A distribuição de 319.050 doses de medicamentos do kit intubação feita pela Secretaria Estadual de Saúde (Sesa) na última sexta-feira (16) só alivia momentaneamente a situação crítica das UTIs lotadas de pacientes com Covid-19 no Paraná. Os estoques seguem baixos nos hospitais pela dificuldade dos laboratórios em atender a alta demanda em todo o país. A própria Sesa admite que o lote enviado a 137 cidades do estado vai durar, em média, quatro dias.
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Com isso, gestores hospitalares quebram a cabeça: negociam entrega de qualquer quantidade de medicamentos com a indústria, buscam fornecedores no mercado externo e até emprestam doses uns para os outros.
Antes da entrega da Sesa, o Hospital Angelina Caron, em Campina Grande do Sul, na região metropolitana de Curitiba, estava há duas semanas sem receber uma única dose dos fornecedores e tinha remédios para somente uma semana. Com as doses enviadas pelo governo estadual, o hospital ganhou fôlego emergencial de somente uma semana para atender os 58 leitos de UTI exclusivos para Covid-19.
"A quantidade que recebemos agora da Secretaria de Saúde ajuda e é bem-vinda, mas não muda o panorama nem em curto prazo. É um volume pequeno para nosso consumo", explica o superintendente administrativo do Angelina Caron, Rogê Costa.
Com tal cenário, a equipe clínica do Angelina Caron é obrigada a substituir constantemente o protocolo de aplicação de sedativos e bloqueadores desde que começou a falta dos remédios em março.
"Não estamos mais no plano B. Já tivemos de mudar o protocolo de medicamentos três ou quatrovezes. E mesmo assim estamos tendo de redirigir a quantidade de medicamentos nos pacientes para não ter perda", explica Costa.
O superintendente administrativo do Angelica Caron cita o aumento de consumo de um único medicamento de intubação, que antes da pandemia era de 2,5 mil doses por mês e agora chega a 7 mil doses. "Além da dificuldade de achar, tem o preço. Tem medicamento que há um mês atrás a gente pagava R$ 7 a dose. Agora está R$ 48", cita.
Sem poder aplicar o protocolo padrão ouro, como é chamada a aplicação dos medicamentos ideais para sedar pacientes em leitos intensivos, o risco é haver efeitos colaterais na sedação e dificuldade na hora do desmame, quando a equipe médica vai reduzindo as doses até tirar totalmente a medicação.
"Essa situação gera um estresse na equipe que cuida do paciente, porque com o medicamento correto, o paciente fica sedado direto o tempo todo. Com os alternativos, é preciso um acompanhamento maior, de monitorar as doses para que o paciente não acorde", explica o superintendente administrativo do Angelina Caron.
O presidente do sindicato dos hospitais particulares do Paraná (Sindipar), Flaviano Ventorim, confirma a dificuldade em todo o estado. "Muitos hospitais seguem com dificuldade de receber medicamentos de seus fornecedores. Os que estão recebendo do governo do estado é porque estão no plano de contingência", afirma. "Uns dias atrás, por exemplo, o hospital em que trabalho socorreu outro hospital que naquele dia ia ficar sem medicação. Emprestamos algumas doses", cita Ventorim, que também é diretor executivo do Hospital Nossa Senhora das Graças, em Curitiba.
Ventorim explica que os poucos hospitais que estão conseguido ser atendidos pelos fornecedores recebem cotas pequenas de medicamentos. "No hospital em que trabalho, por exemplo, precisamos de 5,6 mil doses de rucorônio por mês, que é o bloqueador para estabilizar o paciente na intubação. Mas o fornecedor consegue entregar no máximo 3 mil", exemplifica o diretor do Sindipar.
Queda de casos
Apesar da situação complicada, Ventorim afirma que alguns hospitais já vem percebendo um leve alívio nas UTIs, o que permite, em alguns casos, até a normalização da aplicação de medicamentos. O motivo, aponta, é a redução da transmissão do coronavírus causada pelo lockdown em março. "O lockdown ajudou a diminuir a pressão nos prontos-socorros. A consequência de ter menos gente no atendimento de emergência, que é a porta de entrada do hospital, é que menos pacientes são encaminhados para a UTI", explica o presidente do Sindipar.
De acordo com o Farol Covid, plataforma que calcula índices da pandemia, desde a semana passada o Paraná tem a menor taxa de transmissão do Brasil, abaixo de 1 - valor ideal para manter o contágio controlado. Nesta segunda-feira (19), a taxa de transmissão no estado é de 0,75, ou seja, um grupo de 100 pessoas é capaz de transmitir a Covid-19 para outras 75.
"Cheguei a ter o pronto-socorro lotado, com 10 pessoas. Agora a ocupação gira em torno de cinco", compara Venturim sobre a realidade no Hospital Nossa Senhora das Graças. No Hospital Angelina Caron, a queda no atendimento de emergência chega a 10%.
Porém, nos dois hospitais as UTIs seguem lotadas, já que os pacientes que deram entrada antes do efeito do lockdown seguem internados. Além disso, as unidades intensivas só terão alívio de fato se a transmissão não voltar a subir, o que também daria tempo de a indústria reestabelecer o fornecimento de medicamentos para intubação.
"Se a gente conseguir voltar aos índices de outubro, consigo manter o fornecimento de medicamentos para atender a UTI normalmente. Então, tudo vai depender do volume de pacientes", enfatiza Venturim.
"A tendência é normatizar um pouco o fornecimento de remédios, pelo menos parcialmente, já que até então não tínhamos perspectiva nenhuma. Isso depende da manutenção da queda de casos", reforça Costa.
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