O presidente do Congresso Nacional, senador Renan Calheiros, chama hoje às falas os presidentes e relatores das três Comissões Parlamentares Mistas de Inquérito (CPMIs) em funcionamento Correios, Mensalão e Bingos. Sensível às fundadas críticas de que esses colegiados embaralharam suas pernas e perderam-se num espantoso torvelinho de vaidades, Calheiros pretende agora fazer com que elas encontrem claramente seus respectivos focos e se conduzam com eficácia e objetividade para investigar os fatos e punir os culpados que, ao longo dos últimos 100 dias, protagonizam a crise política sem precedentes em que o país mergulhou.
Age bem o presidente do Congresso. Tanto quanto fazer com que as comissões cumpram diligente e responsavelmente seu papel, está em jogo também outro valor importante, qual seja a salvação do prestígio e da credibilidade do próprio Congresso, um dos pilares em que se assentam as instituições democráticas do país. Não será mediante a produção de uma imensa pizza, com a qual se lambuzarão impunes os corruptos e corruptores, que o parlamento nacional dará à sociedade o exemplo mínimo de apego à respeitabilidade que se exige da classe política.
Portanto, faz-se necessário com a máxima urgência que os trabalhos se organizem de acordo com as respectivas competências e prerrogativas de cada uma das comissões. Não se pode continuar reproduzindo cenas de competição explícita pelos holofotes como a que se deu na semana passada, quando todas elas, simultaneamente, aprovaram a convocação para depoimentos isolados de um mesmo investigado, no caso o notório doleiro Toninho da Barcelona. Ou que abram continuamente novas frentes de investigação sem que as anteriores tenham sido minimamente esclarecidas a pretexto tão-somente de criar novas dificuldades políticas e administrativas ao governo, como se faz no caso da tentativa de envolver o ministro Antônio Palocci.
Admite-se que grande parte dos assuntos de que tratam as três CPIs se entrelaça, pois que todas investigam basicamente a mesma coisa: as relações promíscuas entre entes privados e públicos na distribuição e disputa de favores e vantagens imorais tendo por método principal o saque de alguns nacos substanciosos do Erário. E também porque os personagens de uma e de outras, não por mera coincidência, estão se revelando como praticamente os mesmos.
Esta interação de fatos e pessoas sob investigação não elide, entretanto, a necessidade de uma clara divisão de responsabilidades e de definição de focos precisos de tal modo que, havendo três comissões trabalhando ao mesmo tempo, possamos ter razões para imaginar que os resultados possam ser alcançados, hipoteticamente, em um terço do tempo. Evidentemente não é isto que estamos presenciando. Ao contrário, vemos que o tempo gasto mais que triplica e os resultados não aparecem, dando razão aos que apostam na impunidade geral.
Enquanto isso, entre mentiras proferidas por depoentes protegidos por habeas-corpus, ataques de exibicionismo de alguns parlamentares e um zigue-zaguear permanente entre irrelevâncias, o país continua imerso na crise, cansado do espetáculo pouco construtivo que presencia cotidianamente. Faz mal à esperança que a sociedade devotava nos trabalhos das CPIs e faz mal às próprias instituições nacionais de modo especial o Executivo e o Legislativo , colocadas sob permanente desconfiança e paralisadas quanto ao cumprimento de seus deveres constitucionais principais.
Desejamos sucesso à iniciativa do presidente Renan Calheiros, que precisa contar com o bom senso e com o espírito público dos dirigentes e membros das CPIs. Que isto não lhe falte. É uma questão de ordem.