Dois sindicatos industriais do Paraná – o Sindilouça e o Sinpacel – começaram um movimento para questionar, inclusive judicialmente, um termo aditivo do contrato de concessão firmado entre o governo do Paraná e a Companhia Paranaense de Gás (Compagas).
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Um medida cautelar antecedente de ação civil pública, por infrações concorrenciais, ajuizada na 3ª Vara da Fazenda Pública de Curitiba, questiona o termo aditivo firmado em 2001. Em nota conjunta, o governo do Paraná e a Compagas entendem que a contestação já está superada: “a ação ajuizada pelos dois sindicatos foi extinta por determinação do Judiciário sem análise do mérito, face a ilegitimidade dos sindicatos para postular direitos de partes que eles não representam, quais sejam, a sociedade paranaense e consumidores”.
Já os sindicatos pretendem continuar a queda de braço: recorreram da decisão e esperam revertê-la no Tribunal de Justiça ou perante o Superior Tribunal de Justiça (STJ) e o Supremo Tribunal Federal (STF).
O que está sendo questionado
No entendimento dos representantes das indústrias, o termo teve como objetivo “aumentar o lucro da empresa, quando trocou o prazo de depreciação dos ativos em rede da concessão de 10 para 30 anos, majorando em 150% a base de remuneração da concessionária, elevando substancialmente as tarifas exigidas pelo monopólio distribuidor e, arbitrariamente, seus lucros”.
Para os sindicatos, esse é um dos motivos de o gás natural canalizado custar tão mais caro no Paraná em comparação a outros estados. Essa crítica é contestada pelo órgão oficial. Segundo a Compagas, isso não ocorreu. "A remuneração da Compagas é definida de acordo com a metodologia de cálculo de margem bruta de distribuição”, informa a companhia.
Na ação, as entidades sindicais alegam que “a situação prejudica a competitividade da indústria paranaense e inviabiliza a prorrogação da concessão do serviço de distribuição de gás canalizado, pelo menos antes que essas infrações deixem de produzir efeitos e os já produzidos tenham suas respectivas compensações estipuladas”. A prorrogação do contrato por mais 30 anos está em discussão no governo.
“De todas as companhias de distribuição de gás do país, a do Paraná foi a única que fez essa alteração no contrato e nós estamos pagando pelo menos R$ 0,26 a mais pelo metro cúbico por conta disso”, informa Fábio Germano, presidente do Sindilouça, que representa as indústrias de louças, porcelanas, vidros e revestimentos cerâmicos, setores que são grandes consumidores do gás natural. Segundo ele, “o Paraná tem o gás mais caro do Brasil e isso é terrível para a indústria do Estado”.
Os sindicatos argumentam que “a Compagas tem a menor rede e a maior base de ativos dentre as distribuidoras da região Sul. Enquanto a Sulgás (RS) e a SCGÁS (SC) expandiram a extensão de suas redes nos patamares de 9,35% e 3,9% por ano, e as respectivas bases de remuneração cresceram 9,41% e 3,55% ao ano, a Compagas teve, em média, uma expansão quilométrica de rede de 4,13% ao ano, enquanto a base de remuneração pretendida pela Companhia cresceu 10,69% ao ano”.
Ou seja, “apesar de ter a menor rede em quilômetros, o valor da base de ativos da Compagas é aproximadamente duas vezes e meia maior que os valores das bases de ativo da Sulgás e da SCGÁS em 2021”.
Cartas ao governador e aos deputados
Além da ação judicial, o Sinpacel e o Sindilouça noticiaram o Ministério Público do Paraná (MPPR), que abriu procedimento preparatório de inquérito civil público. As duas entidades também encaminharam cartas ao governador Carlos Massa Ratinho Junior e a todos os deputados estaduais alertando sobre o problema e pedindo providências.
As entidades encaminharam ainda à Agência Reguladora do Paraná (Agepar) considerações a respeito da viabilidade da redução das margens atualmente defendidas pelo monopólio distribuidor.
O documento informa que “enquanto a distribuidora defende ter direito a uma margem média bruta próxima a R$ 1,20 por metro cúbico, os Sindicatos estão confiantes de que a Agepar concluirá que a margem média praticada no exercício de 2022, que deve estar situada entre R$ 0,77 e R$ 0,90, não deveria superar o patamar de R$ 0,55 a R$ 0,65 centavos, caso fosse calculada corretamente, com absoluto respeito ao contrato celebrado, sem prejuízo da redução adicional necessária para se assegurar a restituição do Pis Cofins até o advento do termo contratual.” Questionada sobre o assunto, a Agepar informou que ao órgão “não compete comentar a ação, que está em fase inicial”.
Sobre o Pis Cofins, os clientes da Compagas têm direito a receber de volta R$ 143,6 milhões, valor corresponde ao total desses impostos embutidos na tarifa no período de 2008 a 2019. Em março último, a Agepar abriu consulta para colher subsídios e sugestões sobre a melhor forma de devolução do dinheiro. A questão ainda não está definida.
Órgãos pedem que renovação com a Compagas não ocorra até solução do impasse
“Por todas essas razões, pedimos ao governador Ratinho e à Agepar a não prorrogação do contrato de concessão até que esses aspectos sejam devidamente analisados e adotados os encaminhamentos necessários, inclusive o ajuizamento de demanda judicial pelo Estado em face do monopólio distribuidor”, defende Frederico da Silveira Barbosa, advogado da Barbosa e Gaertner Advogados Associados, que representa os sindicatos na ação.
O advogado esclarece que "ainda que a infração concorrencial tenha ocorrido em 2001, o prazo de prescrição só se iniciará quando forem cessados os seus efeitos, que continuam sendo produzidos até hoje".
Segundo ele, a carta ao governador foi enviada em 27 de outubro. Na mesma data, os sindicatos pediram à Agepar “o repasse para as tarifas da redução do preço do gás anunciado pela Petrobras, a análise da troca da taxa de depreciação e demais equívocos defendidos pela concessionária na sua margem bruta e a determinação de restituição imediata aos usuários dos valores restituídos pela concessionária junto à Receita Federal pela exclusão do ICMS da base do Pis/Cofins”.
Tema está em pauta no governo
A discussão sobre o gás natural canalizado no Paraná é bastante polêmica e está em pauta no governo desde o início da gestão de Ratinho Junior. A motivação do questionamento das indústrias, que usam o produto como fonte energética, é o fato de o insumo custar bem mais caro no Paraná em comparação a outros estados, tendo como motivo principal a margem bruta de distribuição cobrada pela Compagas, empresa que tem como sócia majoritária a Copel, e detém o monopólio da distribuição.
No processo e nas comunicações sobre o tema, os sindicatos anexam tabelas e gráficos que mostram a diferença entre os valores praticados pelas distribuidoras (divulgadas em seus respectivos sites). De acordo com essas informações, a margem de distribuição do gás natural cobrada pela Compagas em setembro de 2022 foi de R$ 0,95 por metro cúbico para um consumo de 10 mil metros cúbicos por dia. No estado vizinho de Santa Catarina, a margem para o mesmo volume era de R$ 0,55, no Rio Grande do Sul, R$ 0,49 e na média nacional, R$ 0,67.
O contrato entre o governo do Paraná e a Compagas é antigo. Foi firmado em 1994 com vigência por 30 anos, ou seja, encerra em 2024. Neste momento, o governo do Estado discute a prorrogação por mais 30 anos. Há, inclusive, a intenção do governo em antecipar a renovação, antes da privatização da Compagas, que deve ser encaminhada em breve, com a venda de 51% das ações que pertencem à estatal Copel. Os 49% restantes pertencem à Commit (nova denominação da Gaspetro, controlada pela Compass) e à japonesa Mitsui, cada uma com 24,5% das ações. Nesse caso, a antecipação da renovação do contrato seria uma forma de valorizar a companhia, antes da venda das ações da Copel.
Em fevereiro último, em audiência pública o governo do Estado apresentou a minuta do novo contrato a ser assinado com a Compagas e informou que, na renovação, a margem de distribuição poderá ser reduzida em 37%. Na ocasião, também, o governo anunciou que a taxa interna de retorno (a taxa que remunera os investidores) sai dos atuais 20% e passa para o percentual médio de mercado, que varia entre 7% e 9%.
A minuta foi elaborada com base em estudos feitos pela Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe). A fundação foi contratada pelo governo do Paraná para prestar consultoria no âmbito do Plano Estadual do Gás. O plano está em formatação e inclui o novo contrato de concessão com a distribuidora.
Na audiência pública, os representantes das indústrias consumidoras fizeram considerações à minuta, pedindo alterações de algumas cláusulas e, principalmente pedindo a definição do valor da nova tarifa e quando ele entraria em vigor. Outro ponto polêmico levantado é a outorga. O governo do Estado pretende cobrar outorga de R$ 508 milhões da Compagas para que ela siga com o monopólio da distribuição. Mas esse valor seria repassado à tarifa, o que poderia encarecer ainda mais o custo do gás. O documento votou para a Fipe para análise e ajustes. As bases do novo contrato ainda não foram divulgadas pelo governo.
O que diz o governo e a Compagas
Em nota conjunta, o governo do Paraná e a Compagas informaram que “a ação ajuizada pelos dois sindicatos foi extinta por determinação do Judiciário sem análise do mérito, face a ilegitimidade dos sindicatos para postular direitos de partes que eles não representam, quais sejam, a sociedade paranaense e consumidores”.
Os sindicatos respondem que "já recorreram da decisão e esperam revertê-la no Tribunal de Justiça ou perante o Superior Tribunal de Justiça (STJ) e o Supremo Tribunal Federal (STF)". Sinpacel e Sindilouça argumentam que "o fato de suas associadas, indústrias de papel e celulose e louças e cerâmicas não serem as únicas vítimas das infrações do monopólio - indústrias do Paraná de diversos segmentos, que usam o gás como insumo em seu processo de produção, e demais usuários dos serviços do monopólio, inclusive residenciais, também são prejudicados - não lhes retira a legitimidade para pedir que os efeitos da infração sejam cessados".
Além disso, os sindicatos argumentam que "o preço do gás natural impacta em toda a economia do Estado, motivo pelo qual acreditam que o governador, tão logo tome efetiva ciência dos fatos, ficará ao lado dos usuários e da sociedade, evitando a necessidade da ação e de uma longa disputa judicial nos tribunais".
“Não somos contrários nem à renovação do contrato com a Compagas e nem à privatização da companhia. Queremos competitividade. Essa situação de termos o gás mais alto do país está afugentando investimentos. A Incepa, uma das maiores indústrias do setor decidiu instalar a nova planta em São Paulo por conta do custo alto aqui”, informa Fábio Germano, do Sindilouça. Segundo ele, “o futuro está muito obscuro e o governo não quer conversar com o setor produtivo”.
Germano lembra que o governador Ratinho Junior reiteradamente falou que o gás natural mereceria atenção especial em seu governo como um indutor do desenvolvimento industrial do Estado. “Não é o que estamos vendo. O preço tão alto está levando indústrias para outros estados”.
“Além disso, algumas empresas que permanecem no Estado, estão buscando alternativas ao gás natural”, informa Rui Brandt, presidente do Sinpacel. Segundo ele, essa busca de outras fontes energéticas está acontecendo no setor que ele representa. “Viabilizadas essas novas fontes, como o GLP e o biogás, por exemplo, a Compagas pode se inviabilizar como concessionária”, diz.
Sobre o fato de a tarifa ser mais cara no Paraná, a Compagas informa que “não há como comparar contratos de diferentes bases e tabelas tarifárias, que abrangem segmentos e faixas de consumo distintos”.
Para melhor clareza do leitor, o texto sofreu alterações na ordem das informações dispostas ao longo do texto, após contato da assessoria de imprensa do governo do Estado.
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