Com o parecer contrário da Comissão de Meio Ambiente e Proteção aos Animais, a maioria dos deputados estaduais aprovou no início do mês um projeto de lei do governo do Paraná que autoriza a construção de mais 15 pequenas usinas hidrelétricas no estado, incluindo o empreendimento da Cavernoso III Energia SPE Ltda, empresa da família do deputado estadual Plauto Miró (DEM). Defensor do projeto de lei e um dos parlamentares que votaram a favor do texto na sessão remota do último dia 6, Plauto Miró tem um dos seus filhos, Plauto Miró Guimarães Neto, de 24 anos de idade e formado em Economia no ano passado, como um dos representantes legais da empresa. Ana Rita Slaviero Guimarães Carli, irmã do parlamentar, também figura entre os sócios. No cadastro público da Receita Federal, consta que a empresa foi aberta em fevereiro de 2018.
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Procurado nesta terça-feira (19), Plauto Miró disse que não vê conflito de interesses. “Sempre votei favoravelmente a esse tipo de empreendimento, pois, além de gerarem empregos e renda, trazem grande arrecadação para o Estado. Ainda mais em um momento complicado como o que vivemos, temos que incentivar projetos que beneficiem a prosperidade do Estado e do país”, justificou ele. Plauto Miró também disse que não tem “qualquer participação” no empreendimento e reforçou que “não faço parte do quadro societário”. “Meu filho é economista e empresário. Ele participa de outros empreendimentos no Paraná e em Santa Catarina”, disse o parlamentar.
O projeto de lei 179/2020 deu aval à construção de 15 Pequenas Centrais Hidrelétricas (PCHs) e Centrais de Geração Hidrelétrica (CGHs), que serão construídas nos municípios de Clevelândia, Campo Mourão, Bituruna, Corbélia, Braganey, Iguatu, Condói, Cantagalo, Pinhão, Virmond, Lapa, Porto Amazonas, Assis Chateaubriand, Jesuítas, Palmas, General Carneiro, Mangueirinha, Faxinal e Marilândia do Sul.
A PCH que será construída pela empresa ligada a Plauto Miró é a com maior potência (6,50 MW) entre as 15 previstas no projetos de lei. Ela deve ser instalada no município de Virmond, utilizando a água do Rio Cavernoso, na bacia do Iguaçu.
Moralidade e impessoalidade
A questão do conflito de interesses não está regulamentada no regimento interno da Assembleia Legislativa, mas, na interpretação do promotor de Justiça Hugo Evo Magro Corrêa Urbano, ouvido pela Gazeta do Povo nesta quarta-feira (20), isso não quer dizer que a lei federal que trata do tema não possa ser aplicada, por extensão. De acordo com o artigo quinto da Lei Federal 12.813/2013, o conflito de interesses no exercício de cargo ou emprego no Poder Executivo federal significa "praticar ato em benefício de interesse de pessoa jurídica de que participe o agente público, seu cônjuge, companheiro ou parentes, consanguíneos ou afins, em linha reta ou colateral, até o terceiro grau, e que possa ser por ele beneficiada ou influir em seus atos de gestão".
Para Urbano, que atua no Centro de Apoio de Proteção ao Patrimônio Público, do Ministério Público do Paraná, "a partir do momento em que a lei federal tipificou casos em que pode haver situações de conflito de interesses dos servidores ou empregados com suas funções na Administração Pública, e expressamente prescreveu que se tratam de hipóteses de improbidade administrativa, ampliou-se o âmbito de incidência da norma em questão".
Ainda segundo o promotor de Justiça, independentemente de constar nas normas da Assembleia Legislativa, o conflito de interesses tem regramento nas constituições da República (artigo 37) e do próprio Paraná (artigo 27). "Por questão de moralidade e impessoalidade, a pessoa deveria se declarar impedida (de votar), porque foge à representatividade do mandato e passa a ser algo de interesse particular", disse Urbano. "É a mesma coisa que um juiz decidir um caso envolvendo o pai do juiz", exemplificou.
Urbano também comentou sobre a possibilidade de desdobramento do caso concreto, envolvendo o parlamentar do DEM. "Eu tenho obrigação legal de, ao tomar conhecimento de algum ilícito, dar ciência a quem de direito para tomar providências", acrescentou.
O promotor de Justiça conta ainda que articula uma proposta que pretende, nos próximos meses, "instar os prefeitos e câmaras municipais" a regulamentar o princípio do conflito de interesses no âmbito dos municípios. "O Brasil é signatário do tratado de combate à corrupção, então tem obrigação legal de regulamentar isso em todas as esferas", observou.
Debate
Na Assembleia Legislativa, o projeto de lei gerou debate. Para alguns parlamentares, há preocupação com a quantidade de empreendimentos do tipo, e a capacidade das bacias. “As pesquisas mostram que a quantidade de PCHs vai trazer, sim, problemas relacionados à migração de peixes, a sedimentos dos rios, pode ser que tenhamos problemas graves como isso, volume de água. Então, são assuntos que só vamos poder mensurar no futuro, depois de tanta prática e de tanta implantação de PCHs nos rios. Temos experiências em outros países que já comprovam que em relação ao benefício da energia causada, em uma quantidade elevada de PCHs, o prejuízo ambiental é muito maior. Não sou contra a PCH, agora a quantidade, a forma como têm sido liberadas as PCHs, acho que merece uma boa discussão, que possamos ter o cuidado na hora de analisar cada caso”, disse o deputado estadual Evandro Araújo (PSC) durante a votação do projeto de lei.
De acordo com o governo do Paraná, há 98 empreendimentos hidrelétricos em operação no Estado e 128 usinas já previstas, com construção ainda não iniciada ou na fase de estudos. O governador do Paraná, Carlos Massa Ratinho Junior (PSD), que detém uma ampla base aliada na Assembleia Legislativa, tem defendido maior celeridade no licenciamento ambiental de obras do gênero.
Na mesma sessão, Plauto Miró saiu em defesa do projeto de lei. “Quando a Assembleia Legislativa vai votar as autorizações para a construção de geradoras de energia no Estado, vemos essa polêmica acontecer. De um lado, a linha de pensamento dos ambientalistas, que sempre se posicionam contrariamente, sempre no discurso de que o meio ambiente vai sofrer com a construção dessas geradoras de energia. De outro lado, os parlamentares que sabem que é necessária a construção de geradoras de energia. Sabendo que vai gerar empregos no momento da sua construção, sabendo que vai gerar energia para que, no momento que o consumidor, que a indústria venha a utilizar de energia, teremos essa energia para entregar”, disse ele.
Plauto Miró também reforçou que as licenças ambientais, em relação às 15 obras, já tinham sido concedidas pelos órgãos competentes. “Aqueles que dizem que, e ouvi o deputado Goura, com todo o respeito, falando, de que as universidades têm que participar, dar a sua opinião, a sociedade tem que participar, é só participar no momento das audiências públicas que vão poder ali emitir a sua opinião, vão poder questionar e participar de tudo aquilo que acontece nessa área. O meu voto é a favor dos projetos de lei que autorizam a implantação dessas PCHs. Elas já têm a licença prévia, que foi dada já pelo órgão ambiental, e é mais do que certo e correto aprovarmos”, defendeu.
“Com toda licença e respeito ao deputado Plauto, temos relatos de que essas audiências públicas não ocorreram de fato, e sabemos que muitas vezes essas audiências são só para cumprir uma legislação e não para de fato escutar a sociedade. Acho que é um falso dilema que se coloca aqui quando estamos discutindo economia contra meio ambiente, porque não vamos ter economia se não garantirmos a preservação do meio ambiente equilibrado. Então, encaminhamos contrariamente ao projeto de lei, porque a devida participação popular, o devido controle social, não foi privilegiado e contemplado”, disse o deputado estadual Goura (PDT), que é presidente da Comissão de Meio Ambiente e Proteção aos Animais.
O projeto de lei já foi encaminhado para sanção do governador Ratinho Junior.
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