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Qualidade da educação e acesso ao ensino superior

O Senado Federal acaba de aprovar projeto de lei sobre as cotas raciais e sociais, reservando 50% das vagas nas universidades públicas federais para quem se enquadrar nesse perfil. Houve reservas por parte de alguns educadores, sobretudo porque alegam que a lei fere a autonomia universitária. No entanto, por mais importante que seja uma universidade pública, ela sobrevive de verbas federais colhidas dos impostos pagos pelos cidadãos. Ela não tem autonomia econômica. Deveria ter autonomia no que tange aos aspectos acadêmicos e de pesquisa, pela especificidade do assunto.

A outra vertente de críticas às cotas sociais e raciais é que a lei retira da classe mais abastada do país 50% das possibilidades de cursar um ensino superior gratuito. Esta classe pode pagar muito bem um ensino básico e médio com mensalidades elevadas, além de complementos educacionais que caracterizam um tempo integral de formação antes dos vestibulares. É um engodo pensar que a gratuidade das universidades públicas favoreça a todos. Na verdade, só favorece aos ricos.

Para encarar esta situação, precisamos pensar que a democracia só se instala verdadeiramente quando todos têm possibilidades de acesso, o que hoje é negado pela baixa qualidade da educação pública. E não se trata de falta de dinheiro: a causa maior é a péssima gestão dos recursos. Então, já que não temos qualidade na escola pública básica e média, o modo de reduzir a pressão social é criar cotas, o que pode significar um grande perigo: a manutenção da baixa qualidade da escola pública, dado que, com a ilusão das cotas, cobre-se o sol com a peneira.

Cotas sociais e cotas raciais, como engajamento na defesa dos menos favorecidos por questões históricas neste país, só terão sentido se forem temporárias e atingirem todos os pobres de todas as raças. Perpetuadas, acabarão por desmantelar de vez o sistema educacional público pela permanência do sucateamento das condições de trabalho, dos salários dos professores e dos meios para melhorar os laboratórios e bibliotecas. Afinal, para que melhorar as escolas se, no futuro próximo, as cotas acalmam as pressões sociais? Precisamos de cotas, mas desde que sejam temporárias e vigorem apenas pelo tempo necessário para que seja reestruturada a escola pública.

O aprendizado depende de um exercício diário que a escola pública não oferece. Os pais dos alunos das escolas particulares proporcionam este aprendizado extra aos filhos, aí está a diferença. E, mesmo o governo federal tendo enviado ao Congresso Nacional o II PNE, com vigência até 2020 e indicando que todas as escolas públicas do país deveriam atingir tempo integral em 50% de suas unidades, os nossos representantes, de forma imediata e colaborando com a desqualificação, já criaram uma emenda reduzindo este número para 25%.

Quem ganha com as cotas ganha de modo aparente; quem perde é a classe mais abastada, que terá de migrar com 50% de seus filhos para a faculdade particular paga. O país perderá porque investe no ensino superior e joga fora este investimento porque não preparou devidamente a metade dos candidatos.

Temporariamente, o dano expressivo não será grande; mas, com a morosidade, será derrubada a meritocracia em todos os níveis do ensino. Assim, conclui-se que terão emprego os que cursarem o ensino público superior sem serem cotistas e os que conseguirem pagar as escolas particulares. E o grande engodo pode terminar quando concluírem que estas manobras podem fazer com que o pobre continue pobre!

Hamilton Werneck, pedagogo, é escritor e palestrante.

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