As eleições para os novos conselheiros tutelares nos municípios brasileiros devem ter o maior número de participantes na votação programada entre 8h e 17h deste domingo (1º) em todo o país. Essa é a tendência após uma campanha acirrada com denúncias de perseguição e intolerância religiosa, em diferentes estados brasileiros. O movimento conservador entrou na briga pelas vagas do Conselho Tutelar para buscar mais representatividade das pautas em defesa dos direitos das crianças.
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Todos os eleitores brasileiros com situação regularizada podem participar do pleito, levando ao local de votação apenas um documento de identificação com foto e o título de eleitor (saiba mais sobre como participar ao final deste texto).
Pós-graduanda em educação clássica cristã, a advogada Rossana Mendonça Farias analisa que o Conselho Tutelar é um órgão-chave, sendo que o conselheiro tutelar pode tirar até a autoridade de um pai. “É uma intervenção estatal em uma figura de autoridade, que tem um poder de comando para isso, dado pelo próprio Estado”, aponta.
De acordo com ela, houve um despertar para a necessidade da representatividade conservadora a partir do momento que as pessoas se mobilizaram em oposição a pautas como ideologia de gênero, liberação das drogas e legalização do aborto. “Com todo esse poder sobre as famílias, inclusive no aconselhamento e no acompanhamento, essa pauta começou a ser incluída como importante para os grupos que querem deter o controle sobre as crianças. Os conservadores acordaram, na minha visão um pouco tarde, mas estamos com mais força do que era esperado. Nunca houve uma mobilização como essa em torno da eleição dos conselheiros tutelares”, avalia.
A organização para candidatura de conselheiros tutelares alinhados às pautas conservadoras enfrentou resistência tanto no registro dos nomes como durante a campanha eleitoral.
De acordo com quem está envolvido no processo, isso aconteceu na divulgação dos nomes dos candidatos, além da falta de transparência tradicional na divulgação dos locais de votação e incentivo para a participação facultativa do eleitor no processo democrático de escolha.
Rossana relata que participou de reuniões com grupos conservadores do Espírito Santo nos últimos meses, quando foram registradas denúncias pela suspeita de intolerância religiosa no registro das candidaturas. Um dos requisitos para ser conselheiro tutelar é que o candidato tenha experiência comprovada no atendimento das crianças, de dois a três anos, dependendo de cada lei municipal. No entanto, as declarações emitidas por igrejas pelas atividades nos ministérios infantis, no caso dos evangélicos, ou pela catequização das crianças na Igreja Católica, não foram aceitas, diferente de outros estados, entre eles, o Rio de Janeiro, na mesma região do país.
“Tudo isso é considerado e válido como comprovante de experiência no trabalho com crianças. Mas tivemos várias denúncias no estado do Espírito Santo que as declarações fornecidas pelas igrejas não estavam sendo contabilizadas, o que prejudica de sobremaneira um grupo”, afirma ela.
Os candidatos que foram vetados por apresentar as declarações de trabalhos em igrejas acionaram advogados para que os documentos de comprovação fossem validados pelas comissões eleitorais capixabas. “As legislações municipais, o Estatuto da Criança e do Adolescente e a lei federal, que trata da eleição para o Conselho Tutelar, não dizem que as declarações devem vir de determinados tipos de órgãos, por exemplo, de uma escola regulamentada”, argumenta.
“A legislação precisa estar em conformidade. Se a norma federal não traz um requisito específico, a norma municipal também não pode trazer um requisito específico, sob pena de ferir o processo eleitoral, o que sequer ocorre no Estado Espírito Santo, pois não existe uma lei municipal para isso [veto de comprovante das igrejas]”, completa.
Outro problema no pleito é a falta de informações acessíveis aos eleitores interessados em votar nas candidatos aos cargos. A divulgação é de responsabilidade de cada município, que determina poucos locais de votação com divulgação ineficaz, dependendo de grupos e dos próprios candidatos para incentivar a participação popular por meio do título de eleitor.
Em Curitiba, decisões sobre propagandas irregulares na eleição para o Conselho Tutelar são consideradas subjetivas
A divulgação dos nomes dos candidatos e a propaganda eleitoral também foram alvos de embate entre conservadores e progressistas no Paraná. O Instituto Luzeiro acusou o Conselho Municipal dos Direitos da Infância e Adolescência de Curitiba (Comtiba) de parcialidade e perseguição religiosa em sanções impostas por propaganda eleitoral considerada irregular durante a campanha para os cargos de conselheiros tutelares.
Enquanto o instituto foi multado em R$1.320 [um salário mínimo] e notificado por propaganda irregular por divulgar a lista de candidatos com valores cristãos e conservadores, sendo que a multa foi retirada após recurso, a denúncia por abuso de propaganda na internet e em redes sociais contra o Grupo Dignidade, ligado à defesa da comunidade LGBT, foi arquivada, por unanimidade, pela Comissão Eleitoral do Comtiba.
A pedido da Gazeta do Povo, a advogada Rossana Farias analisou as denúncias e afirmou que ambas eram “muito próximas” relacionadas às propagandas em desconformidade à resolução do Comtiba, que regulamenta a propaganda no pleito, mas tiveram decisões extremamente distintas, impostas pela Comissão Eleitoral. “Temos uma divergência de aplicação. O mérito não tem como analisar, pois não tenho acesso aos processos. Como que essa comissão eleitoral chegou a decisão de que aquele grupo deveria pagar uma multa, sendo que as punições são extremamente parecidas e existe uma norma de abrangência muito aberta?”, questiona.
Na avaliação dela, a resolução do Comtiba tem diversos casos de descumprimento em relação à propaganda, mas não traz punições específicas para cada caso e determina que todas as denúncias por irregularidades devem passar pela Comissão Eleitoral, que inclusive tem o poder de cassação da candidatura ao Conselho Tutelar. Sem objetividade, a advogada afirma que “o critério da aplicação da punição é subjetivo”.
Além disso, ela argumenta que o uso do brasão do município de Curitiba junto às propagandas dos candidatos, que teria provocado a sanção contra o grupo conservador, é tratado em outra legislação que não prevê nenhuma punição, e não estaria presente na resolução do Comtiba.
Grupo aposta em conscientização nas escolas e igrejas em Santa Catarina
Uma das lideranças da Liga Conservadora de Balneário Camboriú e representante catarinense do grupo “Tias do Zap”, a corretora de imóveis Mariângela Waltrick de Figueiredo afirmou que os candidatos estão com muito receio na divulgação por conta do risco de serem punidos por causa das bandeiras conservadoras defendidas. “O cenário é de cautela na divulgação porque eles sabem que a situação é muito delicada para a direita. Nós, hoje, somos perseguidos, então não existe uma grande divulgação”, revela.
Por outro lado, Mariângela disse que o movimento aposta na campanha “corpo a corpo” na frente de escolas e das igrejas para conversar com as pessoas, principalmente pais, sobre a importância do voto nas eleições do Conselho Tutelar. “Esperaram a saída dos fiéis e dos pais para conscientização das pessoas, mostrando a importância de marcar presença, votar e escolher certo para que o filho tenha paz dentro das escolas e não seja doutrinado. A maioria ficou muito surpresa, pois nem sabia que poderia votar, quanto mais que eram cinco candidatos”, relata.
Na pesquisa realizada pelo grupo, três candidatos alinhados com a pauta conservadora foram escolhidos para receber o apoio na eleição para novos conselheiros. “Dormimos durante 30 anos, período em que as nossas crianças e jovens foram doutrinados e, por isso, estamos vivendo esse caos. Com certeza, o movimento é muito tardio, mas começa uma esperança fundamental para a proteção das nossas crianças e para ver o que acontecerá no próximo ano nas nossas eleições [municipais]”, declara.
Ela lembra que a articulação com o grupo de Curitiba “Tias do Zap” foi feita durante o Foro de Curitiba, com uma das fundadoras do movimento na capital paranaense, Silvana Botton, mais conhecida como Naná. Em Curitiba, o grupo emplacou 22 candidaturas.
Como votar nas eleições para os cargos de conselheiros tutelares
A eleição para o Conselho Tutelar ocorre em todo o país no primeiro domingo do mês de outubro do ano subsequente ao da eleição presidencial. Neste ano, o pleito será neste domingo, 1º de outubro.
Todo cidadão brasileiro com mais de 16 anos, com título de eleitor e em dia com as obrigações eleitorais pode votar nas eleições aos cargos de conselheiros tutelares, apesar de não ser obrigatório. Basta que o eleitor compareça ao local de votação com documento de identificação com foto e título de eleitor.
Para conhecer os candidatos, assim como o local de votação, que pode não ser o mesmo das eleições gerais, os cidadãos devem procurar a Prefeitura, o Conselho dos Direitos da Criança e do Adolescente ou a Promotoria de Justiça de cada cidade. A relação dos candidatos a conselheiro tutelar deve estar disponível para consulta da população nos sites das prefeituras e também dos Conselhos Municipais.
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