Em 13 de abril de 2012, por meio da Lei n.º 12.612, sancionada pela presidente Dilma Rousseff, Paulo Freire tornou-se Patrono da Educação Brasileira. Muitos aplaudiram a iniciativa pois, assim, seu pensamento poderia estar ainda mais presente no ethos de toda a educação brasileira. Outros se sentiram incomodados, pois não reconhecem a importância da sua obra.
Defendo essa justa homenagem, lembrando um pouco da sua trajetória, começando pela cidade de Angicos (RN), onde, há 50 anos, ele se notabilizou internacionalmente por uma extraordinária experiência de educação de adultos. O projeto político-pedagógico de Paulo Freire foi fundamentalmente um repensar da própria educação, em geral, e da educação pública, em particular, como contribuição para a constituição da democracia e da cidadania. O experimento em Angicos foi apenas o primeiro passo do Programa Nacional de Alfabetização, que visava eliminar o analfabetismo no Brasil, como compromisso ético e político.
Paulo Freire analisou, como poucos, a importância das políticas educacionais libertadoras, criticando a educação bancária, e propôs novos instrumentos técnico-metodológicos, que estabeleceram princípios fundamentais de procedimentos pedagógicos e de pesquisa científica na área de educação. A alfabetização é um passo necessário, porém insuficiente, para a consolidação deste projeto de cidadania democrática libertadora.
Seu pensamento é um marco na luta pela universalização da educação, em todos os graus. Ele imaginou e concebeu um projeto nacional de educação para uma sociedade mais democrática e com justiça social.
A pergunta que podemos fazer hoje é: esse projeto de uma educação para a construção de uma sociedade democrática com justiça social ainda é válido? Caso não seja válido, já não haveria mais por que continuar lendo Paulo Freire. Ou melhor, Paulo Freire seria um autor ultrapassado, porque sua luta pela democracia e pela justiça social já estaria superada. Ele passaria para a história como um grande educador, mas que não teria mais nada a dizer ao nosso tempo e, particularmente, à educação brasileira.
Pelo contrário, creio que sua pedagogia continua válida, não só porque precisamos ainda de mais democracia, mais cidadania e justiça social, mas porque a escola e os sistemas educacionais encontram-se hoje diante de novos e grandes desafios lançados pela chamada "sociedade do conhecimento". Nesse novo contexto, a escola precisa ser um espaço organizador dos múltiplos espaços de formação, precisa tornar-se um "círculo de cultura", como dizia Paulo Freire, muito mais gestora do conhecimento social que lecionadora.
Alguns certamente gostariam de deixá-lo para trás na história das ideias pedagógicas e outros gostariam de esquecê-lo, por causa de suas opções políticas. Ele não queria agradar a todos. Mas havia uma unanimidade em todos os seus leitores e todos os que o conhecerem de perto: o respeito à pessoa. Paulo Freire sempre foi uma pessoa cordial, muito respeitosa. Podia discordar das ideias, mas respeitava a pessoa, mostrando um elevado grau de civilização.
Moacir Gadotti, professor titular da Universidade de São Paulo, é presidente de honra do Instituto Paulo Freire.