A Câmara dos Deputados iniciou a faxina da imundície petista do caixa 2 e do mensalão como quem varre o lixo do quintal para a sala, cassando o acusador e adiando a punição dos 17 denunciados para depois de exercido o direito de defesa assegurado pelo Supremo Tribunal Federal (STF), graças à liminar do seu presidente, ministro Nelson Jobim.

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Lá é verdade que a cassação do mandato do deputado Roberto Jefferson, pela folgada diferença de 313 votos a favor e 156 contra, deixa claro que eram favas contadas. Com oito anos na geladeira da inelegibilidade, o ator que ocupou o centro do palco sob o foco das tevês, páginas nos jornais e revistas, encerra a carreira com remotas possibilidades de retorno em tempos de volatilidade da fama, que cria e destrói ídolos num piscar de olhos.

Por atalho paralelo, mas levando ao mesmo poço sem fundo, caminha o estadista de João Alfredo (PE), deputado Severino Cavalcanti, presidente da Câmara, guru do baixo clero e invicto campeão das mordomias. Os fios da vida tecem desenhos inesperados: eleito com os 300 votos dos anônimos que ocupam as últimas filas de cadeiras e outros equívocos, em sete meses de desastrada atuação na presidência o deputado Severino se escafede pela porta dos fundos, enquanto o cassado Jefferson curtiu seus agônicos momentos de glória com o discurso de acerto de contas, baixando a lenha no governo, no deputado José Dirceu e com petelecos no presidente Lula, deixou o plenário sob aplausos da minoria dos votantes e das galerias.

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Mas, página virada, adiante. Daqui até o fim do mês, em escassos seis dias úteis da semana da madraçaria parlamentar ou em poucos mais, caso o brio estique o prazo com o mutirão excepcional às segundas e sextas-feiras, o Congresso terá que decidir a sorte da campanha eleitoral do próximo ano, quando serão eleitos o presidente e vice-presidente, governadores, senadores, deputados federais e estaduais.

A reforma política para valer ficou inviável, lançada às traças do arquivo à espera da nova chance, que talvez chegue tarde demais. Alguma coisa precisa ser feita: ao menos a meia-sola que tape os rombos das últimas campanhas, com o show das novelas, montadas pelos marqueteiros e a orgia das despesas bancadas pelo caixa 2 e adubadas pelo mensalão.

Como de hábito, deixamos para o undécimo instante o mais urgente dos desafios para a tentativa de restauração do prestígio, da respeitabilidade, do decoro do Legislativo: a escovadela para remover o pó que cobre as campanhas com o ridículo de candidatos vendidos como produtos de consumo. Coibir gastos suspeitos, impor regras severas ao privilégio milionário do horário de propaganda eleitoral, levantar barreiras para deter o desembaraço das legendas de aluguel e o troca-troca de partidos é o mínimo que está a exigir um esforço concentrado, à margem das intocáveis CPIs, para a aprovação de meia dúzia de medidas indispensáveis.

Convém não perder de vista o principal. O eleitor deve ficar alerta, desde já, para não baixar a indignação, cair no desencanto da desistência e cobrar dos candidatos a todos os mandatos o compromisso de retomar o debate nacional da reforma política. Desta vez, a sério. O Congresso não pode esperar o respeito da sociedade enquanto não se dispuser a renunciar às mordomias, vantagens, aos penduricalhos que multiplicam o subsídio como passes de mágica ou truques de trapaceiros, às alturas de um dos melhores empregos do mundo.

Nada mais justifica que o senador e o deputado não morem em Brasília, em seu local de trabalho, em apartamentos funcionais, como faz todo mundo. As quatro passagens semanais para o fim de semana nas suas bases foram o remendo de emergência para contornar a precipitação com que foi inaugurada a nova capital.

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Verbas dos gabinetes privativos, nichos de nepotismo e outras tramóias engordaram à escabrosa obesidade. Não há limite ao despudor da criatividade. Talvez a obra-prima premie a verba indenizatória, promessa de campanha do deputado João Paulo Cunha (PT-SP) para a presidência da Câmara e aumentada pelo sucessor, Severino Cavalcanti. Precursora do mensalão, disfarce de salário indireto, mimoseia senadores e deputados com o crédito mensal de R$ 15 mil para o ressarcimento das despesas dos fins de semana nas suas bases.

Um trem da alegria com muitos vagões puxados pela locomotiva da Viúva: semana mandriona de dois a três dias úteis, passagens mensais para o fim de semana em campanha eleitoral, verbas de gabinete para a dissipação do empreguismo e as verbas indenizatórias, modelo inspirador do mensalão.

Em algum momento, sob a inspiração do bom-senso ou a imposição da crise institucional, o Congresso terá que cortar na carne as enxúndias das mordomias. Se não quiser morrer da doença para ressuscitar depois de longa provação.

A última durou quase 21 anos e parece esquecida em 20 anos de democracia.