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Grupo Tigre chega aos 30 anos com 100% dos reféns resgatados
Grupo Tigre, elite da Polícia Civil,.| Foto: Polícia Civil do Paraná

Os “tigrinhos” viraram um dos grupos de operações táticas policiais mais respeitáveis do Brasil. Era dessa forma pejorativa, no diminutivo, que muitos dos próprios colegas policiais se referiam à primeira equipe do Tático Integrado de Grupos de Repressão Policial (Tigre), elite da Polícia Civil do Paraná, há 30 anos especializado na solução de sequestros e que presta apoio operacional a outras unidades da corporação. Em três décadas, o Grupo Tigre resgatou com vida todos os reféns das ocorrências que atendeu, tornando-se referência no Brasil em operações táticas.

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“Cheguei a ser ridicularizado dentro da própria Polícia Civil, com colegas chamando a gente de 'tigrinhos', dizendo que eu estava brincando de ser Swat. Hoje a unidade é referência no Brasil e faz intercâmbio inclusive com grupos de renome internacional”, orgulha-se o delegado aposentado Adauto Abreu de Oliveira, criador do Tigre e coordenador do grupo até 1994. Ele se refere às trocas de experiências que a equipe já realizou com unidades de elite como o Le Raid (grupo antiterrorismo da Polícia Nacional da França) e DEA (agência antidrogas dos Estados Unidos, cuja ação é retratada na série Narcos, da Netflix), além de algumas unidades da própria Swat.

Adauto era chefe da Delegacia de Furtos e Roubos em 1987 quando assistiu pela TV reportagem do sequestro de um dos maiores banqueiros do Brasil. Na hora veio a preocupação de que este tipo de crime, à época comum em São Paulo e Rio de Janeiro, acabasse chegando ao Paraná. “Com a repressão da polícia nesses estados, seria questão de tempo para esses grupos atuarem aqui. Até porque tínhamos muitos empresários de renome no Paraná”, recorda o delegado aposentado. Para agir contra os sequestros, Adauto levou ao comando da Polícia Civil da época a ideia de se criar um núcleo especializado em sequestros, capaz não só de investigar, mas também de cumprir operações táticas de alto risco. Apesar da desconfiança de outros policiais, o delegado-geral da época bancou a ideia.

Grupo Tigre da Polícia Civil do Paraná faz treinamento em 2017 com a Le Raid, o grupo antiterrorismo da Policia Nacional Francesa.
Grupo Tigre da Polícia Civil do Paraná faz treinamento em 2017 com a Le Raid, o grupo antiterrorismo da Policia Nacional Francesa.| Albari Rosa / Gazeta do Povo / Arquivo

Três anos depois, com a publicação do decreto estadual 7.397, o Tigre passava a operar oficialmente em 30 de outubro de 1990. Mas um ano antes o grupo já estava formado e sendo capacitado com treinos criados a partir de estudos de operações táticas do próprio delegado Adauto, com ajuda de outras corporações. Entre elas, o Exército - que ensinou técnicas de disparo com armas de longo alcance e sobrevivência na mata -, o Corpo de Bombeiros - com aulas de rapel em edifícios, hoje, umas das técnicas mais avançadas da unidade - e as equipes de Saúde do estado - que capacitaram os policiais em técnicas de primeiros-socorros.

“No começo, era tudo improvisado, treinávamos por conta própria. Depois ficamos meses treinando com o Exército e os bombeiros. Teve até um major que ao ver a nossa precariedade nos cedeu algumas armas do Exército, os primeiros fuzis da Polícia Civil”, recorda Adauto.

Alto nível de especialização

Dos treinos improvisados com apenas oito policiais, o Tigre evoluiu para as atuais três equipes com policiais com alto grau de especializações, como tiro de altíssima precisão, tática de rapel vertical, inteligência, artes marciais, mergulho, explosivos, arrombamento, entre outras. “Alguns estados adotaram esse modelo de treinamento após a criação do Tigre. Até o grupo surgir, não se falava em operação tática nas policiais judiciárias do Brasil”, afirma o atual coordenador do grupo, o delegado Cristiano Quintas.

Hoje é o Tigre quem treina seus próprios policiais, além de capacitar integrantes de outras corporações. Desde 2000, em sete edições do Curso de Operações Táticas Especiais (Cote), o grupo capacitou todos os seus próprios membros, além de policiais civis de outros estados e integrantes das Forças Armadas.

O nível de exigência do Cote é elevado não só na execução das aulas. Os policiais que querem integrar o Tigre têm toda a carreira profissional pregressa investigada assim que se inscreverm no Cote. Ao menor indício de desvio de conduta, o policial já é cortado da capacitação antes mesmo de começar. Depois, vem o rigor dos treinamentos, em que os alunos ficam até dois meses sendo treinados em regime de internato. Na última edição do Cote, em 2017, 100 policiais se inscreveram, 50 foram selecionados e somente 20 conseguiram concluir o curso.

Idealizador do Grupo Tigre, o delegado aposentado Adauto Abreu de Oliveira recebe homenagem do atual coordenador da unidade, o delegado Cristiano Quintas. Ao fundo, o investigador Milton Suzaki, integrante do Tigre desde o início, em 1990.
Idealizador do Grupo Tigre, o delegado aposentado Adauto Abreu de Oliveira recebe homenagem do atual coordenador da unidade, o delegado Cristiano Quintas. Ao fundo, o investigador Milton Suzaki, integrante do Tigre desde o início, em 1990.| Polícia Civil

“Quando visito o pessoal do Tigre hoje, me orgulho em saber que nenhuma ocorrência que atendemos em 30 anos foi mais difícil do que os nossos próprios treinamentos”, enfatiza o delegado Adauto, que junto com outros integrantes do grupo chegou a achar engraçadas algumas cenas no filme Tropa da Elite, de 2007. “O nosso treinamento era muito mais rigoroso do que aquilo no filme”, lembra.

O delegado Quintas explica que pela dificuldade dos casos, o policial do Tigre tem que estar preparado para agir imediatamente e em qualquer ambiente, inclusive na água. “Muitas vezes atuamos em cativeiros prolongados, que exigem muito do policial, não só fisicamente, mas também no controle emocional”, explica o atual coordenador do Tigre, que já chegou a ficar 40 dias sem ir para casa de plantão na investigação de um sequestro. “Quando pegamos um caso, nossa vida normal é deixada de lado e ficamos exclusivamente em função da investigação”, reforça.

Atuação 24h

Por isso uma das atribuições do Tigre definidas por decreto estadual é de atuação 24 horas por dia. Para isso, o grupo se apega a um tripé: se não estiver em operação, o membro do Tigre obrigatoriamente está se instruindo ou instruindo outros companheiros de trabalho nas mais variadas técnicas. “Várias vezes perdi festas de família, datas marcantes, porque estava em operação. Trabalhar Natal, ano novo, feriado é normal para a gente”, afirma o investigador Milton Suzaki, de 59 anos, o mais antigo integrante do Tigre, da primeira equipe há 30 anos atrás e cujo recorde foi 50 dias fora de casa em uma investigação.

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Hoje instrutor de rapel da equipe e um dos responsáveis pela logística do Tigre, Suzaki foi um dos agentes recém-formados na Academia da Polícia Civil escolhidos pelo delegado Adauto para integrar o Tigre em 1988. “Eu não queria nenhum policial com vícios da profissão, com nenhuma suspeita de desvio de conduta. Por isso optei por formar a primeira equipe com policiais novatos”, explica o delegado aposentado.

Como integrante mais experiente do Tigre, Suzaki afirma que tão difícil quanto os cuidados para que nada corra errado para o refém quando a equipe descobre e estoura um cativeiro é manter não só o controle emocional da equipe policial, como também o da família da pessoa sequestrada durante a investigação. O investigador afirma que, muitas vezes, no afã de ter logo seu ente libertado, as famílias concordam em pagar o resgate. E o perigo, explica, é quando a família toma essa decisão sem avisar os policiais, correndo o risco de perder o dinheiro e, muito pior, o próprio familiar.

“A família precisa ter confiança total no nosso trabalho. E digo que não existe felicidade maior do que resgatar e entregar o refém para sua família. Eu acho que a gente fica tão feliz quanto a própria família”, afirma Suzaki, que há dez anos recebe cartão de Natal da família de um menino resgatado em 2010. “Isso aqui é a minha segunda casa. E na verdade várias vezes o Tigre virou minha primeira casa”, diz Suzaki, que já poderia ter se aposentado. “Vou fazer o que da vida quando deixar isso aqui?”, questiona o veterano do Tigre, sorrindo.

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