Uma nota técnica, assinada pelo Movimento Pró-Paraná e pela Associação Comercial do Paraná (ACP), alerta que o Poder Judiciário teria sido induzido ao erro ao decidir, em caráter liminar, pela suspensão do leilão do lote 1 do pedágio no Paraná, realizado no dia 25 de agosto na Bolsa de Valores (B3) de São Paulo. A Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), responsável pela elaboração e publicação do edital da licitação, recorreu da decisão e aguarda análise do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) em Porto Alegre.
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O documento produzido pelos órgãos de representatividade civil foi elaborado pelos especialistas Pedro Luiz Fuentes Dias, engenheiro florestal, especialista em análise ambiental e mestre em agronomia; Heroldes Bahr Neto, advogado e mestre em direito; e Nelson Luiz Gomez, engenheiro eletricista, advogado e mestre em administração.
Segundo a nota técnica, “a decisão (da Justiça Federal) é embasada na premissa de que o art. 6º, alínea “a”, da OIT (Organização Internacional do Trabalho) 169 teria sido descumprido. A regra em questão impõe ao Estado o dever de consultar previamente os povos tradicionais ou originários que possam vir a ser afetados por medidas administrativas e legislativas. Porém, é preciso fixar, desde logo, a seguinte premissa: não cabe consulta sobre fatos já existentes, apenas sobre fatos atuais e futuros. Sendo assim, a decisão que concedeu a liminar pleiteada pela Defensoria Pública da União merece reparo, pois os fatos, tal como lhe foram apresentados, não esclareceram sobre a anterioridade dos fatos e relação à vigência das regras estabelecidas na Convenção OIT 169”.
O documento detalha que os “fatos históricos evidenciam por si o equívoco a que o Juízo foi levado”. Em uma linha do tempo, a nota reforça que no ano de 1997 foram consolidadas as decisões legais e administrativas de realização do sistema de pedágios e suas respectivas praças de cobrança no Paraná, por meio da implantação do denominado Anel de Integração, com início da cobrança efetiva do pedágio a partir de junho de 1998.
Os especialistas que assinam a nota consideram ainda que, no ano de 2002, “decisões legais e administrativas determinaram a implantação da praça de pedágio da Lapa (...) sendo sua implantação definitiva em maio de 2003 e que somente em julho de 2003 passaram a vigorar os efeitos da adesão do Brasil à OIT 169”. O documento segue destacando que apenas em dezembro de 2006 as comunidades quilombolas do Freixo, Vila Esperança Mariental e Restinga – as atingidas pelas obras e a praça de pedágio – foram reconhecidas por atos da Fundação Palmares.
“Portanto, em 1997 e 2002, ainda não era exigível que se desse cumprimento das regras às quais o Brasil só viria a aderir em 2003, por uma razão simples, de ordem cronológica. Atualmente, o que se faz em âmbito legal e administrativo é apenas a troca de concessionário por meio de novo Leilão. Ademais, a nova concessionária tem um prazo de cinco anos para implantar a duplicação do trecho da rodovia”.
Adesão à OIT 169 veio depois da implantação da praça de pedágio na Lapa
Para o Movimento Pró-Paraná, na época em que foi implementada a praça de pedágio na Lapa (2002), o Brasil não havia concluído sua adesão à OIT 169 e as comunidades quilombolas não haviam sido, ainda, reconhecidas legalmente. O fato de essa linha do tempo não ter sido evidenciada seguramente induziu o Juízo em erro, que, por conta disso, possivelmente tenha proferido a decisão que acabou por suspender os direitos dos usuários, quer seja, de mais de três milhões de pessoas que transitam pela região metropolitana ter segurança e se evitar acidentes como o do último dia 2 de setembro de 2023, que na BR-277 envolveu 35 veículos, ceifando a vida de cinco pessoas e levando outras cinco, em estado muito grave, para unidades hospitalares”, alertou.
O Movimento Pró-Paraná e a ACP alertam que as rodovias sem concessionária de pedágio ficaram com atendimento deficiente aos usuários como serviços e socorros mecânicos, aos acidentes, socorro médico e manutenção da rodovia. O antigo modelo foi encerrado em novembro de 2021.
“Além disso, levando em conta que o questionamento era apenas quanto a uma das praças e a uma instituição reconhecia recentemente, a decisão não poderia, com a devida licença de opinião, ter suspendido todo o processo".
Nota técnica do Movimento Pró-Paraná e da Associação Comercial do Paraná (ACP)
Na opinião dos órgãos, a Justiça "poderia ao menos, mesmo que equivocadamente, ter suspendido o leilão apenas parcialmente, delimitando os efeitos da decisão ao que especificamente e tratasse dessa praça de pedágio da Lapa, e não afetar todo o lote leiloado”.
O movimento evidenciou ainda, no documento, que ainda não existe obra, “motivo pelo qual não existe ainda solicitação de licenciamento de obra, e será no processo de licenciamento ambiental que essa comunidade deverá ser devida e previamente consultada, de acordo com o previsto na OIT 169, assim, quando da correta e oportuna fase processual do processo de licenciamento ambiental, das futuras obras, é que a consulta poderá e deverá ser realizada”.
Desta forma, as consultas públicas devem acontecer no momento da obtenção para o licenciamento das obras de duplicação: "em especial dirigidas pela Fundação Palmares às comunidades quilombolas, onde as vertentes econômica e ambiental serão tratadas conjuntamente e adotadas medidas mitigadoras, sendo o caso, e que dentre elas poderá inclusive se dar a isenção de tarifas, nesse trecho, para as famílias quilombolas, dentre outras medidas de cunho social, econômico e ambiental”.
Sem prejuízo às comunidades, aponta nota técnica
A nota técnica considerou ainda que uma submissão da matéria no tempo correto “não trará qualquer prejuízo às comunidades” e que, em caso de prejuízo, não existiriam obstáculos para que sejam feitas as devidas compensações.
“Aliás, no caso da praça de pedágio da Lapa, oportuno anotar que já há um ganho com a nova concessionária devido ao êxito do leilão, onde os preços a serem praticados na praça de pedágio da Lapa, já estarão inferiores aos anteriormente praticados pela antiga Concessionária Caminhos do Paraná, que deteve essa concessão até 2021”.
O documento acrescenta que, com a nova concessão, os usuários ainda terão descontos se utilizarem a cobrança automática e, também, para usuários frequentes.
Processo seguiu todos os trâmites legais, diz governo do Paraná
O governo do Paraná disse, em nota, que entende que o processo seguiu todos os trâmites legais e que vai colaborar com a ANTT e o governo federal para o esclarecimento do ponto questionado pela decisão monocrática. “Vale ressaltar que a concessão do lote 1 de rodovias no Paraná foi realizada de forma transparente, seguindo todos os trâmites legais, inclusive com aprovação do Tribunal de Contas da União”, reforçou o Executivo estadual.
A ANTT tem respondido que suas manifestações serão nos autos processuais. A Justiça Federal do Paraná e a Defensoria Pública da União (DPU) ainda não se manifestaram sobre o teor do documento assinado pelo Movimento Pró-Paraná e pela Associação Comercial do Paraná.
A liminar de suspensão do lote 1 do pedágio foi proferida pela juíza Silvia Regina Salau Brollo, da 11ª Vara Federal de Curitiba, no último dia 6. Atendeu a um pedido feito pela DPU que alegou, conforme preconiza a convenção da Organização Internacional do Trabalho (OIT) 169, que comunidades originárias (neste caso, quilombolas) impactadas pela duplicação da rodovia e a colocação de uma praça de pedágio na BR-476 no município da Lapa, região metropolitana de Curitiba, deveriam ter sido ouvidas de forma direta e objetiva.
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