O Conselho de Ética e Decoro Parlamentar da Assembleia Legislativa do Paraná (Alep) se reuniu, nesta segunda-feira (11), após os pedidos de vistas sobre o processo disciplinar por quebra de decoro parlamentar que investiga a conduta do deputado Renato Freitas (PT). O caso foi o estopim da crise envolvendo as investigações sigilosas do Ministério Público do Paraná (MP-PR) sobre o pedido de propina feita pelo presidente Ademar Traiano (PSD) para renovação do contrato da TV Assembleia.
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O relator, deputado Matheus Vermelho (PP) sugeriu uma advertência escrita ao Freitas mas a deputado Ana Julia (PT) apresentou voto separado e o parlamentar Do Carmo (União) pediu vistas do voto, o que adia a decisão sobre o futuro de Freitas para 2024 com a proximidade do recesso legislativo.
Até lá, a conduta do deputado estadual petista - que ficou conhecido pela invasão de uma igreja durante protesto e por defender a desmilitarização da PM - segue sendo questionada, pois apesar da suspeita de quebra de decoro, ele passou a ter argumentos para embasar a acusação proferida em plenário contra o presidente da Alep.
O motivo de Freitas estar sendo processado é por ter chamado Traiano de “corrupto”, em outubro, durante bate-boca no plenário, suspeita que veio à tona após o vazamento de informações do acordo do parlamentar com o MP-PR, publicado pela imprensa que chegou a ser censurada pela Justiça.
Entretanto, na visão de especialistas, Freitas deve responder pela quebra de decoro. O advogado em direito constitucional e penal, Acacio Miranda, explica que o decoro é um conceito subjetivo e que cabe aos próprios parlamentares interpretarem. “A quebra de decoro é a prática de qualquer ato incompatível com o cargo”, resume.
Miranda analisa que houve "excessos na fala" e lembra que Freitas já foi investigado pelo Conselho de Ética por quebra de decoro em outras ocasiões. “Ele chamou [Traiano] de corrupto. Freitas faz uma afirmação direta, contundente e dirigida. Dada a generalidade da fala de corrupto, ele pode ser responsabilizado”, avalia o especialista.
Renato Freitas adota "condutas incompatíveis" com o decoro parlamentar
Segundo o relator do processo, deputado Matheus Vermelho (PP), o petista “vem desde o início do mandato adotando condutas incompatíveis com o decoro parlamentar" e que os "limites foram extrapolados" no último episódio investigado. Com isso, o histórico do parlamentar também teve "peso" na decisão pela advertência escrita.
Embora o estopim tenha sido Freitas chamar de “corrupto” o presidente da Alep, outras ofensas foram dirigidas aos visitantes presentes na galeria da Assembleia Legislativa do Paraná.
“Antes de mais nada é preciso reestabelecer a verdade, pois vi em diversos veículos e em redes sociais matérias e comentários no sentido de que este processo estaria julgando Renato Freitas, unicamente, por acusar o Presidente Ademar Traiano de corrupto. Isso não é verdade. Vê-se claramente nos documentos juntados ao processo que as condutas não se limitam a esse único fato”, argumenta o relator no parecer do processo.
No dia 9 de outubro, Freitas se dirigiu aos representantes de igrejas evangélicas que estavam nas galerias da Assembleia se manifestando contra o aborto e alegou que o cristianismo havia sido sequestrado pelo que chamou de “populismo religioso”. “Esse é um problema que não é de hoje. Quem julgou Jesus? Quem confundiu a cabeça do povo para julgá-lo, crucificá-lo, torturá-lo, matá-lo? Os religiosos, os hipócritas. Falsos profetas, maus pastores. Jesus pregou o perdão, e hoje o que se vê nas igrejas é a substituição do perdão pelo ódio, pela vingança”, discursou o deputado.
Freitas seguiu, se dirigindo diretamente às pessoas que estavam nas galerias. “Todos têm direito ao arrependimento, inclusive vocês. Todos, sem exceção, dos mais hipócritas aos menos hipócritas. Dos mais pecadores aos menos pecadores. Os que fazem do templo uma casa de comércio e vendem lâmpadas abençoadas, águas da fonte do Rio Jordão, pedras do Muro das Lamentações e toda sorte de cafajestice, de picaretagem, até esses podem se arrepender”.
Freitas ainda acusou a Assembleia de se tornar um palco de um "espetáculo de horrores que fez com que Curitiba se tornasse a capital do fascismo”.
Diante disso, o advogado criminalista Luciano Katarinhuk também confirma que houve exageros na fala do parlamentar petista. “Como orador, ele atacou as pessoas da galeria, criou uma animosidade. Não somente, a ofensa ao Traiano, mas às pessoas na galeria. Ele não agiu com normalidade na fala e a forma como ele fez foi criando uma animosidade na sessão”.
Relator do caso na Comissão de Ética, Vermelho justifica que ato de Traiano interromper a fala de Freitas é justificável devido a “exaltação dos ânimos” na sessão, como também para “resguardar a segurança interna”.
“Freitas acabou extrapolando e ele não pode se esconder na imunidade parlamentar. Houve uma perturbação na Assembleia, ele falou de forma mais dura e ficou provocando. [A quebra de decoro] é algo subjetivo, mas é uma interpretação. Houve abuso das prerrogativas, ele excedeu nas falas e nos gritos”, analisa o advogado criminalista Luciano Katarinhuk.
Freitas argumenta que houve “exceção da verdade”
A defesa de Freitas justifica que o parlamentar uso a expressão “corrupto” para o fato de que Traiano havia “corrompido, ferindo o Regimento Interno desta Casa de Leis ao desobedecer às regras nele proposto ao cercear o direito do parlamentar de proferir seu discurso naquela ocasião”. Durante, a discussão o presidente da Alep cortou o microfone de Renato Freitas.
A defesa ainda argumenta que houve “exceção da verdade”, pois a declaração feita é verdade e não pode ser considerada caluniosa, citando o recebimento de propina pelo presidente da Assembleia durante o processo de renovação do contrato da TV Icaraí.
"Pode ser exceção da verdade por ele ter chamado Traiano de corrupto, mas tem todo o resto. Freitas não deu a entender que quando chamou de corrupto era por conta de não ter respeitado o tempo dele”, pondera o advogado criminalista Luciano Katarinhuk.
“É uma punição político administrativa para combater condutas reiteradas. Não tanto pelo fato em si, principalmente, por ter chamado o presidente da Alep de corrupto. Isso é um dos fatos. Mas com a fala, ele acaba difamando a Assembleia. É a forma como ele fala e como ele coloca”, completa.
Presidente do Conselho de Ética nega imediatismo em processo
O presidente do Conselho de Ética, deputado Delegado Jacovós (PL), afirma que a tramitação do processo ocorreu sem imediatismo, dentro do cronograma esperado, e ressalta que nenhum parlamentar pode ser cassado sem receber antes uma advertência versal ou escrita. As penas são graduais até chegar em uma cassação.
“O nosso regimento é bastante justo com relação a punições. Eu já havia dito anteriormente que ninguém pode ser cassado sem efetivamente passar, primeiro, por advertência verbal, escrita, suspensão de prerrogativas, suspensão de mandato e somente dentro dessa proporcionalidade que pode alguém ser cassado, considerando o nosso atual regimento”, explica Jacovós.
O relator, deputado Matheus Vermelho, nega que o processo tenha ocorrido com imediatismo e alega até mesmo que foi "amplamente benéfico" a Freitas, pois aceitou a defesa, apesar do não cumprimento dos prazos devidos.
Mas, em entrevista coletiva, Freitas adiantou que pode recorrer, dependendo no resultado do processo. “A pena em si é leve. Uma advertência escrita que tem mais um valor simbólico do que efetivo. Mas esse valor simbólico manda uma mensagem e que mensagem é essa? Aqueles que estiverem dispostos a dizer a verdade, sobretudo, em um caso de corrupção do dinheiro público, essas pessoas serão cassadas e perseguidas”.
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