A análise de um recurso apresentado pela defesa de Abib Miguel, ex-diretor-geral da Assembleia Legislativa do Paraná, acusado de comandar um esquema de desvio de dinheiro público revelado pela série Diários Secretos, divulgada pela Gazeta do Povo e pela RPC em 2010, está sendo realizada nesta quinta-feira no Tribunal de Justiça do Paraná.
Conhecido como Bibinho, o réu tenta conseguir o mesmo benefício que foi dado a outros ex-diretores, que conquistaram, no ano passado, a anulação de provas coletadas em uma operação policial. Contudo, uma decisão recente do Supremo Tribunal Federal (STF), que estabeleceu um entendimento sobre a discussão referente a prédios públicos e foro privilegiado, pode influenciar no resultado desse pedido.
Editorial: As provas dos Diários Secretos e o risco de retrocesso
A apelação será avaliada pela 2ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Paraná (TJ-PR). Bibinho é réu em diversas ações relacionadas aos Diários Secretos, com condenações. No caso que será discutido agora, a defesa tenta anular um julgamento que o considerou culpado pela contratação de uma família de funcionários fantasmas. Pelos crimes relacionados, ele recebeu a pena de 15 anos de prisão. A assessoria jurídica do ex-diretor quer que a sentença de primeira instância seja considerada inválida pelo uso de documentos coletados em uma busca e apreensão.
A tese da defesa é de que a Operação Ectoplasma II, realizada em 8 de maio de 2010 na Assembleia Legislativa, foi autorizada por um juiz de primeiro grau e que, como haveria a possibilidade de atingir pessoas com foro privilegiado, como deputados estaduais, a ação policial só poderia ter sido autorizada pelo Tribunal de Justiça. Outros réus envolvidos nos Diários Secretos tentam recursos semelhantes, mas os processos ainda não estão prontos para julgamento. O Ministério Público entende que a operação foi legal e destaca, ainda, que é robusto o conjunto de provas, para além das colhidas na busca feita na Assembleia Legislativa.
O caso foi amplamente debatido em 2017, na 2ª Câmara Criminal, encarregada de julgar os recursos relacionados aos Diários Secretos. Na época, houve divergência entre os magistrados, levando o caso para ser apreciado por outro colegiado. Em 2018, a 1ª Câmara Criminal do TJ foi acionada para dirimir a dúvida, provocada pelas defesas do ex-diretor administrativo José Ary Nassif e do ex-diretor de pessoal Claudio Marques da Silva (eles questionaram a sentença de primeira instância, datada de 2013, que condenou ambos a 18 anos de prisão pelos crimes de peculato – desvio de dinheiro público, lavagem de dinheiro e organização criminosa).
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Os magistrados da 1ª Câmara Criminal acataram os argumentos da defesa, e invalidaram, naquele caso específico, a coleta de provas que fazia parte da acusação contra os dois ex-diretores. Assim, o processo de ambos voltou para a primeira instância, para que novo julgamento seja realizado sem considerar os documentos apreendidos na Assembleia. Eles estiveram presos e agora aguardam o desfecho em liberdade monitorada (com tornozeleira eletrônica). Já Bibinho esteve presos em diversos momentos nos últimos nove anos. O mais recente mandado de prisão, de 2018, está vigente e ele segue detido no Complexo Médico Penal, em Pinhais.
O precedente aberto em agosto do ano passado, quando a 1ª Câmara Criminal acatou os argumentos da defesa, enfrenta agora um fato novo. Em junho de 2019, o plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) considerou legal a Operação Métis, que prendeu policiais legislativos e fez apreensões em 2016 no Senado, autorizada justamente por um juiz de primeiro grau. Os ministros entenderam que a tese de que o foro privilegiado vale apenas para o detentor do cargo, não se alargando a espaços físicos.
Linha do tempo dos Diários Secretos
Começa a divulgação da série Diários Secretos, reportagens produzidas pela Gazeta do Povo e pela RPC, com base em documentos escondidos pela Assembleia Legislativa do Paraná e que mostraram um esquema de desvio de recursos públicos, por meio de contratação de funcionários fantasmas.
A partir de uma força-tarefa do Ministério Público, tendo como ponto de partida as reportagens, foram abertos vários inquéritos para apurar os casos denunciados. A investigação levou à deflagração da operação Ectoplasma, que levou à prisão de dez pessoas, entre elas os ex-diretores da Assembleia, Abib Miguel, conhecido como Bibinho, José Ary Nassif e Claudio Marques da Silva.
É recebida pela Justiça a primeira ação criminal contra os ex-diretores da Assembleia Legislativa. A partir daí foram dezenas de processos ajuizados, tanto penais como cíveis, buscando apurar responsabilidades. Por uma questão de foro privilegiado, os casos envolvendo deputados ficaram sob a atribuição da Procuradoria de Justiça, a segunda instância do Ministério Público Estadual.
Duas semanas depois da primeira, é deflagrada a segunda operação, a Ectoplasma II, com foco nas irregularidades no Legislativo. Novamente os ex-diretores foram presos (haviam sido soltos por habeas corpus). Naquela vez, houve também busca e apreensão no prédio da Assembleia – e é essa coleta de documentos que está sendo questionada na Justiça.
Bibinho e os dois ex-diretores são condenados a 19 anos de prisão, por peculato (desvio de dinheiro público), lavagem de dinheiro e formação de quadrilha. Três meses depois houve a segunda condenação, também em 19 anos. As duas sentenças foram anuladas pelo Tribunal de Justiça do Paraná em 2015, atendendo ao pedido da defesa, já que Bibinho optou por não prestar depoimento na ausência do advogado, que havia comunicado a necessidade de estar em um compromisso. Os casos, somente sobre o ex-diretor-geral, voltaram para a primeira instância, com a confirmação das condenações.
Analisando os recursos da condenação de primeira instância dos ex-diretores José Ary Nassif e Claudio Marques da Silva, presos desde 2016, a 2ª Câmara Criminal do TJ-PR aumentou a pena deles para 23 anos. Contudo, o placar não foi unânime, com dois votos (desembargadores José Maurício Pinto de Almeida e José Carlos Dalacqua) a um (juiz substituto Marcel Guimarães Rotoli de Macedo). A divergência exigiu que o processo fosse analisado por outro conjunto de magistrados, no caso, a 1ª Câmara Criminal do TJ-PR.
Por unanimidade, cinco magistrados da 1ª Câmara Criminal do TJ-PR decidiram que a coleta de provas da operação Ectoplasma II, realizada na Assembleia Legislativa oito anos atrás, não poderia ter sido autorizada por um juiz de primeira instância. A decisão vale apenas para uma das condenações do ex-diretores José Ary Nassif e Claudio Marques da Silva, que terão o processo reavaliado na primeira instância sem as provas coletadas na operação, mas o entendimento dos magistrados pode ser usado em outros casos semelhantes.
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