Reforma difere de revolução; esta derruba toda a construção, arranca até os alicerces e afasta a caliça para apagar o passado; aquela mantém a edificação em pé, conserva colunas e vigas, intervindo pontualmente para mudar aparência e funcionalidade dos cômodos. Che Guevara foi o ícone maior da moda das revoluções, idolatrado como um Cristo dos fracos e oprimidos. Reformas, por mais relevantes que tenham sido, não legaram grandes ídolos retratados em camisetas e painéis mundo afora. Nenhum reformista morreu em combate ou de overdose. A senectude não dá retratos icônicos. Qual o glamour de Fidel, hoje reformista convicto, em agasalho que lembra pijama de vovô?
A mítica revolucionária se apresenta em discursos que revelam a intenção de reinventar a roda, desprezando toda inteligência acumulada na construção política. A arrogância revolucionária faz o militante imaginar que porta a solução final para as injustiças que incomodam a humanidade desde o início dos tempos. Nenhuma das bilhões de pessoas que viveram antes teve a luminosidade que o revolucionário pensa possuir. Ele é messias da boanova. Vanguarda da massa que o conservadorismo apascenta para impedir o progresso. Nesse contexto, a reforma é inimiga da revolução porque ela parte do pressuposto de que as instituições existentes são aproveitáveis e não há necessidade de despejar dejetos das obras.
O introito se destina a dizer que reformar é mais difícil que revolucionar. A reforma é feita com as pessoas vivendo na casa, opinando, resistindo. Por isso, discutir a reforma das instituições políticas do Brasil é angustiante porque parece que as coisas não saem do lugar e as imperfeições e obsolescências institucionais permanecem. A revolução desconsidera as opiniões adversas e massacra a resistência. Demolir é fácil. Em algum momento é imperioso enfrentar as dificuldades e começar os debates para as reformas.
O Poder Judiciário passou por grande reforma em 2004, regrada pela Emenda Constitucional 45. O Legislativo é tema da continuidade da reforma política. As funções típicas de representação do povo, fiscalização e contrabalanço do Executivo e elaboração de leis têm murchado enquanto crescem atribuições anômalas, mais próximas de despachante de interesses locais no governo central (deputados federais) e de assistentes sociais para os deputados estaduais e vereadores. A ascensão do Judiciário a principal contrapeso ao Poder Executivo denota o raquitismo político do Legislativo.
Vereadores e deputados estaduais devem ser remunerados? Trabalhariam com sessões diárias ou poderiam se reunir esporadicamente? Essas indagações revelam que não se trata de suprimir o Legislativo no âmbito municipal e estadual, mas de avaliar novas possibilidades para sua existência e atuação. Poderiam ser centenas de vereadores em cada município se não houvesse remuneração. As reuniões ordinárias semestrais e mui excepcionalmente extraordinárias seriam suficientes para legislar e muito mais eficazes para fiscalizar o prefeito. A mesma constituição para o Legislativo estadual produziria mais efeitos sobre os governadores que o atual aliciamento de deputados para a base governista que faz do Parlamento um apêndice do Executivo.
Insta romper a indignação preguiçosa e partir para a ação operosa.
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