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Parque solar de São Gonçalo, da Enel Green Power
Parque solar São Gonçalo, no Piauí: maior planta da América Latina possui 2,2 milhões de painéis fotovoltaicos e ajuda a projetar o potencial do sol brasileiro.| Foto: Divulgação/Enel Green Power

O sol que atrai turistas para as praias e o interior brasileiro é o mesmo que tem projetado o país para um novo patamar em geração de energia limpa e renovável. Demorou para o país começar a avançar na produção de energia solar, com plantas de geração fotovoltaica focadas na geração centralizada, na comparação com países como Alemanha e Estados Unidos. Essa modalidade vem crescendo na última década, mas foi no ano passado que finalmente mostrou a que veio: o salto na quantidade de energia solar gerada em grandes usinas fotovoltaicas no Brasil entre os anos de 2021 e 2022 foi de nada menos que 64%. E a tendência de aumento exponencial deve se estender pelo menos pelos próximos três anos.

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Os dados são da Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE), que apurou uma produção no último ano de 1,4 GW médios a mais que no ano anterior. Começaram a operar neste período 88 novas fazendas solares, projetando o segmento para ocupar uma fatia de 4% na representatividade da matriz nacional e somando ao parque gerador brasileiro 7,6 GW de capacidade instalada. Quase uma Usina Hidrelétrica de Tucuruí (PA), para se ter uma ideia. E a expectativa é que, em 2023, o incremento seja superior a 4,5 GW nesse segmento.

Dados da Empresa de Pesquisa Energética (EPE) apontam que a representatividade da fonte na matriz brasileira pode saltar dos atuais 4% para até 15% até 2050 em geração centralizada. Mas, atualmente, a porcentagem não fica longe disso se somarmos aí a geração distribuída. Em 2023, a produção de energia solar fotovoltaica, somadas centralizada e descentralizada, já responde por 25 GW, ocupando uma fatia de 11,5% da matriz energética brasileira, segundo dados da Associação Brasileira de Energia Solar Fotovoltaica (Absolar) e da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel).

Importante destacar a diferença entre as duas. Diferentemente da geração distribuída, focada na instalação de painéis solares principalmente em residências, comércios ou pequenos terrenos - e que também cresce a passos largos - a geração de energia solar centralizada acontece em usinas de grande porte, operadas por empresas que espalham ativos pelo país em busca do melhor custo-benefício de produção e transporte da energia a ser vendida. Uma conta que considera irradiação solar e infraestrutura para levar energia para os principais centros consumidores (veja abaixo).

“As primeiras unidades (usinas solares) iniciaram a operação comercial há menos de dez anos, trazendo mais diversificação para nossa matriz energética, mas avançamos muito desde então. Encerramos 2022 com 264 usinas solares em operação comercial, localizadas em todas as cinco regiões do país, com destaque para Minas Gerais, Bahia e Piauí”, detalha Talita Porto, vice-presidente do Conselho de Administração da CCEE. Outros estados do sudeste, como São Paulo, e do centro-oeste, como o Mato Grosso, também estão em voga. O Paraná, assim como os demais estados do sul, ainda segue como foco de geração solar distribuída.

Conforme dados da Absolar, desde 2012, as grandes usinas solares trouxeram ao país cerca de R$ 33,9 bilhões em novos investimentos e mais de 228 mil empregos acumulados, além de proporcionarem uma arrecadação aos cofres públicos que supera R$ 11,8 bilhões. E a estimativa é que o aumento da produção acrescente muito mais a este setor: até 2026, projeta-se que geração solar centralizada no Brasil alcance os 19 GW – que, com eles, trarão somas bilionárias em investimentos por parte dos grandes players do setor.

O que motiva o crescimento

Alguns fatores explicam tamanho incremento nessa fonte. O primeiro é a evolução tecnológica dos equipamentos, que barateou a construção das fazendas solares. “Consequentemente, tornou a energia gerada pela fonte bastante competitiva, o que fica evidente nos últimos leilões organizados pela CCEE e pela Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica, reguladora do setor)”, menciona Talita.

Os dados da Absolar indicam ainda que o custo por megawatt instalado nos leilões realizados entre 2013 e 2022 reduziu de US$ 103 para US$ 32. “O crescimento acelerado da energia solar é tendência mundial, impulsionado principalmente pelos altos preços da energia elétrica, pela redução dos custos da energia solar e pelo aumento do acesso a financiamentos competitivos para compra de novos sistemas”, ressalta Ronaldo Koloszuk, presidente do Conselho de Administração da associação.

Além de valores competitivos, ainda tem o fator velocidade de construção. “Se compararmos o tempo de construção e a complexidade da usina solar versus a hidráulica e eólica, a solar é a que tem a menor complexidade e risco de engenharia na implantação dos parques”, explica o diretor comercial da Comerc Renew, Aderbal Aragão, um dos players com altos investimentos em geração de energia solar centralizada em atuação no Brasil.

Mais um motivo que pesa é a demanda crescente por alternativas para descarbonização da matriz e dos processos produtivos em geral. As políticas de ESG adotadas por boa parte das empresas de capital aberto (da sigla environmental, social and governance, que diz respeito às práticas ambientais, sociais e de governança) são prerrogativa para garantir menor custo de capital e atratividade de investidores. Consumir energia de fontes renováveis é uma das práticas que elas têm adotado dentro das políticas.

Para Bruno Riga, responsável pela Enel Green Power no Brasil, o país possui grande potencial de geração solar ainda a ser explorado e a fonte é uma aliada na caminhada até a completa descarbonização da matriz elétrica. “Acreditamos que o Brasil possui todas as condições de liderar globalmente o processo de descarbonização. O país possui uma das matrizes de geração de energia mais limpas do mundo e há ainda muito potencial para que o país acentue a diversificação da matriz, com base principalmente nas fontes solar e eólica”, menciona.

Além das baixas emissões, a fonte fotovoltaica tem a vantagem de impactar menos na instalação dos parques. “O Brasil tem índices de transformação da irradiação solar em energia muito favoráveis e boa distribuição em localidades onde não precisa fazer desmatamento. A Usina de Castilho (SP), por exemplo, era uma antiga fazenda de gado, uma área degradada onde foi possível fazer a implantação com pouca interferência no meio ambiente”, conta o diretor comercial da Comerc Renew, citando o empreendimento com potência instalada de 267 MWp (megawatt pico, como se descreve a unidade de geração solar) em mais recente operação.

Usina solar Castilho, da Comerc Renew
Usina solar Castilho, em São Paulo, que tem capacidade instalada de 267 MWp e demonstra poder do Sudeste em geração fotovoltaica.| Divulgação/Comerc Renew

Energia para o futuro do mercado

Somado a tudo isso, ainda tem a expectativa de abertura gradual do mercado livre de energia, que até 2024 terá adesão liberada para todos os consumidores da alta tensão e, até 2028, da baixa tensão (onde se encaixam os consumidores residenciais). Tanto a Enel como a Comerc Energia constituem grupos que atuam, também, como comercializadoras neste setor, fazendo a ponte entre geradoras e clientes. E uma das principais apostas na geração renovável por parte desses grupos é a venda de energia certificada também a partir de seus parques para os clientes com quem comercializam.

Como braço de renováveis da multinacional Enel, a Enel Green Power afirma que foi uma das primeiras empresas a apostar no mercado livre como estratégia para desenvolver novos projetos nesse setor. Para a companhia, a expansão do mercado livre e o crescimento da geração solar no Brasil vão se intensificar ainda mais nos próximos anos, como consequência da modernização do setor elétrico. A empresa acredita que a transição energética, ou seja, a ida de uma matriz com mais impacto ambiental para outra mais limpa, é um caminho sem volta e garante que quer seguir desempenhando papel de liderança neste mercado.

Mesmo objetivo tem a Comerc Renew, que acredita que a geração de energia solar centralizada brasileira terá como principal destino o mercado livre. “Temos experimentado isso nos dois ou três últimos anos, com as distribuidoras assumindo cada vez mais o papel de infraestrutura na distribuição de energia. Cada vez menos vão representar a compra de energia pelos brasileiros. O mercado livre responde por cerca de 30% do consumo total do país e a abertura vai aumentar esse percentual de consumo”, estima.

Quem são os players e por onde cresce geração solar

Algumas empresas, predominantemente multinacionais, compõem o rol dos principais investidores em geração de energia solar centralizada no Brasil. Dos 10 maiores parques brasileiros, 8 pertencem a grupos ou investidores vindos de fora.

E eles estão de olho nos locais mais promissores para a modalidade. A Enel Green Power é a maior geradora de energia solar centralizada no Brasil e possui sete fazendas solares espalhadas pelos estados do Piauí, Bahia, Pernambuco e Mato Grosso, somando uma capacidade instalada de 1,2 GW. É dela o maior parque solar da América Latina, o São Gonçalo (PI), que pode gerar até 864 MW com seus 2,2 milhões de painéis solares.

A expectativa da empresa é ampliar esses números. A Enel não informa valores de investimentos ou o quanto deve crescer em energia solar, especificamente, mas adianta que até 2025 pretende aumentar a capacidade de geração limpa no país de 5 GW para cerca de 7,4 GW (soma-se aí a geração eólica, ainda o principal segmento da companhia no Brasil, e hídrica). “A expansão será realizada também por meio de um modelo de stewardship, no qual a empresa investe na expansão da capacidade renovável com parceiros”, afirma Bruno Riga.

Adicionalmente, pontua Riga, é importante aproveitar os benefícios de novas tecnologias capazes de tornar os projetos de geração renovável mais competitivos e eficientes, como as soluções de armazenamento com baterias. “Defendemos a inclusão de soluções de armazenamentos nos próximos leilões de capacidade, porque são viáveis tecnicamente e economicamente e podem auxiliar na operação do sistema, com ganhos de eficiência para toda a cadeia”, lembra.

As baterias, aliás, se tornaram um negócio da Comerc Renew, que agrega uma empresa focada só nisso. “Tem (no Brasil) representatividade menor que em outros países, como nos Estados Unidos, mas o armazenamento terá papel de ajudar muito mais na distribuição, se acoplado”, avalia. Isso porque, ao armazenar energia, é possível garantir disponibilidade não somente no momento de produção, como é o caso da energia solar, mas também estocando o excedente não consumido na hora da geração.

Parque solar Bon Nome, da Comerc Renew
Parque Bon Nome, em Pernambuco: nordeste é uma das regiões com forte presença de usinas solares no país.| Divulgação/Comerc Renew

Com a tecnologia embarcada, somada ao barateamento dos componentes, a energia solar vai longe – em quantidade e território. Quando questionados para que regiões do Brasil olham os investidores, eles são categóricos: para onde houver o melhor custo-benefício. E essa conta inclui dois principais fatores: o potencial de transformação de irradiação solar em energia e os custos de transporte. “Percebemos que em certos meses o Nordeste tem transformação de irradiação em energia melhor, em outros isso acontece em Minas Gerais. Em alguns meses percebemos isso em São Paulo”, comenta Aragão, da Comerc Renew, que possui 515 MW de potência instalada em parques espalhados pelos estados de Minas Gerais, São Paulo e Pernambuco e outros a serem implementados até 2024 também em Minas – o que elevará a capacidade instalada da empresa para 1,8 GW. A empresa se posiciona como uma das poucas eminentemente brasileiras entre as que competem como maiores geradoras no segmento.

Além da irradiação, estados como Minas Gerais e Bahia têm se mostrado competitivos nessa modalidade porque estão próximos dos grandes centros consumidores. “No Nordeste, apesar dos bons índices de irradiação, a gente carrega muito as linhas de transmissão porque precisamos levar essa energia para o Sudeste, e ainda competimos com as eólicas (primordialmente concentradas na região) no transporte”, justifica.

Já o Sul do Brasil se mostra mais vocacionado para a geração distribuída que para a centralizada, uma vez que a possibilidade de escolha para um mercado ainda tão incipiente e que exige mobilidade da energia leva os players a optarem por regiões com áreas mais disponíveis para grandes parques, em combinação com as características de irradiação solar. Tanto que a concessionária de energia paranaense Copel possui apenas um parque solar que produz 3 MWp e outras unidades em implantação que totalizam 5,6 MWp de potência instalada na matriz solar da empresa - todos focados em geração distribuída, em um modelo de negócios em que a companhia implanta e opera as unidades de geração distribuída e o cliente assina um contrato de aluguel da usina.

A geração de energia solar centralizada deve continuar encontrando seu caminho no Sudeste, Centro-oeste e Nordeste. Somente Minas concentra 4 dos 10 maiores parques solares brasileiros. E é nesse contexto que estados como Goiás e Mato Grosso do Sul devem expandir a geração nos próximos anos, embora os estados nordestinos também concentrem grandes projetos.

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