Cidadão honorário de Curitiba, graças a uma lei municipal assinada pelo então prefeito Cássio Taniguchi em 2002, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Gilmar Mendes agora pode se tornar “persona non grata” na capital paranaense. Dois requerimentos de repúdio contra falas do magistrado foram protocolados na Câmara Municipal de Curitiba nesta terça-feira (9), e devem ir ao plenário da casa na próxima sessão do Legislativo municipal, marcada para a próxima quarta-feira (10).
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O protesto por parte de vereadores de Curitiba se deu pelas falas de Gilmar Mendes no programa de entrevistas Roda Viva, da TV Cultura, na última segunda-feira (8). No programa, Mendes afirmou que a atuação de procuradores e de juízes da Operação Lava Jato em Curitiba foi responsável pela eleição de Jair Bolsonaro (PL) à presidência da República em 2018, e que a capital que foi base das investigações “tem o gérmen do fascismo”.
“Curitiba gerou Bolsonaro, Curitiba tem o gérmen do fascismo. Inclusive todas as práticas que desenvolvem, investigações a sorrelfa [dissimulação silenciosa para iludir], investigações atípicas, não precisa dizer mais nada”, afirmou o magistrado.
O governador do Paraná, Carlos Massa Ratinho Junior (PSD), afirmou que "o ministro Gilmar Mendes certamente vai esclarecer uma fala infeliz, que ataca gratuitamente Curitiba e os paranaenses”. O deputado federal Deltan Dallagnol (Podemos-PR), ex-procurador da Lava Jato, e o senador Sergio Moro (União Brasil-PR), ex-juiz dos processos da operação, também criticaram Gilmar Mendes. Vereadores de Curitiba também repudiaram as declarações do ministro.
Repúdio e desagravo
O primeiro pedido, apresentado pelo vereador Rodrigo Reis (União), requer o reconhecimento de Gilmar Mendes como “persona non grata” por ele ter, segundo o vereador, “proferido palavras de baixo calão, racistas e preconceituosas em relação ao povo de Curitiba”. Na justificativa do pedido, Reis afirma que o “povo honesto e trabalhador” da capital “não merece ser desrespeitado por um Magistrado de uma corte superior que já foi colocado em suspeição por diversas investigações”.
O segundo requerimento, assinado por 19 dos 38 vereadores da casa, requer que o Legislativo municipal aprove uma “Moção de Desagravo à Cidade de Curitiba” contra o que os legisladores chamaram de “grave desrespeito” à capital do Paraná. “[O ministro Gilmar Mendes] desrespeitou sua gente, curitibanos de nascimento ou por opção, que respeitam os valores constitucionais, os direitos fundamentais, as liberdades democráticas e repudiam toda e qualquer forma de totalitarismo e opressão. Curitiba não tem o germe do fascismo! Curitiba tem o gérmen da democracia, das liberdades, da cidadania, do pluralismo político”, reforça o pedido.
Ministro explicou fala polêmica
Em seu perfil no Twitter, Gilmar Mendes explicou que jamais quis ofender o povo curitibano em suas declarações contra a Operação Lava Jato. Segundo o ministro, a crítica foi direcionada aos membros da força-tarefa da Lava Jato e à chamada “República de Curitiba”.
“Ontem, em entrevista ao Roda Viva, usei uma metonímia que merece explicitação. Jamais quis ofender o povo curitibano. Não foi Curitiba o gérmen do facismo; foi a assim chamada “República de Curitiba” (Operação Lava-Jato e os juízes responsáveis por ela na capital paranaense)”, disse.
Críticas durante a sessão e nas redes sociais
Durante o pequeno expediente, no início da sessão desta terça-feira, a vereadora Indiara Barbosa (Novo), chamou de “completamente absurdo” o comentário do ministro durante o programa de TV. “Acredito que o ministro tem que fazer uma retratação. Nós, como vereadores de Curitiba, não podemos permitir este tipo de comentário”, complementou a vereadora, que na sequência elogiou o trabalho realizado pela Operação Lava Jato.
“Nós curitibanos temos muito orgulho de Curitiba que foi a cidade onde começou a Lava Jato e fez um trabalho primoroso no combate à corrupção e prendeu e condenou muitos corruptos no nosso país. A operação foi desmontada pelo STF, ou seja, o próprio ministro (Gilmar) foi responsável pelo fim da operação que foi muito importante para o Brasil”, seguiu.
Em seu perfil no Twitter, o vereador Pier Petruzziello (PP) também repudiou a fala do ministro. “Como Curitibano de nascimento repudio veementemente a fala do Ministro Gilmar Mendes. Em defesa da nossa cidade, da nossa gente, nosso DNA é outro, é de acolhimento, solidariedade e muito trabalho”, disse o vereador.
Também do PP, o vereador Éder Borges proferiu um rápido discurso contra o magistrado do STF. “Repudio as frases infelizes do ministro Gilmar Mendes. Viva a República de Curitiba, aqui se cumpre a lei”, enfatizou.
Cidadania honorária foi concedida em 2002
A honraria concedida a Gilmar Mendes foi proposta em 2002 pelo então vereador Ney Leprevost Neto, na época filiado ao PP. Na justificativa do pedido, o vereador ressaltou os “brilhantes conhecimentos” de Mendes, “jurista dos mais renomados” e “autor de inúmeros livros e publicações”.
À época do pedido, o magistrado era titular da Advocacia-Geral da União, e sua indicação e aprovação para a Suprema Corte foi citada por Leprevost no pedido. “Graças à sua competência e sabedoria foi indicado para o cargo de Ministro do Supremo Tribunal Federal, sendo que foi aprovado com louvor na sabatina realizada pela Comissão de Constituição e Justiça do Senado Federal”, disse o autor do pedido.
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