Uma das pioneiras no assunto, a farmacêutica paranaense Prati-Donaduzzi começou, há seis anos, estudos para a criação de medicamentos à base de canabidiol (CBD), substância extraída da planta da maconha. Hoje, a indústria localizada em Toledo – e que nas últimas semanas anunciou investimento de R$ 650 milhões para ampliação de sua fábrica –, é uma das que se colocam à frente de um polêmico, mas potencialmente rico mercado.
De acordo com duas empresas de pesquisas, New Frontier e Green Hub, esse setor tem potencial de movimentar anualmente R$ 4,7 bilhões no Brasil. O que equivaleria a mais de 6% do faturamento da indústria farmacêutica do país. Segundo esses levantamentos, existe um mercado consumidor na casa dos quatro milhões de brasileiros. Um número, no entanto, altamente contestável, já que leva em conta a utilização do princípio ativo no tratamento de doenças como Parkinson – a comprovação científica do benefício do canabidiol neste campo ainda é contestada.
Trazidos para um universo mais sólido, onde as pesquisas são mais factíveis, o CDB tem melhores resultados em tratamento de epiléticos. Ainda assim, é um mercado consumidor grande: cerca de 700 mil pacientes com epilepsia refratária – que não respondem a qualquer outro tipo de tratamento. “O povo acha que é um santo remédio. Que [o CBD] cura desde unha encravada a câncer. Isso não é verdade. Tem gente que fala: funciona para Parkinson, funciona para outras doenças. Não, nós não sabemos. Não existem estudos clínicos comprovando isso. No Brasil, o mercado total é de 700 mil pessoas”, destaca Eder Fernando Maffissoni, diretor-presidente da Prati-Donaduzzi.
As altas cifras que o setor promete é o que explica boa parte da corrida dos laboratórios e da pressão pelas liberações regulatórias para medicamento deste tipo. Em janeiro, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) flexibilizou regras de importação dos substratos utilizados nos medicamentos à base de canabidiol. O órgão regulador, no entanto, manteve proibição do plantio de Cannabis sativa no país e limitou os índices de THC – substância de efeito psicoativo – a 0,2% do medicamento. Cabe destacar que tais normatizações nada têm a ver com o uso recreativo da maconha, mas, sim, com a finalidade medicinal.
O movimento despertou o apetite de empresas brasileiras e estrangeiras. Uma delas é a HempMeds Brasil, subsidiária de uma empresa norte-americana, a Medical Marijuana Inc. que comemorou a mudança nas regras sanitárias. “A autorização para a comercialização em drogarias e a flexibilização dos registros ainda abre as portas para que outros processos possam ser realizados no país, como o envase do produto. Com o dólar no patamar atual, trazer etapas da produção para o Brasil deve derrubar os preços para um quarto do valor atual, tornando o CBD mais acessível para a população mais carente”, destaca Caroline Heinz, vice-presidente da HempMeds.
De acordo com reportagem de O Estado de São Paulo, pelo menos 20 empresas demonstraram à Anvisa interesse neste setor no Brasil, no último ano. Grandes empresas internacionais, como a americana Charlotte’s Web e as canadenses Canopy Growth e Verdemed já anunciaram interesse no mercado nacional.
Canabidiol sintetizado
Um possível trunfo nas mãos da farmacêutica paranaense é a criação em laboratório do canabidiol. Em fase inicial de análise, a Prati-Donaduzzi trabalha em uma versão sintética do CDB. “Nós temos uma indústria farmaquímica e colocamos como desafio desenvolver a molécula canabidiol de forma sintética, sem a necessidade do plantio da maconha. Nosso pessoal conseguiu. Hoje nós temos uma pequena indústria com certificado de operação da Anvisa. Esse produto, inclusive, já foi para a Europa, em uma importante feira, para inclusive [permitir a] comercialização para indústrias farmacêuticas [do mundo todo] que queiram produzir medicamento à base de um produto sintético”, destaca Maffissoni.
De acordo com o diretor da Prati-Donaduzzi, a substância teria custo mais baixo, já que elimina a etapa de “limpeza” do CBD. São cerca de 200 processos para isolar o canabidiol das substâncias psicoativas. “Quais as vantagens? É um produto mais acessível. Mas a questão técnica é a mais interessante. É um produto extremamente padronizado”, destaca o diretor-presidente da fabricante paranaense.
Tal pesquisa chamou a atenção do ministro da Cidadania, Osmar Terra, que convidou a empresa para mostrar seus estudos, em agosto do ano passado. Contrário ao plantio de cannabis em solo brasileiro, Terra se mostrou – aponta Maffissoni – interessado na versão laboratorial. O canabidiol sintético, no entanto, ainda precisa da validação clínica. A empresa paranaense prevê, pelo menos, mais quatro anos de desenvolvimento.
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