Considerada uma das graduações mais caras do Brasil, a mensalidade de medicina pode chegar facilmente aos R$ 12 mil em território nacional. Nas universidades públicas, a concorrência que comumente ultrapassa os 100 candidatos por vaga acaba por limitar o desejo de muitos estudantes. No país vizinho, as universidades paraguaias têm proporcionado uma alternativa à demanda: elas atraem cerca de 40 mil brasileiros.
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O levantamento é do Instituto de Desenvolvimento Econômico e Social de Fronteiras (Idesf) ao considerar cidades paraguaias que ficam próximas à fronteira com o Brasil, como Cidade do Leste, Presidente Franco e Pedro Juan Caballero. São cinco cursos em instituições públicas e outros 17 em instituições privadas, segundo o Conselho Nacional de Educação Superior (Cones) do Paraguai. Ao menos seis das particulares figuram entre as preferidas dos brasileiros, mas que provocam alertas importantes.
Com mensalidades que costumam ficar abaixo dos R$ 2 mil, o curso de medicina tem provocado um importante movimento econômico e social com a migração de estudantes para a região de fronteira , avalia o presidente do Idesf, Luciano Barros. “A maior parte desses estudantes continua vivendo no Brasil, então mora em Foz do Iguaçu (PR), em Ponta Porã (MS), e atravessa a fronteira todos os dias para estudar. Muitos, inclusive, vieram com famílias para a região fomentando outros segmentos econômicos como mercado imobiliário. Há um importante e positivo impacto que pode ser observado”, avaliou.
Além da facilidade com o idioma espanhol, o currículo da maior parte das instituições está adaptado à realidade brasileira, de olho nos processos de revalidação de diplomas em território nacional. “Tem sido muito comum que os estudantes que estão cursando no Paraguai tentem lá pelo terceiro, quarto ano, a transferência para uma instituição brasileira e assim concluem o curso no país. Quem não consegue, termina no Paraguai mesmo e depois tenta o Revalida”, explicou Barros.
As instituições paraguaias não possuem vestibulares e a maior parte conta apenas com exames de admissão, com pouca burocracia ou dificuldade para aprovação.
Conselho de Educação paraguaio quer reavaliar currículos e oferta de novos cursos
O presidente do Idesf pondera que nem tudo são flores e que há evidências de instituições do lado de lá da fronteira que não se adequaram às exigências curriculares para formação, não possuem laboratórios compatíveis ou qualidade no processo de ensino.
No primeiro semestre deste ano, o Conselho Nacional de Educação Superior (Cones) do Paraguai alertou que estava reavaliando regras e metodologia de ensino adotadas por alguns cursos de medicina no país. Entre as possibilidades levantadas pelo conselho estava a revisão curricular após um alto índice de reprovação de estudantes brasileiros formados lá no chamado Revalida, feito no Brasil. Na ocasião foram aprovados apenas 18 dos 137 estudantes formados no país vizinho.
O alerta não foi o único. O Círculo Paraguaio de Médicos (CPM) requisitou ao Cones a suspensão da habilitação para oferta de novos cursos no segmento. À imprensa paraguaia, o, presidente do CPM, Jorge Rodas, disse que a instituição pedia que por pelo menos cinco anos não fossem autorizados novos cursos de medicina no Paraguai por não haver “condições para novos estudantes”.
O Cones destacou, no entanto, que leis específicas deveriam tratar do tema, pois a falta de embasamento legal tem impedido a não autorização de novos cursos e as faculdades recorrem à Justiça para assegurar novas turmas. O tema vem sendo tratado também pelo Senado paraguaio, em tom de alerta.
A senadora Blanca Ovelar (ANR, FR), presidente da Comissão de Educação do Senado, chegou a usar a tribuna para alertar que foi procurada pela Embaixada Brasileira depois que cerca de mil estudantes terem sido enganados por uma instituição privada que teve seu credenciamento cassado, no que ela chamou de “duvidosa ação de inconstitucionalidade”.
O senado paraguaio abriu uma investigação contra a Agência Nacional de Avaliação e Credenciamento do Ensino Superior (Aneaes), acusada por estudantes brasileiros de obstruir seu registro na Comissão Nacional de Residência Médica (Conarem). A entidade nega as acusações.
O sonho de cursar medicina não pode virar pesadelo, diz estudante brasileira
O sonho de cursar medicina no Brasil estava fora dos planos da pernambucana Eloísa Carneiro. Após fazer quatro vestibulares em universidades públicas e não ser aprovada, ela já pensava em mudar os planos para a carreira quando soube que um curso de medicina no Paraguai estava atraindo milhares de brasileiros. “Me informei, busquei estudantes que estavam lá e vi que poderia ser possível. Antes de tudo, é preciso analisar bem para que o sonho não se torne pesadelo”, comentou.
Eloísa mora em Foz do Iguaçu e todos os dias embarca em um ônibus para estudar em Cidade do Leste. A estudante contou que um dos percursos mais importantes para se certificar que a instituição é idônea e oferece uma boa qualificação é pesquisar se participa do processo de certificação de qualidade emitido pela mencionada Agência Nacional de Avaliação e Acreditação da Educação Superior, que controla os processos nas faculdades e universidades no Paraguai.
“Apesar da investigação e algumas denúncias (contra a agência), essa certificação é importante, séria e vai revelar se a instituição está comprometida com a qualidade do ensino. Depois eu indico falar com brasileiros que estejam estudando lá, isso ajuda muito”, completou.
Ela está no quarto ano e pretende, em 2024, tentar uma transferência para uma instituição brasileira. “Não é fácil, estou me preparando para isso e espero que dê tudo certo. Se não conseguir, vou terminar no Paraguai e depois fazer o Revalida”, contou.
Em Ponta Porã, município que faz fronteira seca com Pedro Juan Caballero, a estimativa é que a cidade tenha acomodado de 12 mil a 15 mil estudantes nos últimos anos. A advogada e procuradora municipal Laura Karoline Silva Melo fez pesquisa de mestrado pela Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul sobre o efeito desta migração e avaliou pontos positivos e negativos.
Para a procuradora, entre os aspectos vantajosos está a movimentação econômica em diversos segmentos, enquanto os aspectos negativos pesam sobre os impactos a serviços públicos como educação e saúde que exigem um olhar diferenciado sobre metodologia de arrecadação.
Laura detalha alguns pontos de atenção em relação a esse fenômeno. “Há uma série de dados e aspectos que necessitam de uma análise mais apurada. No Sistema Único de Saúde, por exemplo, se olharmos os pacientes que são atendidos no centro de especialidades de Ponta Porã, podemos projetar um mapa do Brasil. Na educação o que me chamou a atenção é que recebe repasse de verbas no ano posterior, então fazer o planejamento nesse setor se torna mais complicado, tamanha a movimentação de tais estudantes, pois alguns permanecem na cidade, outros desistem, outros ainda se mudam para o outro lado da fronteira. Acredito que por causa desse dinamismo, as cidades gêmeas deveriam ter legislação diferenciada”.
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