| Foto: Gerd Altmann/Pixabay
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Desde a Geada Negra do inverno de 1975, que destruiu da noite para o dia todas as plantações de café de Londrina e reduziu fortunas a cinzas e folhas secas, o município busca encontrar uma nova vocação econômica. E esse protagonismo, de acordo com um levantamento feito para guiar o desenvolvimento da cidade pelos próximos 20 anos, deve ficar à cargo de um ecossistema de inovação presente em Londrina, impulsionado por empresas de Tecnologia da Informação e Comunicação (TIC) .

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Este foi um dos setores estratégicos identificados no planejamento Masterplan 2040, um diagnóstico encomendado pela Prefeitura de Londrina que ponderou diversos fatores econômicos e históricos, e que serve de base para as novas apostas da cidade na atração de negócios. Outras áreas com potencial identificadas pelo Masterplan foram o Agronegócio, a Saúde e as indústrias Química e Eletrometalmecânica. O ponto forte a favor da TIC é que ela pode ser usada como fonte de inovação nos demais setores, além de ser ela própria uma área de interesse para empresas e negócios.

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É uma mudança necessária, uma vez que as forças motrizes da cidade são basicamente as mesmas desde o tempo das perdas na cafeicultura. Dados do Sebrae mostram que mais de 80% das empresas formais instaladas em Londrina são dos setores de comércio e serviços. Elas contribuem com 67% para o Produto Interno Bruto (PIB) do município, mas são áreas extremamente suscetíveis a medidas como a restrição de funcionamento de atividades não essenciais decretada pelo governador Ratinho Júnior no fim de fevereiro – uma forma de reduzir os impactos da pandemia de Covid-19.

E assim como quando o frio extremo dizimou os pés de café, Londrina mais uma vez busca se reinventar, agora em reação às perdas trazidas pela Covid-19. “A inovação, nesse momento, é a nossa grande identidade e tem que ser o nosso futuro alicerce. Os empresários precisam entender que isso é necessário, em meio a todas essas dificuldades, para que as empresas consigam atualizar seus formatos, se adequar a essa nova realidade”, avalia Daiana Lopes, presidente do Londrina Convention Bureau.

A mesma opinião é compartilhada por Fernando Moraes, presidente da Associação Comercial e Industrial de Londrina. Segundo ele, apesar de ter um comércio forte e diversificado, a cidade sofreu duras perdas desde o começo da pandemia, em março de 2020. “Naquele ano, quando vinha de um período de crescimento, enfrentou muitos desafios, perdeu forças, mas agora busca de novo seu espaço”, resumiu.

Esse ecossistema de inovação, porém, é diferente de um parque industrial convencional, onde um prédio grande e repleto de máquinas recebe matéria-prima de um lado e entrega um produto final do outro lado. Por mais que gere bons resultados e possa ser medida, a inovação por si só é intangível. E por isso é difícil para quem já faz associações imediatas com os bonés de Apucarana, os móveis de Arapongas e o vestuário de Cianorte, por exemplo, tentar enxergar a inovação de Londrina. “Isso talvez não fique óbvio para as pessoas que estão fora desse meio, mas esse ecossistema de inovação existe, é muito ativo e muito importante”, avaliou Daiana.

Cluster de pesquisadores favorece avanço da TIC em Londrina

Para a presidente do Londrina Convention Bureau, o fortalecimento dos setores de tecnologia e inovação em Londrina é uma consequência direta e natural da forte presença de pesquisadores na cidade. “Nós temos um histórico de ótimas universidades, temos pensadores e cientistas formados aqui, temos empresas instaladas e mão-de-obra especializada e isso faz toda a diferença”. Em outras palavras, Londrina tem todo o potencial para ser o lugar certo na hora certa.

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Quem esteve no lugar certo e na hora certa foi Bruno Ullrich Rondem, fundador da startup Preveni. Empreendedor egresso do serviço público, ele participou de um evento promovido pela Santa Casa de Londrina em 2018 cujo objetivo, entre outros, era encontrar soluções de base tecnológica que minimizassem o sofrimento de pacientes com escaras, as lesões causadas pela pressão do corpo do próprio paciente acamado contra o leito hospitalar.

“Eu me encontrei com a equipe ali no dia. Não conhecia ninguém. Tinha um enfermeiro, um programador, outras pessoas da área de informática e de gestão. Conversamos com profissionais da Santa Casa, profissionais da área da saúde, pessoas do mercado de tecnologia e de todo esse trabalho surgiu a ideia de um produto para prevenir essas lesões”, contou o empreendedor.

As escaras geralmente aparecem em pacientes que estão há muito tempo acamados, como aqueles internados em UTI. Elas se formam principalmente quando o paciente fica por muito tempo na mesma posição, e podem ser bastante profundas e com tratamento doloroso. A ideia engenhosa do grupo de Bruno foi a de criar um sensor que identifica em que posição está o paciente e há quanto tempo ele está sem se mover. Quando esse tempo atinge o limite prescrito pela equipe médica, o sensor envia um sinal para um tablet alertando a equipe de enfermagem para que troque o paciente de posição.

Além do prêmio recebido por ser um dos melhores projetos daquele evento, a ideia de Bruno segue sendo reconhecida. Ele também foi selecionado em programas de empresas como Neo Química e Samsung. Mesmo assim, com tamanho sucesso, o produto final ainda não está à venda. Vencidas as etapas de prototipagem e validação, agora Bruno depende de autorizações de duas agências reguladoras do governo federal – sem prazo para acontecer.

“A comunicação entre o sensor e o tablet é feita sem fio. Por isso, a Anatel precisa certificar o produto e garantir que ele não gere interferências em nenhum outro tipo de aparelho e nem sofra interferência de qualquer fonte externa. E por ser um produto da área da Saúde, a Anvisa precisa checar se ele é seguro para o paciente, que não oferece riscos de qualquer natureza. É uma etapa necessária, mas muito demorada do processo”, explicou Bruno, confirmando que a ideia é vender o sensor não só para hospitais e clínicas, mas também para as famílias que têm pacientes acamados em casa.

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Senai mantém hub de Inteligência Artificial em Londrina

Um dos grandes marcos do ecossistema de inovação de Londrina é o HUB de Inteligência Artificial sediado no Senai. Nada de robôs humanoides tirando o emprego de pessoas. O assunto aqui é, entre outros, oferecer soluções tecnológicas para problemas das indústrias tradicionais. É o ponto de encontro entre a indústria tradicional e as empresas de inovação. Uma precisando de soluções, outra oferecendo inovações tecnológicas. Um exemplo prático: um programa de computador que por meio de leituras de dados consiga prever o momento correto de manutenção em uma máquina para, com isso, reduzir os riscos do operador e evitar custos desnecessários como a troca de equipamentos quebrados.

Tais soluções, aponta o gerente regional do Sebrae no Norte do Paraná, Fabrício Bianchi, ficam mais fáceis de serem encontradas em Londrina por conta do tal ecossistema de inovação, que conecta a indústria tradicional a pequenas e médias empresas de tecnologia. “Nós temos imobiliárias que estão usando processos de automação que facilitam a interação entre o corretor e o cliente. Hoje você pode fazer compras sem sair de casa e receber os produtos em meia hora por meio de um site aqui de Londrina que usa várias tecnologias envolvendo sensores, meios de pagamento, tecnologia embarcada. São empresas que não se via há alguns anos, e agora brotam na cidade. Um grande erro é achar que esse novo modelo vai substituir as indústrias tradicionais. Não vai. Nós vamos continuar tendo fábricas de cadeados e de macarrão. Mas cada vez mais no meio desses processos vão ser incorporadas novas formas de fazer as coisas, seja para otimizar a produção, seja para tornar os processos mais seguros. Se aqui ainda fosse a capital do café, certamente essa produção seria fortemente influenciada pela inovação e pela tecnologia”, declarou.

Infográficos Gazeta do Povo[Clique para ampliar]