fraca. Por quê? Porque os manifestantes não fazem reivindicações políticas coerentes e não justificam e direcionam sua violência de acordo com essas reivindicações. Isso explica por que as únicas realizações políticas que os tumultos geralmente podem reivindicar são pogroms [Nota do Tradutor: pogroms eram os ataques violentos anti-semitas promovidos na Europa]. Os protestos não contribuem muito para reformar, mas podem exilar e expulsar povos inteiros com medo. Os tumultos não são uma ferramenta para combater a opressão, são uma opressão em si mesmas. É por isso que tanto veneno retórico é trocado entre o movimento democrático em Hong Kong, que sustenta que é um movimento pacífico, e o Partido Comunista Chinês, que insiste em reprimir o “motim”.
Fui acusado de um duplo padrão ou falta de caridade. Eu escrevi um livro no ano passado que romanceou a história da Revolta da Páscoa de 1916 na Irlanda, um conflito de uma semana entre nacionalistas irlandeses e o governo do Reino Unido e da Irlanda bem no meio da Primeira Guerra Mundial.
E é verdade que a Revolta da Páscoa se transformou em um evento terrível para Dublin, muito mais terrível do que qualquer coisa que esteja acontecendo nos Estados Unidos hoje. Grande parte do centro da cidade foi incendiada. Isso infligiu mais dificuldades às famílias dos soldados da Primeira Guerra Mundial. Centenas de não-combatentes e muitas crianças morreram na guerra urbana resultante, que ainda contou com um incêndio desastroso. Esses são os custos morais mais graves, e todos os revolucionários devem pesar o mal proveniente de suas ações. Mas, assim como os honcongueses se esforçam para se distinguir como manifestantes, e não promotores da balbúrdia, os líderes da revolução trabalharam duro para se distinguir como revolucionários, e não como uma simples turba.
Primeiro, eles defenderam a justiça de suas ações contra a Inglaterra em termos políticos. Mesmo durante os combates, eles pediram aos dublinenses que deixassem de criar tumultos, pois isso prejudicaria a causa. Eles usavam uniformes para a batalha. Quando se renderam, marcharam para as mãos de seus captores. Os líderes aceitaram suas sentenças de morte como se tivessem ganhado medalhas. Ao fazer isso, eles não apenas impressionaram seus inimigos britânicos, mas conquistaram seus próprios compatriotas.
Vimos manifestantes na América tentando fazer a mesma distinção nas últimas noites. Nas mídias sociais, existem muitos vídeos virais de manifestantes associados ao Black Lives Matter exigindo de outros manifestantes que parem de se envolver em atividades violentas ou criminais. Por quê? Porque eles temem que isso desonre sua causa. A namorada de George Floyd implorou para que a violência parasse, pois acredita que isso iria entristecê-lo.
A falta de governança, como a brutalidade policial e a indiferença à justiça, pode e leva a tumultos e manifestações violentas, porque o colapso da confiança entre a autoridade e os cidadãos cria uma oportunidade para o mal e para pessoas sem escrúpulos. E, em casos extremos, a falta de governança pode levar à revolução, porque cria uma oportunidade para uma criatura muito mais rara, que é politicamente mais experiente e disciplinada.
Mas há um enorme abismo entre manifestantes que exigem que a polícia esteja sujeita ao mesmo estado de direito que o cidadão e os manifestantes que detestam a polícia porque são criminosos que lucram e dominam os fracos apenas quando há ilegalidade.
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