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A campanha pela proibição do comércio de armas de fogo transforma em vítima a sociedade brasileira. O bom senso é assassinado diante de argumentações apaixonadas, pareceres equivocados e pensamentos ingênuos. O crime organizado – assim como a violência ou a insegurança – não vão esmorecer diante da limitação.

Frente ao impedimento, o mercado de artefatos de fogo será inteiramente transferido para a clandestinidade, enquanto que as verdadeiras causas da criminalidade sobreviverão, amparadas pelas deficiências do Estado. Lembra-se do que aconteceu nos Estados Unidos, por ocasião da Lei Seca?

A liberdade é um dos direitos mais sagrados e fundamentais do homem, que não pode ser cerceada pelo Estado, em qualquer aspecto. Ao governo, seja qual for, não cabe impor proibições como a restrição ao comércio legal de armas de fogo no país ou o impedimento ao princípio de legítima defesa. Seu papel é o de garantir a segurança, a paz e assim o desenvolvimento e a dignidade humana.

À parte deste aspecto de direito, há implicações éticas e sociais na consulta popular de 23 de outubro, quando milhões de brasileiros terão que resolver pelo governo federal se será proibida ou não a livre comercialização de armas de fogo no Brasil.

O referendo transfere para o cidadão comum importante decisão e reduz complexa problemática social a mera questão comercial. O referendo não chega a ser uma pesquisa popular sobre o desarmamento, mas sim a respeito da proibição ou não do comércio de armas.

A perspectiva de vivermos em uma nação desarmada não será colhida das urnas. A proibição das pessoas adquirirem armas em lojas especializadas não trará o fim do mercado de pistolas, revólveres, espingardas e munição. Pelo contrário, acalentará ainda mais o mercado negro, porque bandido não consulta vendedor e nem compra arma no comércio. Vai gerar apenas uma falsa e artificial sensação de segurança.

O tráfico de armamentos continuará intenso, frio, eficiente, impiedoso e, pior do que isso, apontará seus calibres para o cidadão honesto, que vai procurar na ilegalidade a arma para autodefesa.

Conforme defende o governo, bastaria eliminar todas as armas de fogo para diminuir consideravelmente a violência nos grandes centros urbanos. Além de simplista, essa é uma visão oportunista, já que as agruras da insegurança nacional não são provocadas pela quantidade de armamentos nas mãos dos populares, mas sim do desaparelhamento e do despreparo da polícia, da ineficiência do sistema judicial e da desestruturação e carência de vagas nos presídios.

Há uma falácia equivocada nesta questão. Os artefatos legalizados, comprados livremente nas lojas do país, não são a principal causa da mortalidade por armas no Brasil. É fato que os problemas triviais existem, como discussões de trânsito, conflitos ou acidentes domésticos. Porém, a estatística oficial é de que existam 10 armas contrabandeadas ou ilegais, para cada uma comprada legalmente.

Segundo relatório do Exército Brasileiro e do Ministério Público Militar Federal, 20 milhões de armas entram ilegalmente pelas fronteiras brasileiras, especialmente naquelas com o Paraguai e Uruguai, onde a venda não passa por qualquer fiscalização. Simplesmente acabar com as armas legalizadas é uma fuga para o real problema: a criminalidade incontrolável.

A simplificação da discussão sobre a criminalidade também tem um viés mais político do que lógico. Para conter os gastos e pagar dívidas, o governo federal anuncia corte de 58% dos recursos do Fundo Nacional de Segurança Pública – que agora terá apenas R$ 170 milhões para serem aplicados no combate ao narcotráfico e ao crime organizado.

Em contrapartida, serão gastos pelo menos R$ 300 milhões com uma consulta popular para saber se o povo quer ou não manter o comércio legal de armas no Brasil. Isso tudo em um país em que o porte de armas já é restrito a determinadas categorias pelo Estatuto do Desarmamento.

Cabe neste momento ao Estado cumprir seu papel, seja no combate à criminalidade ou na eficiência da regulamentação, no controle rigoroso da fabricação, do porte e da importação de armas. Cabe ao governo a responsabilidade direta de todo aquele que, mesmo não portando armas, estimule o porte ilegal.

O enfrentamento à criminalidade não pode ser feito com jeitinho e muito menos retirando direitos do cidadão comum. O assunto vai além de um simples "Sim" ou "Não" dado por 122 milhões de brasileiros.

Diante disso, o governo federal deve enfrentar o assunto de frente, e não cometer um crime: o assassinato do bom senso. Por isso, como cidadão e empresário, voto "não" no referendo de 23 de outubro.

Rodrigo da Rocha Loures é empresário e presidente da Federação das Indústrias do Paraná.

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