A discussão fundiária sobre a propriedade de áreas de Pontal do Sul, no Litoral do Paraná, ganhou mais um capítulo, a partir de uma decisão do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4), que bloqueou uma porção de terras na região. A liminar gerou dúvidas. Enquanto um dos lados entende que toda a área de Pontal do Sul está bloqueada, incluindo os espaços urbanos e os terrenos previstos para a Faixa de Infraestrutura e para o porto, outra parte avalia que o bloqueio atinge somente as propriedades da Empresa Balneária Pontal do Sul (EBPS). A interpretação adotada pelo cartório de registro de imóveis de Pontal do Paraná é de que apenas as áreas pertencentes à empresa estão embargadas.
Para tentar entender essa história, é preciso voltar no tempo. Em 1949, a prefeitura de Paranaguá pediu que o governo do Paraná doasse para o município uma terra devoluta (pública e sem uso), com a justificativa de que o espaço seria oferecido para empresas colonizadoras, aos moldes do que aconteceu em outras regiões do estado, especialmente no Norte. Sem condições técnicas de medir a extensão de uma área ainda de mata fechada, a área foi estimada em 3 mil hectares, tendo como marco geográfico o rio Olho D’água.
Duas versões e muita discussão
Em 1951, a Assembleia Legislativa aprovou a doação da área, com a condição de que fosse demarcada e que preservasse a propriedade de eventuais ocupantes anteriores. A partir daí, começa uma guerra de versões, com trocas de acusações.
O ponto inicial da discussão é o tempo decorrido entre o aval para a utilização das terras e o repasse à empresa – feito de maneira quase automática. De um lado há a justificativa de que nos dois anos que antecederam a doação foi preparada toda a papelada para agilizar o repasse para a EBPS, que teria sido formada, originalmente, por três funcionários de outras empresas colonizadoras, que seriam os sócios fundadores e majoritários. A EBPS teria aberto um processo de cotas, permitindo que cerca de 100 pessoas participassem como sócias.
Entre as partes que adquiriram cotas estaria uma empresa que chegou a ter, como um dos donos, o então prefeito da época, João Eugenio Cominese. Aí surge a divergência apontada pelo "outro lado" da contenda. Como Cominese transferiu a área recebida para a EBPS imediatamente depois da autorização parlamentar, foi apontada a atitude em interesse próprio. Além disso, descobriu-se que a terra era maior: cerca de 4,3 mil hectares. As áreas também não teriam sido demarcadas, para cumprir a exigência da Assembleia, nem foram identificados eventuais ocupantes com direito à posse.
Com o argumento de que ilegalidades foram praticadas, o advogado Hassan Mohamead Annan, representando algumas famílias de pescadores da comunidade do Maciel, pediu a nulidade da doação. Em liminar, a Justiça chegou a bloquear as áreas da chamada transcrição 6624, uma espécie de matrícula que compreendia tudo que foi doado em 1951. Qualquer tipo de transação de imóveis de Pontal do Sul ficou impedida por um tempo. Contudo, a decisão não afetou um grande número de moradores e empresários porque a maioria não estaria com a situação imobiliária regularizada – registro, matrícula e escritura – e mantém as negociações na informalidade, por meio de contratos de gaveta.
O bloqueio acabou sendo suspenso quando o TRF4 decidiu, no ano passado, que a demanda já havia prescrito – ou seja, transcorreu tanto tempo que não era mais possível julgar o caso. Em tese, esse argumento encerraria a discussão; contudo, o advogado entrou com um recurso e conseguiu uma nova medida cautelar, bloqueando áreas até que a situação seja avaliada pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ). Outras duas ações, consideradas conexas, também estão em tramitação na Justiça sobre o assunto.
Qual o tamanho do bloqueio?
Aí começou outra discussão. No entendimento de Hassan, a decisão judicial atualmente em vigor bloqueia todas as áreas originalmente ligadas à transcrição 6624. Se prevalecer esse entendimento, nenhuma negociação imobiliária pode ser realizada em Pontal do Sul. O bloqueio atingiria, inclusive, os espaços em que há a previsão de construir um porto e também a área em que é estimada a Faixa de Infraestrutura, conjunto de obras, incluindo uma rodovia e o um canal de drenagem, que o governo estadual pretende realizar na região. Já a assessoria jurídica da EBPS avalia que somente as áreas ainda não desmembradas da transcrição original e os terrenos ainda pertencentes à empresa, cerca de 3 mil, estariam bloqueados – o equivalente a uma área de aproximadamente 14 milhões de metros quadrados.
Procurado pela Gazeta do Povo, o responsável pelo Registro de Imóveis de Pontal do Paraná – município que atualmente engloba a área de Pontal do Sul – Jorge Sussumu Seino afirmou que está cumprindo o que manda a decisão judicial e bloqueando os imóveis ainda de titularidade da EBPS. Ele explicou ainda que o cartório foi criado em 2013 e que somente os imóveis com negociação posterior a essa data é que passam por lá. Uma boa parte dos registros estariam em serventias de Paranaguá e Matinhos.
A divergência sobre o entendimento dos efeitos da medida cautelar sobre o bloqueio deve ser resolvida com um embargo de declaração (quando a Justiça é instada a esclarecer os termos da decisão tomada).
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