• Carregando...
 |
| Foto:

A misteriosa morte de Alberto Nisman, promotor federal de Justiça, lançou a nação platina mais uma vez na política feita com sangue, fazendo pouco caso da matéria vida, tão fina. Severino sai da morte do sertão acompanhando o Capibaribe até o mar; desesperado com a tragédia sem fim, interrompe os passos do suicídio ao presenciar o rebento do Mestre Carpina. Severino vai da morte à vida, ainda que "severina". A Argentina vai da morte à morte, como sina.

Em 1982, numa padaria em Olinda, Pedro Jorge, procurador da República, foi crivado de balas para aterrorizar as pessoas que investigavam o escândalo da mandioca. Com mensalão, petrolão e quejandos na memória é providencial lembrar que à época o financiamento agrícola foi copiosamente desviado numa agência do Banco do Brasil no interior de Pernambuco. Dinheiro público para produção de mandioca gasto na compra de fazendas, mansões, caminhonetas. Homicídio com sicário profissional, mandante rico. Enredo cru, sem a sofisticação sherlockiana da deleção de Nisman.

Bom dizer que os envolvidos no desvio do dinheiro foram punidos e as terras, apreendidas para indenizar o erário, destinadas à reforma agrária. O crime não trouxe vantagem econômica nem emocional aos autores e mentores. A esperança dança na corda bamba de sombrinha. A esperança é equilibrista, diz João Bosco na voz de Elis.

Dois promotores de Justiça assassinados porque cumpriam o dever que o povo lhes atribuiu. O caso brasileiro tinha alcance regional e ganhou foro nacional quando a investigação começou a patinar no lamaçal do compadrio, da omertà mafiosa que caracteriza a política feita sobre relações pessoais, sem a moldura das instituições que inibem o primitivismo da natureza humana.

Na Argentina, país outrora civilizado, as personalidades estão demolindo as instituições e os pulsões da brutalidade – cujo ápice ocorreu no genocídio da última ditadura militar – vitimaram quem encarnava a normalidade institucional. Nas duas situações, o assassinato dos agentes encarregados de lançar luz sobre a penumbra onde se solapa o bem público em benefício de interesses particulares sinaliza a intenção de manutenção do statu quo iníquo. O passado demorando o futuro.

Evita, Isabelita, Cristina (ita). Do espaço doméstico à transformação do espaço público em doméstico. Três mulheres em posição de destaque político sem que a ginecocracia tenha resultado em progresso. XX ou XY são indiferentes se a cultura política se embaraça nos interesses individuais, paroquiais, corporativos, se ausente a capacidade de cumprir leis que protegem os interesses mais amplos da coletividade.

Para que o amanhã seja agradável à retina, deve haver esclarecimento dos fatos e, se houver responsáveis de qualquer status político, julgamento isento. O engodo e a discurseira ao estilo lulochavista aumentarão os furos no casco, acelerando o naufrágio institucional da nação que já foi o orgulho da latinidade.

Dê sua opinião

O que você achou da coluna de hoje? Deixe seu comentário e participe do debate.

0 COMENTÁRIO(S)
Deixe sua opinião
Use este espaço apenas para a comunicação de erros

Máximo de 700 caracteres [0]