A General Mills, multinacional proprietária das marcas Yoki, Kitano e Häagen Dazs no Brasil, anunciou que vai transferir as atividades da fábrica que mantém em Cambará, município da região norte do Paraná, para a planta da marca localizada em Pouso Alegre, Minas Gerais. O encerramento das atividades no município paranaense vai extinguir 880 postos de trabalho, entre diretos e indiretos, e afetar toda a economia da cidade, que tem 25 mil habitantes e um total de 5,2 mil trabalhadores registrados, sendo 1.637 somente no setor alimentício.
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O anúncio gera preocupação em entes públicos e privados e mobiliza o município, que estima R$ 6 milhões a menos sem a arrecadação de ICMS, além dos reflexos esperados para comércio, serviços, agricultura e outras indústrias. E levanta a questão: afinal, como cidades menores, onde a economia depende em grande parte de uma empresa-âncora, são impactadas e podem driblar os desafios de uma situação como essa?
Primeiro, vale esclarecer que indústrias abrirem e fecharem portas, ou realocarem seus ativos, é um movimento natural, que acontece por conta da dinâmica da economia, mas também por questões estratégicas, definidas por cada empresa.
É o que explica o economista Marcelo Alves, coordenador de Assessoria Econômica e de Crédito da Federação das Indústrias do Estado do Paraná (Fiep). “A diferença é que, quando a cidade é grande e tem um tecido econômico-industrial robusto, o impacto acaba sendo menor, embora também seja sentido. Nos municípios menores há um impacto maior pela importância e relevância que a atividade econômica gera na região”, avalia. “Até porque, alguns dos fornecedores, a depender da atividade, acabam se instalando próximos dessas fábricas”, complementa.
Exemplo que ilustra a questão é o de Camaçari, na Bahia, onde a montadora Ford fechou uma das fábricas, há dois anos. “O setor automotivo trabalha com estoque muito baixo, e, por precisar dos fornecedores just in time, estes se instalam no entorno, o que faz o impacto ser muito grande por toda a cadeia que é afetada”, cita o economista.
Representatividade do setor alimentício
Em Cambará, embora o foco seja a agroindústria, os reflexos podem ir pelo mesmo caminho. O município abriga 636 empresas, 74 delas voltadas à atividade industrial, segundo dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados, o Caged, do Ministério da Economia. “São 5,2 mil trabalhadores registrados, sendo 2.078 na indústria e construção, e 1.637 empregos em alimentos”, cita Marcelo Alves. Ou seja, cerca de 42% dos empregos diretos no setor gerados no município estão na unidade da General Mills - que, em Cambará, fabrica produtos derivados de mandioca, batata e amendoim.
Com isso, além dos empregados direta e indiretamente afetados, leva-se em conta o fator efeito-renda, que é o total de empregos gerados por conta dos outros dois tipos de empregos extintos (diretos e indiretos). “Esse contingente recebe salário e gasta no entorno, e essa é a grande preocupação do município, que, além da perda da arrecadação de impostos, tem o movimento da economia como um todo afetado.”
Possíveis alternativas
Para sanar o problema, algumas saídas são a venda das instalações para aproveitamento em atividade econômica semelhante ou até de outra natureza e o reaproveitamento da mão-de-obra. “Até porque, quando uma fábrica sai, deixa um contingente de pessoas capacitadas”, lembra o coordenador.
Ele recorda que Cambará, cidade do norte pioneiro do Paraná e próxima a municípios como Ourinhos, no interior de São Paulo, está inserida numa região dinamizada pelo agro e pela atividade industrial, com chances de se tornar interessante a outras unidades fabris. “Mas, num primeiro momento, não tem como negar o impacto, porque isso (a instalação de uma nova fábrica) não se faz do dia pra noite”, avalia.
Por isso mesmo, no município, medidas já estão sendo tomadas com o objetivo de procurar alternativas para a saída da General Mills do Paraná, anunciada para dezembro deste ano. A primeira tentativa foi convencer a indústria a permanecer, oferecendo incentivos fiscais ou outras contrapartidas. “Mas se mantiveram irredutíveis, justificando que a decisão não teria nenhuma relação com essas questões”, conta a secretária de Indústria, Comércio, Turismo, Agronegócio e Inovação de Cambará, Angélica Moreira.
Agora, a estratégia vai por novas frentes. “O primeiro plano é a criação de uma política pública mais atualizada e mais incisiva para geração de empregos, que possa melhorar a atração de investimentos”, adianta. Uma alternativa para isso é firmar parceria com a Invest Paraná, agência de fomento do estado para incentivo de instalação de empresas em municípios paranaenses.
“Outro ponto em que vamos precisar do apoio do governo do estado e da própria General Mills é na identificação e prospecção de possíveis interessados na compra do complexo industrial. O foco é não deixar o complexo ocioso”, diz a secretária, acrescentando que, antes mesmo da notícia do fechamento, o município vinha trabalhando em processos de concessão de áreas para expansão e instalação de novas empresas.
“Pelos planos de negócios apresentados para a administração pública, serão 200 novas vagas abertas ainda para o ano de 2023. Sabemos que ainda é insuficiente, mas é um trabalho já em andamento que ameniza levemente o problema.”
O prefeito da cidade, Neto Haggi, se reúne na próxima terça-feira (17) com o secretário de Indústria, Comércio e Serviços do Paraná, Ricardo Barros, o vice-governador e presidente do Sistema Fecomércio, Darci Piana, e o presidente da Invest Paraná, Eduardo Beckin, para traçar os próximos passos.
Para General Mills, decisão de saída do Paraná é estratégica
Segundo a General Mills, a reestruturação das operações tem por objetivo “competir de maneira efetiva e acelerar seu crescimento no mercado brasileiro”. A unidade de Cambará é a segunda que a multinacional desativa no Brasil em dois anos. Em 2021, foi fechada a fábrica de Nova Prata, no Rio Grande do Sul, com a exclusão de 300 postos de trabalho, pelos mesmos motivos apontados agora.
Em nota, a empresa informa que já iniciou as negociações com os sindicatos de classe buscando oferecer, além das verbas rescisórias legais, “um justo pacote de desligamento, com bônus de salários, extensão de benefícios - como vale-alimentação e assistência médica, além de incentivo extra por performance ao longo dos próximos meses, até o encerramento das atividades”.
A empresa também vai oferecer uma consultoria com orientações para recolocação profissional, além de ofertar oportunidades de transferência para colaboradores que tenham interesse em trabalhar em Pouso Alegre.
Em seu posicionamento, a General Mills garante a saída do Paraná que se trata de uma decisão de negócios, não relacionada ao poder público ou à comunidade local, e que as mudanças fazem parte de uma estratégia mais ampla, que prevê criar condições para que a empresa possa competir de maneira efetiva e acelerar seu crescimento no Brasil, um dos mercados prioritários para a organização nos próximos anos. Segundo a General Mills, para receber as transferências de linhas de produção, a unidade da companhia em Minas Gerais passará por uma expansão, com abertura de centenas de posições de emprego na região.
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