Levantamento do Tribunal de Contas do Estado do Paraná (TCE-PR) mostra que 46 das 399 câmaras municipais do estado desrespeitam uma das resoluções da Corte. Trata-se de um entendimento sobre a proporção entre funcionários efetivos – que entraram no serviço público por concurso – e comissionados – aqueles que têm livre nomeação para o cargo.
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Segundo um prejulgado do órgão de agosto de 2017, o número de comissionados não pode, jamais, superar o de efetivos. Mas não é o que acontece nessas câmaras. O caso de maior discrepância é o do Legislativo de São José dos Pinhais, na região metropolitana da capital, que tem 202 comissionados e apenas 29 efetivos – a diferença chega a quase 600% (veja a lista completa no infográfico).
A desproporção na câmara são-joseense chegou a ser questionada na Justiça em 2015, quando o Ministério Público do Paraná (MP-PR) ingressou com uma ação civil pública contra a Casa legislativa, pedindo a exoneração de comissionados, considerada excessiva. O processo no momento encontra-se na 4ª Turma do Tribunal de Justiça do Paraná (TJ-PR), que, no julgamento do mérito, deverá fixar o total de cargos comissionados da Casa.
O diretor jurídico da Câmara de São José dos Pinhais, Jairo Luiz Chiuratto da Silva, explica que o Legislativo municipal aguarda a decisão da Justiça para apresentar resolução que alterará o quadro de servidores. “Estamos no aguardo para dar cumprimento à sentença.”
Professor do curso de Tecnologia em Gestão Pública da Universidade Federal do Paraná (UFPR), Christian Mendez Alcântara, considera que órgãos da administração pública precisam ter um equilíbrio entre o número de funcionários de carreira e de comissionados porque os profissionais têm perfis para cargos de natureza distinta.
“O ideal é ter funcionários concursados conhecedores das atribuições do legislativo municipal”, diz. “Não pode haver uma troca de todo o corpo técnico a cada quatro anos porque, em algumas áreas, para formar um bom profissional pode levar mais tempo do que isso.”
Por outro lado, ter cargos de confiança pode dar uma “oxigenação” nos entes públicos, considera Alcântara. “É verdade que cargos em comissão às vezes não são bem utilizados, mas não se pode demonizá-los.” Para ele, os vereadores podem dispor de comissionados, mas a máquina das câmaras deve ser majoritariamente formada por concursados. “Quem é de carreira tende a observar mais as regras da casa, do escopo da organização, enquanto o indicado vai ter uma fidelidade maior a quem o indicou, o que pode gerar um viés.”
Veja a lista completa no infográfico:
Capital também está no grupo
Mesmo na capital paranaense, que dispõe da maior estrutura legislativa entre os 399 municípios, a situação não está de acordo com o que prega o TCE. Em Curitiba são 333 funcionários em cargos em comissão, enquanto os concursados somam 167 servidores. A diferença é de quase 100%.
Segundo a assessoria de imprensa da Câmara Municipal de Curitiba, uma comissão de servidores foi criada para analisar a estrutura administrativa e verificar a necessidade de contratações por meio de concurso público. O órgão ressalta que, apesar de estarem em quantidade superior ao que deveriam, os comissionados não pesam mais na folha de pagamento do que os efetivos.
Em balanço das contas do primeiro quadrimestre de 2019, apresentado em maio, a Casa informou que 49% da folha de pagamento do Legislativo de Curitiba foram destinados a efetivos. Comissionados, por sua vez, representaram 42,2% das despesas com pessoal, enquanto 8,7% se referiram aos vencimentos dos próprios vereadores.
Fazenda Rio Grande e Mandirituba
Há outros municípios paranaenses com grande desproporção em seus quadros: a Câmara Municipal de Fazenda Rio Grande, por exemplo, tem apenas 10 servidores efetivos e emprega 66 comissionados. A de Mandirituba, por sua vez, tem 19 comissionados frente a somente três efetivos.
Procurada pela Gazeta do Povo, a Câmara Municipal de Fazenda Rio Grande, por meio de nota, divergiu sobre os números do levantamento do TCE. Segundo o Legislativo do município, há hoje 21 vagas de provimento efetivo, das quais 10 estão ocupadas, e 48 de provimento comissionado. “Quanto ao número de cargos de provimento efetivo [...], estas serão preenchidas por meio de concurso público, após a finalização da obra de ampliação da sede deste Poder Legislativo, a qual já está em andamento”, diz o texto.
O levantamento do TCE foi obtido pelo Livre.jor, especial para a Gazeta do Povo. Segundo o órgão, as informações são declaratórias – ou seja, fornecidas pelas próprias câmaras municipais, em atendimento a obrigação prevista na legislação. Embora a base de dados seja de abril, de acordo com TCE, houve poucas alterações no número de comissionados por Casa legislativa.
A Câmara de Fazenda Rio Grande ressalta ainda que 26 dos 48 comissionados são lotados em gabinetes de parlamentares, “pois a legislação vigente prevê 2 assessores legislativos para cada vereador”. O TCE contabiliza no total de comissionados tanto os cargos administrativos quanto os de assessoria legislativa.
A diretora-geral da Câmara Municipal de Mandirituba, Maria Roseli dos Santos, afirma que, desde que a Casa recebeu uma notificação do TCE, em 2017, está em andamento uma adequação à normativa. Ela cita entre as medidas já tomadas a aprovação, em maio de 2018, da Lei Complementar 34, que dispõe sobre a organização administrativa do legislativo municipal, prevendo novos cargos efetivos. “Estamos dentro do prazo dado pelo tribunal”, diz a diretora.
Ainda segundo Maria Roseli, a Câmara pretende lançar ainda este ano um concurso público para preencher os cargos que ainda são ocupados por comissionados. O último processo seletivo do órgão foi realizado em 2011. Os número de vagas e os cargos previstos para contratação no novo concurso ainda estão em estudo pelo departamento jurídico da Casa.
Segundo o TCE as câmaras que estão desrespeitando a norma são notificadas, mas não há previsão de penalidade imediata. A irregularidade é considerada no julgamento de contas das Casas ao final de cada exercício, etapa em que, dependendo do entendimento do colegiado do tribunal, as câmaras podem receber sanções como multas administrativas.
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