Um caso grave de violação do sigilo da fonte jornalística agrediu a Rede Gazeta, importante grupo de comunicação do Espírito Santo. A empresa foi alvo de uma escuta telefônica durante o inquérito policial que apura a suposta participação do juiz Antônio Leopoldo Teixeira no assassinato do também magistrado Alexandre Martins.

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As gravações atingiram conversas mantidas por jornalistas de todos os veículos de comunicação do grupo: jornal A Gazeta, TV Gazeta, rádios CBN Vitória, Gazeta AM e o site Gazeta OnLine. O pedido de interceptação foi feito ao juiz da 4.ª Vara Criminal de Vila Velha, Sérgio Ricardo de Souza, pela delegada Fabiana Maioral e pelo promotor de justiça Marcelo Zenkner, no dia 23 de março deste ano. O telefone da Rede Gazeta foi incluído em uma relação com vários números de telefones. Segundo o pedido, o número pertencia à firma Telhauto, que seria uma empresa de fachada de Fernandes de Oliveira Reis, o Fernando Cabeção, condenado em novembro deste ano como intermediário do assassinato. Os números selecionados para a escuta teriam também ligações com o sargento da Polícia Militar Heber Valêncio, condenado por participação na trama que culminou com a morte do magistrado.

Ao final da interceptação telefônica, as ligações de jornalistas dos veículos da Rede Gazeta foram gravadas em dois CDs e anexadas ao processo penal que tramita no Tribunal de Justiça. O presidente do Conselho de Administração da Rede Gazeta, Carlos Lindenberg Filho, Cariê, pediu a apuração dos fatos e a condenação dos culpados. "Em 43 anos de trabalho, nunca vi uma coisa igual", declarou Lindenberg. O secretário de Segurança Pública e Defesa Social, Rodney Rocha Miranda, admitiu que houve um erro, mas garantiu que os fatos serão apurados pela secretaria. O desembargador Pedro Valls Feu Rosa declarou, através de nota, que apenas deferiu a prorrogação da interceptação do telefone relacionado e que foi induzido a erro.

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Registradas as desculpas, sinceras ou protocolares, o fato concreto, caro leitor, é gravíssimo. Trata-se, na verdade, de mais um capítulo da crescente violação da Constituição da República. "É assegurado a todos o acesso à informação e resguardado o sigilo da fonte, quando necessário ao exercício profissional", dispõe o artigo 5.°, inciso 14, da Constituição. Trata-se de um dos fundamentos essenciais de uma sociedade democrática: o direito à informação.

O respeito ao sigilo da fonte jornalística, dever ético elementar de qualquer profissional de comunicação, é uma das principais garantias do acesso à informação. Investir contra o sigilo profissional ou tornar relativa a sua proteção é um tiro de morte nas liberdades democráticas.

Fontes não reveladas estão na origem de inúmeras denúncias da imprensa a respeito de crimes praticados por governantes, políticos e servidores do estado. Fatos recentes evidenciam a importância da informação jornalística como instrumento de combate à impunidade e de realização da justiça. A sociedade acompanha, atônita, aos intermináveis capítulos da novela de corrupção e cinismo que tem como protagonistas ex-dirigentes do partido do presidente da República, políticos e homens ligados ao governo. A faxina que se fará, queiram ou não os caciques de turno, está intimamente relacionada com a liberdade de imprensa e o respeito ao sigilo profissional.

O legislador pretendeu, ao instituir o sigilo da fonte na Constituição de 1988, não privar a sociedade de informações. Ao contrário, assegurou a plena liberdade informação, ferramenta essencial para a defesa dos interesses da sociedade. Preocupa, e muito, a grave agressão sofrida pelo grupo A Gazeta. É importante que todos, leitores, jornalistas e formadores de opinião, tomem consciência de que o respeito à Constituição e aos valores democráticos são a garantia maior do precioso dom da liberdade. De fato, a liberdade de expressão, de opinião, de religião, todas essenciais para a plena realização do ser humano, têm sido conquistadas com muita dor e sofrimento ao longo da história humana. Aqui, após décadas de regime autoritário, conhecemos o valor e o preço da liberdade. Por isso não podemos subestimar as tentativas de imposição de modelos ilegais e antidemocráticos.

Carlos Alberto Di Franco é diretor do Master em Jornalismo, professor de Ética da Comunicação e representante da Faculdade de Comunicação da Universidade de Navarra no Brasil, é diretor da Di Franco – Consultoria em Estratégia de Mídia Ltda.

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difranco@ceu.org.br