Eleito com pouco mais de 75 mil votos, o deputado federal paranaense Filipe Barros (PSL) tem sido um dos mais destacados cães de guarda do bolsonarismo na Câmara dos Deputados. Aos 28 anos de idade e exercendo seu primeiro mandato em Brasília, ele tem demonstrado faro aguçado para identificar focos de embates ideológicos e disposição em adotar – especialmente nas redes sociais – a retórica que marca o grupo político alinhado ideologicamente por Olavo de Carvalho. Com essa postura, Barros tem conseguido espaço no governo e recentemente foi indicado para a Comissão de Mortos e Desaparecidos Políticos, em substituição ao deputado petista Paulo Pimenta.
A nomeação para a comissão é, por enquanto, um dos principais destaques da rápida ascensão política do jovem deputado que assumiu seu primeiro cargo eletivo em 2016, como vereador de Londrina. O contato inicial de Barros com a política aconteceu na Universidade Estadual de Londrina (UEL), onde estudou Direito. No primeiro ano da faculdade, ele confessa ter se aproximado do ideário progressista – hoje principal alvo de seus ataques. O ponto de virada de sua formação foi o curso online de filosofia de Olavo de Carvalho, um dos arquitetos do bolsonarismo.
Já alinhado a Olavo, Filipe Barros venceu a disputa pelo comando do Diretório Central dos Estudantes da UEL com promessas de fazer uma gestão à direita. O processo foi complicado, segundo ele, porque a visão progressista é hegemônica no ambiente universitário. Foi nesse momento que tomou gosto pelo embate político. Enquanto presidia o DCE, Barros se aproximou da política em outros ambientes: estagiou no gabinete do vereador Gustavo Richa, primo do ex-governador do Paraná Beto Richa (PSDB), e passou a militar em um grupo contrário ao aborto e à ideologia de gênero. Foi um dos responsáveis por pressionar vereadores de Londrina e cidades da região a eliminarem menções à palavra gênero dos planos municipais de educação.
Esse grupo passou a articular uma candidatura à Câmara Municipal de Londrina que pudesse representar os interesses conservadores. O nome escolhido foi o de Filipe Barros, que à essa altura, em 2014, já havia concluído a faculdade de Direito. O presente que pediu ao pai para comemorar a formatura foi um curso presencial de Olavo de Carvalho. Barros, então, estreitou seu contato com o ideólogo ao passar dez dias com ele nos Estados Unidos.
Em 2014 ele já havia se aproximado também da política partidária e nas eleições gerais foi às ruas pedir voto para Beto Richa, que então disputava a reeleição ao governo do Paraná. “Fiz campanha para o Beto na reeleição dele. Acreditei nele. Ele trabalhava o marketing muito bem. Eu fiz campanha pra ele. Naquele momento era o candidato que tinha. Eu não votaria no Requião nem na Gleisi”, diz o deputado.
Dois anos depois, ele disputou uma vaga na Câmara de Londrina e foi eleito com mais de 4 mil votos. Então filiado ao PRB, Barros afiou seu discurso no Legislativo Municipal. Foi nesse período que ele protagonizou um dos episódios que trouxe mais desgaste à sua imagem pública. Durante uma greve de trabalhadores contra a reforma da Previdência proposta pelo então presidente Michel Temer, ele fez um vídeo de quando saiu dirigindo pelas ruas de Londrina xingando grupos de manifestantes de “vagabundos”. Dias depois, o próprio parlamentar veio a público e pediu desculpas pelo “equívoco quanto à forma do vídeo”.
Nessa época, Barros também aprimorou outra estratégia de embate político: a de processar desafetos. No caso do vídeo, o então vereador, que é evangélico, foi à Justiça contra o Padre Cristiano Bento dos Santos. “O fato gerador do processo é uma entrevista que ele [padre Cristiano] deu na época da tal da greve dos sindicatos, onde ele me acusa de eu ser racista, homofóbico e outros termos que não condizem com a sua batina. Então é lamentável que um padre abandone o seu sacerdócio, a sua batina, para fazer militância política de esquerda", disse o vereador à Folha de Londrina.
O padre foi condenado a pagar R$ 2,3 mil ao vereador. A multa foi paga com dinheiro arrecadado em uma vaquinha feita em Londrina. “Saí em defesa dos trabalhadores. Isso é um dever cristão. Eu também sou um bom cristão, seguidor de Jesus Cristo, e tenho a missão de defender os pobres. E, naquele momento da greve, que ele (vereador) se sentiu ofendido pela minha manifestação, eu estava defendendo os trabalhadores, as pessoas que sofrem para ganhar o seu pão de cada dia", disse o padre, também à Folha de Londrina.
Aproximação com Bolsonaro
Filipe Barros usou o mandato de vereador para se aproximar da família Bolsonaro – a quem já conhecia e admirava pelos posicionamentos políticos. A cada viagem que fazia a Brasília para tratar de assuntos municipais, aproveitava para visitar os gabinetes de Jair e Eduardo Bolsonaro na Câmara dos Deputados. A partir daí, começou a participar de eventos de direita com a presença do presidente e de seus filhos e, após essa aproximação, recebeu de Bolsonaro a missão de assumir a coordenação da campanha em Londrina. À época, o agora presidente ensaiava uma candidatura pelo Patriota e eram poucos os que acreditavam em sua eleição. O apoio foi recíproco, e Barros saiu candidato a deputado federal.
Abertas as urnas no primeiro turno, Londrina foi, entre os grandes centros urbanos, a cidade que proporcionalmente mais deu votos a Bolsonaro. Nesse embalo é que Filipe Barros chegou à Câmara dos Deputados. O parlamentar é um produto exemplar do contexto político de 2018. Com uma trajetória política curta, conseguiu se eleger deputado sem a bênção dos caciques tradicionais da política local, levado pela onda Bolsonaro. Ele derrotou, inclusive, o ex-deputado federal Luiz Carlos Hauly, que já exerceu quatro mandatos na Câmara Federal.
No Congresso
Em Brasília, Filipe Barros continuou trilhando o mesmo caminho que abriu na Câmara de Londrina. Ao entrar de cabeça em polêmicas, provocando adversários, investindo em memes, trucagens e deboches no Facebook e sendo fiel aos Bolsonaro, ele tem ganhado espaço. No primeiro semestre, ficou entre os 20 parlamentares mais influentes nas redes sociais, de acordo com um levantamento da consultoria FSB.
A fidelidade ao governo de Jair Bolsonaro é, nas palavras de Barros, de “100%”. “Quando eu falo 100% é sem ressalvas mesmo. Pela primeira vez na história do Brasil a gente está vendo um presidente com a coragem de fazer as mudanças que o Brasil precisa. A reforma da Previdência é uma dessas causas. Eventuais equívocos que possam acontecer não anulam meu apoio irrestrito ao governo, porque na balança o Brasil está vivendo um momento que até pouco tempo atrás era impensável”, defende.
Nesse apoio irrestrito, o deputado defende até a pouco republicana indicação de Eduardo Bolsonaro ao cargo de embaixador do Brasil nos Estados Unidos. Ele acredita que a proximidade do filho do presidente com Donald Trump pode trazer ganhos econômicos para o Brasil.
Com essa postura, Barros também ganhou espaço no mundo real. No começo de agosto, foi indicado pela ministra Damares Alves – a quem conhece da época da militância pró-vida – ao cargo de membro da Comissão de Mortos e Desaparecidos Políticos. A indicação de Barros foi criticada pelo fato de ele já ter defendido em suas redes sociais o golpe militar de 1964. Eis o que ele pensa sobre o tema:
“Dia 31 março de 1964 foi um contragolpe. É importante a gente lembrar o contexto histórico da Guerra Fria, outras ditaduras se formando no bloco soviético. É importante a gente entender o contexto que levou as pessoas às ruas em 1964 pedir, implorar para que os militares tomassem uma posição. E quando falo a sociedade foi a sociedade mesmo: OAB, CNBB, a imprensa, as instituições foram às ruas pedir para que não mais acontecesse o que estava acontecendo no nosso país. Então o 31 de março foi um contragolpe. Só que esse contragolpe que era pra ser temporário, provisório, foi subvertido e aí sim se transformou em uma ditadura com violações aos direitos humanos, com repressão institucional, com mortos e desaparecidos. O que começou como contragolpe se transformou logo em seguida em uma ditadura mesmo”.
O deputado, que poucos dias após assumir o cargo na comissão disse que a história do golpe militar foi distorcida, deixa claro como será sua atuação. “Essas comissões, esses instrumentos de garantia da memória e da verdade, que no Brasil são três: Comissão da Anistia, Comissão da Verdade e Comissão de Mortos e Desaparecidos, focaram num único lado, que era o lado das mortes e desaparecidos e a repressão do Estado. Mas nós não podemos ignorar, e foi ignorado nos últimos anos, a atuação de grupos terroristas e paramilitares desde antes do 31 de março, inclusive. Mas, simplesmente, a atuação desses grupos foi ignorada por essas comissões. Foram jogados para baixo do tapete. [...] Minha proposta para a comissão é justamente investigar também os mortos e desaparecidos causados pelos grupos terroristas”, diz.
O futuro
Ao mesmo tempo fruto e incentivador da polarização política, Barros não teme uma eventual inanição na hipótese de o cenário se apaziguar. “Independentemente de o cenário político se pacificar ou não, no parlamento sempre haverá pessoas com posições diferentes. Sempre vai ter o pessoal do PT, do PSOL, do PSL.O parlamento se caracteriza por essa pluralidade de ideias, então sempre vai existir esse debate”, sustenta.
A postura, entretanto, pode ser um calcanhar de Aquiles para as aspirações políticas mais imediatas. O deputado já se declara pré-candidato à prefeitura de Londrina e um dos pontos de sua atuação que tem sido alvo de possíveis adversários é seu apreço pelo debate ideológico. Num material contra o deputado, adversários locais ironizam sua atuação: “resolvido o problema de buraco, mato, falta de médico e iluminação na cidade de Londrina. Deputado Filipe Barros acaba de assumir a Comissão de Mortos e Desaparecidos Políticos”.
Para a disputa de 2020, o deputado descarta a aliança com lideranças tradicionais como os Canziani ou os Belinati, mas deixa aberta a porta para negociações com o DEM, o PSD, o PSC e o Podemos.
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