O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) deu início, nesta terça-feira (20), ao julgamento de um suposto desvio de conduta cometido pela juíza Gabriela Hardt, que atuou na 13ª Vara Federal de Curitiba, responsável pelos processos da Operação Lava Jato. Porém, um pedido de vistas processuais por parte do conselheiro Guilherme Caputo Bastos adiou a tramitação da ação.
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Em seu voto, o ministro Luis Felipe Salomão, corregedor-nacional do CNJ e responsável por uma correição extraordinária na 13ª Vara da Justiça Federal em Curitiba, alegou ter encontrado “fatos graves” na atuação de Hardt durante a homologação de um acordo da Justiça com a Petrobras, no âmbito das investigações da Operação Lava Jato.
Com um tom próximo ao adotado no relatório parcial da correição, Salomão – que é relator da reclamação disciplinar aberta contra Hardt no CNJ – apontou que houve uma “gestão caótica de recursos” na vara responsável pela Lava Jato em Curitiba. O ministro citou o julgamento de uma Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) no Supremo Tribunal Federal (STF) que identificou uma “tentativa de um possível desvio” de 700 milhões de dólares oriundos de um acordo entre a estatal e governo dos EUA que retornaria ao Brasil para a criação de um fundo de combate à corrupção.
Para Salomão, a ADPF constatou irregularidades na homologação do acordo. Além disso, os fatos identificados pela correição devem ser levados em conta no julgamento do processo disciplinar aberto contra a ex-juíza da Lava Jato.
“É assim que a ADPF se manifesta, a homologação do acordo é ilegal. Quando o julgamento se iniciou, meus antecessores não tinham conhecimento destes fatos da correição realizada na 13ª Vara. E eu não fiz a correição porque eu quis, é porque tinha 30 representações aqui [no CNJ]. Eu apenas dei curso ao que se pediu nos processos”, disse Salomão.
Presidente do CNJ abriu divergência no julgamento por falta de fatos novos
O presidente do STF e do CNJ, ministro Luiz Roberto Barroso, abriu divergência ao declarar voto contrário ao do relator e defender o arquivamento da reclamação disciplinar. Para ele, enquanto o relatório final da correição não for divulgado, não há fatos novos que devam ser levados em conta no processo administrativo aberto contra Gabriela Hardt.
Segundo Barroso, o contexto da Lava Jato à época precisa ser considerado no julgamento da juíza que, para ele, era substituta e não cometeu irregularidades ao homologar um acordo proposto pelo Ministério Público Federal.
“Naquele momento a Lava Jato desfrutava de uma credibilidade global, o mundo reverenciava a Lava Jato. Os ventos mudaram, com maior ou menor razão, e julgar isso fora do contexto me parece que é uma atitude que eu não considero correta”, justificou.
Se correição encontrar irregularidades, Barroso garante que reclamação contra Hardt vai voltar à pauta do CNJ
Barroso criticou a tentativa de Salomão de pedir a anulação de um julgamento que já está em andamento “por algo que ninguém conhece” e garantiu que caso o relatório final da correição encontre “fatos novos que maculem esse ato de homologação”, o CNJ poderá reabrir a reclamação.
“A represália deste conselho a uma decisão jurisdicional porque os ventos mudaram é um fator que vai contaminar negativamente toda a magistratura, porque o juiz vai ficar com medo de se mudar o governo ele pode ser responsabilizado pela convicção que tinha naquele momento. A gente não pode julgar os fatos fora do contexto. Manter aberto um processo à espera de se encontrar algo que possa macular a vida dessa moça não me parece uma decisão apropriada”, afirmou.
O próximo a votar no caso, o conselheiro Guilherme Caputo Bastos pediu vistas. Segundo ele, diante das argumentações de Salomão e Barroso “seria uma irresponsabilidade” se pronunciar sobre o caso, uma vez que o CNJ tem uma nova pauta marcada para o dia 5 de março. “eu prometo trazer esse processo no dia 5 e Vossa Excelência já pode pautar para que possamos examinar logo no primeiro momento”, disse para o presidente do CNJ.
Reclamação disciplinar foi aberta em 2023 por "violação do princípio da impessoalidade"
Em julho de 2023, a Corregedoria Nacional de Justiça (CNJ) instaurou uma "reclamação disciplinar" , pedido ajuizado pelo empresário e ex-deputado estadual Tony Garcia, por suposta atuação de parcialidade na condução de ações e “violação do princípio da impessoalidade” nos processos da Operação Lava-Jato.
Garcia acusa Gabriela Hardt de ter conhecimento de “fatos potencialmente criminosos praticados pelo então juiz Sérgio Fernando Moro e por procuradores da República, mas manteve-se inerte”. O empresário diz que após ter sido preso em 2004 sob a suspeita de gestão fraudulenta em uma empresa de consórcios foi obrigado a agir como “agente infiltrado” de Moro. Entre as tarefas supostamente atribuídas a ele, Garcia afirma que foi coagido a atuar, a mando do senador, em uma série de atividades ilegais, como a instalação de escutas clandestinas em celas de presos na Lava Jato.
Porém, tais irregularidades teriam ocorrido, segundo o empresário, entre os anos de 2005 e 2006. O empresário alega que levou o caso ao conhecimento da juíza federal Gabriela Hardt, na 13ª Vara da Justiça Federal de Curitiba, em 2021. Garcia estaria tentando reverter a rescisão do acordo de delação feito com a Justiça – o acordo acabou sendo rescindido depois, a pedido do Ministério público Federal. Mas as primeiras providências sobre as denúncias só foram tomadas em abril de 2023, quando o juiz Eduardo Appio, na época titular da 13ª Vara de Justiça Federal de Curitiba, encaminhou a denúncia ao STF.
No início da instauração da "reclamação disciplinar", o corregedor nacional de Justiça, ministro Luis Felipe Salomão, afirmou que a apuração se justifica “tendo em vista a linha tênue que separa os atos simplesmente jurisdicionais dos que detêm relevância correcional, bem como a cautela peculiar afeta à atuação da Corregedoria Nacional de Justiça”.
Hardt foi responsável pela condenação de Lula no caso da reforma do sítio em Atibaia (SP)
Gabriela Hardt ocupava o cargo de juíza substituta da 13ª Vara Federal de Curitiba desde 2014, época em que Sergio Moro era o juiz titular e passou a conduzir os processos da Lava-Jato. Nas ausências de Moro, Gabriela assumia as ações.
A juíza foi responsável pela segunda condenação de Lula nos processos resultantes da operação, com o caso da reforma de um sítio em Atibaia (SP). Antes disso, Lula havia sido julgado culpado por Moro no caso do tríplex do Guarujá (SP).
Após Moro se licenciar, no final de 2018, para assumir o Ministério da Justiça e da Segurança Pública no governo Jair Bolsonaro (PL), ela seguiu como juíza substituta de Luiz Antonio Bonat, designado em fevereiro do ano seguinte como titular da vara.
Contudo, Bonat vinha da 21ª Vara Federal de Curitiba e estava à frente da 13ª quando o ministro Edson Fachin, do STF, declarou a incompetência da vara para julgar processos que envolviam Lula e a nulidade das condenações, em 2021.
Após Bonat deixar a vara em Curitiba, a juíza assumiu novamente a operação até a designação da titularidade a Eduardo Appio, em fevereiro de 2023, pelo critério de antiguidade dos magistrados inscritos.
Em meio as mudanças dos juízes, Gabriela Hardt já tentava deixar a 13ª por meio de um concurso interno, no qual pleiteava uma vaga na Justiça Federal de Florianópolis. Porém, um colega com mais tempo de casa ficou com a vaga no final de maio do ano passado. Mas em 2023, a magistrada conseguiu uma transferência para a 3ª Turma Recursal do Paraná.
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